Advogado informado vale por dois

Advogado Informado Vale por Dois: Acórdãos Direito Penal VII (01-04-2014)
 

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17/11/2011

(http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/59ee4a010eacecfe8025794c004f6215?OpenDocument&Highlight=0%2Cextradi%C3%A7%C3%A3o)

“I – De harmonia com a Convenção celebrada entre Portugal e os Estados Unidos da América do Norte sobre extradição de criminosos, de 21.9.1908 e Instrumento de 14.07.2005, entre Portugal e os Estados Unidos da América, constata-se que nenhuma das Partes Contratantes se obriga a entregar os seus próprios cidadãos (art. VIII da Convenção). Assim, se o Extraditando tiver nacionalidade portuguesa, a extradição é excluída.

II – A qualidade de nacional é apreciada no momento em que seja tomada a decisão sobre a extradição (cf. art. 32.º n.º 6 da Lei n.º 144/99, de 31.08).
III – A circunstância de o Extraditando não ter demonstrado que adquiriu a nacionalidade guineense e alterou os seus elementos de identificação por força do invocado direito de asilo que lhe terá sido concedido pelas autoridades da Guiné-Bissau, apenas impede que se proceda ao trato sucessivo dos registos atributivos de nacionalidade.
IV – Face aos princípios que regem as relações entre Estados soberanos e às regras próprias de aquisição e perda de nacionalidade, estando demonstrado através de documentos autênticos provindos directamente das autoridades da República da Guiné-Bissau que atestam que o ora Extraditando tinha nacionalidade guineense e os seguintes elementos de identificação: J…, filho de J… S… e de A… S…, natural de Bissau e nascido em 29.3.1943, o mesmo adquiriu a nacionalidade portuguesa.

V – Com base nesses elementos fornecidos pelo Estado soberano da República da Guiné-Bissau, o Extraditando adquiriu a nacionalidade portuguesa, ao abrigo do art. 3.º da Lei 37/81 de 3.10, tendo a aquisição da nacionalidade sido averbada no seu registo de nascimento.

VI – Também em Portugal podem ocorrer situações em que o Estado, com respeito pela lei, fornece documentos emitidos oficialmente de que constam elementos de identificação diferentes [cf. art. 22.º n.º 2, al. a) da Lei n.º 93/99 de 14.7 (medidas para protecção de testemunhas)].

VII – O respeito pela soberania da República da Guiné-Bissau não possibilita que se questionem essas informações, nem a forma como o Extraditando adquiriu a nacionalidade guineense e os novos elementos de identificação.

VIII – A aquisição e a perda da nacionalidade estão sujeitas a registo obrigatório (art. 18.º da Lei 37/81 de 3.10, na redacção da Lei Orgânica 2/2006 de 17.4) e, as alterações só produzem efeitos a partir da data do registo dos actos ou factos de que dependem (art. 12.º da Lei 37/81 de 3.10).

IX – Não havendo registo da perda de nacionalidade, o Extraditando, com aqueles elementos de identificação fornecidos pela República da Guiné-Bissau é cidadão português, no pleno uso dos seus direitos e deveres de cidadania e para todos os efeitos resultantes da realidade registal, chama-se J…, é filho de J…S… e de A… S…, natural de Bissau e nasceu em 29.3.1943.

X – Nestas circunstâncias, a extradição é excluída, ex vi do art. 32.º n.º 1 al. b) da Lei n.º144/99 de 31.8.

XI – O art. V da Convenção celebrada entre Portugal e os Estados Unidos da América de 21.9.1908 não foi alterado pelo Instrumento de 14.07.2005, entre Portugal e os Estados Unidos da América nem pelo Acordo entre a União Europeia e os Estados Unidos da América sobre Extradição de 25.6.03.

XII – Por isso, nos termos do referido art. V: Nenhum acusado ou criminoso refugiado será entregue em virtude da presente Convenção, quando, segundo as leis do Estado dentro de cuja jurisdição o crime houver sido cometido, o réu estiver isento de acção criminal ou de penalidade, em consequência de ter prescrito a acção ou a pena correspondente ao facto que motivou o pedido de extradição, ou por efeito de qualquer outra causa legítima.

XIII – Este normativo impede a extradição do condenado se a pena estiver prescrita “segundo as leis do Estado dentro de cuja jurisdição o crime houver sido cometido”, in casu, os Estados Unidos da América. Porém, nada abona sobre o procedimento a adoptar se a pena estiver prescrita no Estado Requerido (Portugal).

XIV – Contudo, face às disposições da Lei n.º 144/99, constata-se que a prescrição da pena no Estado Requerido não é considerada fundamento directo de inadmissibilidade ou de recusa da cooperação (cf. art. 8.º da Lei 144/99).
XV – Por esta via, não há razão para recusar a extradição nem cabe aqui invocar o princípio da igualdade porquanto: (i) nas relações jurídicas internacionais o que releva é o acordo de vontades entre Estados Soberanos e (ii) não há discriminação proibida entre os cidadãos visados por cada um desses tratados nos termos do art. 13.º da Constituição da República Portuguesa.

XVI – In casu se o Extraditando tivesse sido condenado no âmbito do ordenamento jurídico-penal português, há muito que a pena correspondente ao ilícito perpetrado estaria prescrita, quer à luz das regras estabelecidas no diploma vigente em Portugal, à data em que foi cometido o ilícito criminal – CP de 1886 (art. 125.º nº 2 §§ 6 e 7, do Código Penal de 1886 – teria ocorrido em 22.8.1990, há mais de 21 anos) –, quer à luz do regime legal actualmente em vigor, o CP de 1995 [arts. 122.º n.º 1, al. a) e 126.º nºs 2 e 3, ambos do CP vigente – a pena teria prescrito na mesma data].

XVII – À luz da Constituição da República Portuguesa (CRP) a exigência de um processo equitativo implica o termo do cumprimento da pena num prazo razoável, pois a imprescritibilidade ofende a paz jurídica inerente ao decurso do tempo e as garantias de defesa (art. 32.º nº 1 da CRP), constitucionalmente consagradas.

XVIII – No caso dos autos, mesmo recusando protecção constitucional conferida à prescrição, avulta a relevância do decurso de um grande lapso de tempo entre o facto e o cumprimento da pena [no caso o reclamado permaneceu evadido – entre 22.08.1970 e a data da sua detenção, em 26.09.2011, por força da formulação do pedido de extradição, ou seja, mais de 41 anos -, sem que o Estado requerente aparentemente o tivesse localizado e reclamado a sua entrega].

XIX – No caso dos autos, em que face à lei penal substantiva portuguesa, se dobrou o prazo máximo de prescrição das penas e em que o Extraditando vem mantendo comportamento social isento de reparos, tem de se concluir que se mostra ultrapassado o prazo razoável para o cumprimento do remanescente da pena de prisão e que, consequentemente, esse cumprimento, neste momento, ofende os princípios da Convenção Europeia Para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais.

XX – Nos termos do art. 6.º al. f) da Lei n.º 144/99 o pedido de cooperação também é recusado quando respeitar a infracção a que corresponda pena de prisão ou medida de segurança com carácter perpétuo ou de duração indefinida.

XXI – No art. 2.º do Instrumento de 14.07.2005, entre Portugal e os Estados Unidos da América, a República Portuguesa emitiu declaração de existência de impedimentos à extradição relativamente a infracções puníveis com pena de prisão de duração indeterminada.

XXII – Uma pena de prisão de 15 a 30 anos é, dogmaticamente, uma pena de prisão relativamente indeterminada, sem o carácter de indefinição - mas com uma duração máxima pré-fixada – que é compatível com a CRP e existe no ordenamento jurídico-penal português, na punição de crimes praticados por delinquentes por tendência, alcoólicos e equiparados (cf. arts. 83.º a 87.º do CP).

XXIII – Daí que a natureza relativamente indeterminada da pena aplicada não obsta à extradição.

XXIV – No caso dos autos, 49 anos após a prática do crime, 41 anos após ter interrompido o cumprimento da pena, o Extraditando tem 20 anos de integração social pacífica em Portugal e participação como voluntário em projectos de interesse social, com mulher e dois filhos portugueses com quem convive, quando tem 68 anos de idade, problemas de saúde e cerca de 40 anos sem contacto com o país que pretende a sua extradição, é perceptível que o mesmo está inteiramente integrado na sociedade e não existe qualquer necessidade de protecção de bens jurídicos que ainda justifique a sua prisão.

XXV – São razões de prevenção geral de integração que justificam a aplicação das penas e não finalidades de retribuição e expiação. Na situação dos autos, alcançada que está a paz jurídica, a necessidade de cumprimento da pena por parte do Extraditando não se justifica a não ser por critérios de mera expiação que não tem agasalho na lei substantiva penal portuguesa (cf. art. 40.º, n.º1 do CP).

XXVI – No caso dos autos, à luz da CRP e dos princípios da Convenção Europeia Para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, não faz sentido a extradição de um homem (com saúde debilitada, inserido socialmente em Portugal, onde se encontra a sua família, que necessita de forma premente dos seus cuidados, onde tem trabalhado e desenvolvido trabalho de voluntariado social) no Inverno da vida para, provavelmente, morrer preso (num país de que esteve ausente por 40 anos) afastado da família por causa de um crime (grave) cometido quando era um jovem de 18 anos de idade.”

 

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 30-10-2013

(http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/d1d5ce625d24df5380257583004ee7d7/0fab00c6a2ab290380257c2200521381?OpenDocument)

“I – Integra o tipo de crime de Ofensa a organismo, serviço ou pessoa coletiva, do artigo 187º, do Código Penal, apenas a afirmação ou propalação de factos inverídicos e ofensivos e não (ao contrário do que se verifica com os crimes de Difamação do artigo 180º, do Código Penal, e de Injúria do artigo 181º do mesmo Código) a formulação de juízos ofensivos.

II – Este é um crime de perigo: basta que os factos em questão sejam capazes de ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança do visado, mesmo que essa credibilidade, esse prestígio, ou essa confiança não tenham sido efetivamente atingidos.
III – Constitui “meio de comunicação social”, para o feito do nº 2 do artigo 183º do Código Penal uma página do “Facebook” acessível a qualquer pessoa e não apenas ao grupo de “amigos”.

IV – Em caso de provimento de um recurso que tem como consequência a condenação do arguido, cabe ao tribunal de segunda instância fixar a pena respetiva, sem que tal implique violação do duplo grau de jurisdição.”

 

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-11-2013

(http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/95b84657804fafce80257c22005efbec?OpenDocument)

“I. Tendo os Réus sido demandados civilmente para satisfazerem uma indemnização à Autora, aqui Recorrente, uma vez que foram condenados, em processo crime, pela co-autoria de um crime de abuso de confiança em que aquela foi a ofendida, é solidária a sua responsabilidade, respondendo assim, solidariamente, pelos danos causados em bloco à Autora, nos termos do que se predispõe nos artigos 490º e 497º do CCivil, aplicáveis ex vi do artigo 129º do CPenal pois segundo tal ínsito legal «A indemnização de perdas e danos emergentes de crime é regulada pela lei civil.».

II. Os pressupostos da solidariedade são: o direito à prestação integral; efeito extintivo recíproco ou comum; identidade da prestação; identidade da causa; e comunhão de fim.

III. Tendo os Réus praticado os factos objecto da sua condenação criminal através e no interesse das respectivas sociedades, agiram os mesmos não só em proveito próprio mas também no âmbito da qualidade que possuíam de sócios gerentes das sociedades Rés, actuando em sua representação e repartindo com as mesmas os proveitos da sua actividade delituosa, integrando os réditos finais quer nos seus patrimónios pessoais, quer nos patrimónios societários, sendo assim inquestionável a responsabilidade civil das Recorridas sociedades pelos actos praticados pelos seus gerentes.

IV. Não se mostrando alegada, nem provada, a diferenciação dos danos produzidos na esfera jurídica da Autora por aqueles Réus, pessoas singulares,  isto é, não tendo aqueles Réus alegado nas respectivas contestações que a sua participação ilícita lesou a Autora em verbas diversas, sendo os proveitos daí decorrentes igualmente diferentes, por forma a podermos concluir que não poderão os mesmos vir a ser condenados de igual forma como pretende aquela, mas antes na medida da sua participação no dano, como concluiu no segundo grau, sendo aliás indiferente que os Réus tenham sido absolvidos da prática do crime de associação criminosa que lhes vinha assacado, posto que os mesmos foram condenados em co-autoria pela prática de um crime de abuso de confiança, condenação esta geradora, a se, da obrigação de indemnizar e, por força do preceituado nos artigos 490º e 497º, nº1 do CCivil se forem vários os autores do facto ilícito todos eles responderão pelos danos sendo solidária a sua responsabilidade.

V. Não seria, nem é, da efectiva ocorrência daqueloutro ilícito penal que provem a fonte da solidariedade passiva, tese esta que serviu de respaldo ao Aresto impugnado, mas antes da efectiva condenação dos Réus, em co-autoria, pela prática do crime de abuso de confiança que lhes foi imputado.

VI. A construção sustentada em sede de recurso de Apelação não resultou da expressão factual levada às contestações apresentada pelos então Recorrentes, por forma a fazer precludir a presunção prevista no normativo inserto no artigo 516º do CCivil, posto que nenhum daqueles Réus alegou na oportunidade quaisquer materialidade inviabilizadora do cumprimento unitário da obrigação aqui peticionada pela Autora/Recorrente de harmonia com o disposto no artigo 512º, nº1 daquele mesmo diploma legal.”



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