Consulta n.º 2/2011
Questão
Veio a Senhora Advogada, Dra. A, solicitar a pronúncia deste Conselho Distrital sobre uma situação de eventual conflito de interesses.
O enquadramento factual, tal como exposto pela Senhora Advogada Consulente é, em síntese, o seguinte:
No âmbito do processo de inventário pendente no 1º Juízo Cível de Coimbra, sob o n.º -, o Senhor Advogado, Dr. B, patrocina os interesses da cabeça de casal.
O Senhor Advogado, Dr.B, patrocina também a sua cliente na acção de remoção da cabeça de casal.
Ao mesmo tempo, o Senhor Advogado, Dr. B, representa a Sociedade X, Lda., que pertence à herança, nas várias acções que contra aquela foram movidas pelo Senhor Y, herdeiro e co-sócio da Sociedade.
A Senhora Advogada requerente representa o Senhor Y em todos os processos judiciais pendentes.
Acresce ao já exposto, a circunstância de o Senhor Advogado, Dr. B, ter apresentado uma queixa-crime contra o cliente da Senhora Advogada Consulente, a qual corre os seus termos na 2ª Secção do D.I.A.P. de Coimbra, sob o n.º -.
O cliente da Senhora Advogada Consulente, por sua vez, também apresentou uma queixa-crime contra o Senhor Advogado, Dr. B, no âmbito da qual, inclusive, já foi constituído arguido.
Considerando a factualidade exposta, vem a Senhora Advogada Consulente solicitar a emissão de parecer quanto à eventual existência de conflito de interesses.
Opinião
Nos termos do disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 50º do Estatuto da Ordem dos Advogados (doravante E.O.A.), aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro, compete ao Conselho Distrital de Lisboa pronunciar-se sobre as “questões de carácter profissional”.
Tem-se entendido que as “questões de carácter profissional” são as inerentemente estatutárias, isto é, as que relevam dos princípios, regras, usos e praxes que comandam ou orientam o exercício da advocacia, maxime as que decorrem das normas do E.O.A., do regime jurídico das Sociedades de Advogados e do universo de normas emergentes do poder regulamentar próprio reconhecido por lei aos órgãos da Ordem dos Advogados.
Mas esta competência, prevista na alínea f) do n.º 1 do artigo 50º do E.O.A., deve ser entendida sem prejuízo da competência específica atribuída a outros órgãos em determinadas matérias, nomeadamente em matéria de acção disciplinar.
A pronúncia do Conselho Distrital de Lisboa sobre as questões de ética ou deontologia profissional cinge-se, estritamente, às questões colocadas em abstracto e que não envolvam qualquer juízo valorativo sobre situações concretas.
Não compete, assim, ao Conselho Distrital de Lisboa apreciar quaisquer concretas condutas dos Senhores Advogados depois de as mesmas terem tido lugar.
Nos termos do E.O.A., a função jurisdicional compete, em exclusivo, aos titulares dos órgãos da Ordem dos Advogados com competência disciplinar.
Se nos pronunciássemos sobre a questão que nos foi colocada, estaríamos a imiscuir-nos em matéria que, nos termos do artigo 54º alíneas a) e b) do E.O.A., é da exclusiva competência dos Conselhos de Deontologia, uma vez que o que está em causa é, pura e simplesmente, a apreciação da conduta deontológica do Senhor Advogado, Dr. B.
Ora, a estreita conexão da matéria em apreço com a situação concreta a que acima se aludiu impede a emissão do Parecer solicitado em termos abstractos, já que seria inevitável que as conclusões alcançadas não tivessem reflexo valorativo na conduta concreta do Senhor Advogado, Dr. B.
Em suma, o princípio da legalidade, a que o Conselho Distrital está vinculado na sua actuação, impede a emissão do Parecer solicitado, sob pena de, se tal se fizesse, se estar a exorbitar o âmbito da competência material deste Conselho.
CONCLUSÕES:
1. Nos termos do disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 50º do Estatuto da Ordem dos Advogados (doravante E.O.A.), aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro, compete ao Conselho Distrital de Lisboa pronunciar-se sobre as “questões de carácter profissional”.
2. Mas esta competência, prevista na alínea f) do n.º 1 do artigo 50º do E.O.A., deve ser entendida sem prejuízo da competência específica atribuída a outros órgãos em determinadas matérias, nomeadamente, em matéria de acção disciplinar.
3. A pronúncia do Conselho Distrital de Lisboa sobre as questões de ética ou deontologia profissional cinge-se, estritamente, às questões colocadas em abstracto e que não envolvam qualquer juízo valorativo sobre situações de facto concreto.
4. Assim, não compete ao Conselho Distrital de Lisboa apreciar concretas condutas dos Senhores Advogados depois de as mesmas terem tido lugar.
5. A função jurisdicional compete, em exclusivo, aos titulares dos órgãos da Ordem dos Advogados com competência disciplinar.
6. Se nos pronunciássemos sobre a questão que nos foi colocada, estaríamos a imiscuir-
-nos em matéria que, nos termos do artigo 54º alíneas a) e b) do E.O.A., é da exclusiva competência dos Conselhos de Deontologia, uma vez que o que está em causa é, pura e simplesmente, a apreciação da conduta deontológica do Senhor Advogado, Dr. B.
7. Considerando o exposto, decide-se não emitir o Parecer solicitado.
Notifique-se.
Lisboa, 15 de Abril de 2011.
A Assessora Jurídica do C.D.L.
Sandra Barroso
Concordo e homologo o despacho anterior, nos precisos termos e limites aí fundamentados,
Lisboa, 27 de Abril de 2011.
O Vogal do Conselho Distrital de Lisboa
(por delegação de poderes de 20 de Janeiro de 2011)
Paulo de Sá e Cunha
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