Consulta 30/2011
Consulta n.º 30/2011
Assunto:
• Domicílio Profissional – Artigo 86º, al. h) do EOA.
• Placa ou tabuleta identificativa do escritório – Artigo 89º, n.º 2, al. n) do EOA.
Dos factos
A Senhora Advogada, Dra. - , titular da cédula profissional n.º - L, veio solicitar ao Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados a emissão de parecer quanto às questões que passamos a enunciar.
A Senhora Advogada Consulente pretende arrendar um espaço para aí fixar o seu domicílio profissional. O espaço em causa situa-se por detrás de uma loja, cujo ramo de actividade, tal como definido pela Senhora Advogada Consulente, é o “ramo de chaves” e tem uma porta que o separa do resto da loja, mas a entrada de acesso é a mesma da loja.
Quanto a este aspecto, refere a Senhora Advogada Consulente que “os clientes dirigir-se-ão a uma porta no fim da loja para entrar para o escritório”.
Considerando o exposto, pretende a Senhora Advogada Consulente saber:
1. Se será possível arrendar o mencionado espaço para aí fixar o seu domicílio profissional e ainda;
2. Se, na placa identificativa do escritório, poderá inscrever as áreas de direito que exerce preferencialmente.
As questões colocadas subsumem-se, precisamente, a questões de carácter profissional, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 50º do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA), pelo que haverá que emitir parecer nos termos solicitados, tendo por base, apenas, os factos que nos foram transmitidos e pela forma como o foram.
Entendimento do Conselho Distrital de Lisboa
Diz-nos o n.º 1 do artigo 83º do Código Civil que a pessoa que exerce uma profissão tem, quanto às relações a que esta se refere, domicílio profissional no lugar onde a profissão é exercida.
No caso do Advogado, o lugar onde a profissão é exercida será grosso modo o escritório.
Ora, o Estatuto é omisso quanto às condições que deverão envolver a instalação de escritório de um Advogado, nada se regulando, directamente, quanto aos espaços onde este pode e não pode ser instalado.
Há, contudo, que ter em conta o estatuído na alínea h) do artigo 86º do EOA, segundo a qual constitui um dever do Advogado para com a Ordem dos Advogados, manter um domicílio profissional dotado de uma estrutura que assegure o cumprimento dos seus deveres deontológicos, nos termos de regulamento a aprovar pelo Conselho Geral.
Não obstante a inexistência deste regulamento, o Advogado está sempre ligado, em qualquer local onde exerça a profissão, ao acervo de regras deontológicas – direitos e deveres – que enformam a profissão e o seu exercício e que decorrem, tanto do Estatuto da Ordem dos Advogados, como dos usos e praxes profissionais.
Tal como foi defendido no Parecer do C.D.L. n.º 82/5005, e avançando um pouco na interpretação do disposto na alínea h) do artigo 86º do EOA, para além da estrutura interna (meios de trabalho, comunicação e meios administrativos) que enformará o funcionamento do escritório, também o próprio local – tendo em conta os circunstancialismos que o rodeiam, tem obrigatoriamente de ser “conforme” ao cumprimento dessas regras deontológicas. E, entendeu-se nesse Parecer que todos esses elementos cabem na esfera de protecção da alínea h) do artigo 86º do EOA.
Pelo que, em teoria, poderá dizer-se que determinados locais podem não ser conformes às regras que subjazem ao exercício da profissão.
No caso concreto, entendemos que a instalação de um escritório nos moldes preconizados pela Senhora Advogada Consulente não assegura devidamente o cumprimento dos deveres deontológicos a que a Senhora Advogada Consulente está vinculada no exercício da sua actividade profissional e acaba por beliscar a própria dignidade da profissão.
De facto, na situação descrita pela Senhora Advogada Consulente, é evidente que haverá uma exposição pública, desde logo, do mero acto de consulta à Senhora Advogada Consulente, facto este, ele próprio, protegido pelo sigilo profissional.
Ou seja, um escritório nos moldes preconizados pela Senhora Advogada Consulente não assegura a confidencialidade e a privacidade necessárias ao exercício da profissão.
De facto, não só a pessoa que ficar à frente da “loja de chaves” como também os clientes da própria loja ficarão a saber que determinada ou determinadas pessoas foram obter apoio jurídico da Senhora Advogada Consulente.
Haverá, assim, uma devassa pública para o que se passa no escritório, pelo menos quanto à identidade dos clientes do escritório, que tem de ser, obviamente, salvaguardada à luz do dever de segredo profissional.
A deslocação a um escritório de Advogados deve ser um momento intimista, de recado, de privacidade, que o modelo proposto de todo não assegura.
Para além do exposto, entendemos ainda que um escritório nos moldes preconizados pela Senhora Advogada Consulente contribui para a vulgarização de exercício da Advocacia, colocando a prestação de serviços jurídicos como se de prestação de quaisquer bens ou serviços de tratasse.
A Advocacia, profissão de interesse público, tem uma dignidade e um estatuto próprios, que o modelo proposto pela Senhora Advogada Consulente põe, a nosso ver, em causa.
Tudo ponderado, entendemos que um escritório instalado na parte detrás de uma “loja de chaves” não permite que a Senhora Advogada Consulente mantenha, conforme exigido pela alínea h) do artigo 86º do EOA, um domicílio profissional dotado de uma estrutura que permita preservar o segredo profissional, ao mesmo tempo que contende com o próprio prestígio e dignidade da profissão.
Passemos de seguida à análise da segunda questão.
Esta segunda questão está especialmente tratada no artigo 89º do EOA, que versa sobre a informação e a publicidade.
A Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro veio alterar significativamente o regime jurídico da publicidade de Advogados e de Sociedade de Advogados.
De facto, passou-se do princípio regra da proibição da publicidade , para um princípio regra de permissão da divulgação de informação objectiva, como se afirma no n.º 1 do artigo 89º do actual EOA.
No n.º 2 da mencionada norma legal, o legislador dá-nos vários exemplos de informação objectiva, no n.º 3, exemplifica o que são actos lícitos de publicidade e, por fim, no n.º 4, tipifica alguns actos ilícitos de publicidade.
E, de entre os exemplos de informação objectiva, o legislador inseriu na alínea n) do n.º 2 do artigo 89º do EOA, a colocação, no exterior do escritório, de uma placa ou tabuleta identificativa do escritório (sublinhado nosso).
E as placas ou tabuletas como suportes de divulgação da actividade profissional do Advogado apenas podem ter o fim e o conteúdo (máximo) definido no próprio preceito que nos encontramos a analisar – identificação da existência do próprio escritório.
A entender-se o contrário, isto é, a entender-se que as placas ou tabuletas poderiam constituir suporte de qualquer acto de informação ou de publicidade, a alínea n) do n.º 2 do artigo 89º do EOA e, em particular a sua parte final, seria claramente redundante.
Em suma, resulta para nós evidente que foi intenção clara do legislador considerar as placas ou tabuletas como elemento, estritamente, de identificação da existência do escritório do Advogado, não sendo, portanto, lícito, à luz da alínea n) do n.º 2 do artigo 89º do EOA, fazer constar, como a Senhora Advogada Consulente pretende, da placa identificativa do seu escritório as áreas de direito que exerce preferencialmente.
Este é, s.m.o., o nosso entendimento sobre as questões que nos foram colocadas.
CONCLUSÕES:
1. Nos termos do disposto na alínea h) do artigo 86º do EOA, constitui um dever do Advogado para com a Ordem dos Advogados, manter um domicílio profissional dotado de uma estrutura que assegure o cumprimento dos seus deveres deontológicos, nos termos de regulamento a aprovar pelo Conselho Geral.
2. Não obstante a inexistência deste regulamento, o Advogado está sempre ligado, em qualquer local onde exerça a profissão, ao acervo de regras deontológicas – direitos e deveres – que enformam a profissão e o seu exercício e que decorrem, tanto do Estatuto da Ordem dos Advogados, como dos usos e praxes profissionais.
3. Um escritório instalado na parte detrás de uma “loja de chaves” não permite que a Senhora Advogada Consulente mantenha, conforme exigido pela alínea h) do artigo 86º do EOA, um domicílio profissional dotado de uma estrutura que permita preservar o segredo profissional, ao mesmo tempo que contende com o próprio prestígio e dignidade da profissão.
4. Foi intenção clara do legislador considerar as placas ou tabuletas como elemento, única e exclusivamente, de identificação da existência do escritório do Advogado, não sendo, portanto, lícito, à luz da alínea n) do n.º 2 do artigo 89º do EOA, fazer constar, como a Senhora Advogada Consulente pretende, da placa identificativa do seu escritório as áreas de direito que exerce preferencialmente.
Notifique-se.
Lisboa, 31 de Julho de 2012.
A Assessora Jurídica do C.D.L.
Sandra Barroso
Concordo e homologo o parecer anterior, nos precisos termos e limites aí fundamentados,
Lisboa, 31 de Julho de 2012.
O Presidente do Conselho Distrital de Lisboa
Vasco Marques Correia
Sandra Barroso
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