Consulta 43/2012
Consulta n.º 43/2012
Assunto:
Segredo Profissional – Artigo 87º do EOA.
Dos Factos
Veio o Exmo. Senhor Juiz titular do processo n.º - , pendente na 8ª Vara Cível de Lisboa, solicitar a pronúncia do Conselho Distrital de Lisboa quanto à sujeição, ou não, ao dever de sigilo dos documentos juntos pela Autora e constantes de fls. 1582 a 1597 dos autos.
Da competência consultiva do Conselho Distrital de Lisboa
Nos termos do disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 50º do Estatuto da Ordem dos Advogados (doravante EOA), aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro, compete aos Conselhos Distritais pronunciarem-se sobre questões de carácter profissional, que se suscitem no âmbito da sua competência territorial.
A competência consultiva dos Conselhos Distritais está, assim, limitada pelo EOA a questões inerentemente estatutárias, isto é, as que decorrem dos princípios, regras, usos e praxes que regulam e orientam o exercício da profissão, maxime as que decorrem das normas do EOA, do regime jurídico das sociedades de advogados e do universo de normas emergentes do poder regulamentar próprio reconhecido pela lei aos órgãos da Ordem dos Advogados.
Ora, a matéria colocada à apreciação deste Conselho Distrital subsume-se, precisamente, a uma questão de carácter profissional nos termos descritos, pelo que há que proceder à emissão de parecer nos termos solicitados.
Entendimento do Conselho Distrital de Lisboa
Estipula o n.º 1 do artigo 87º do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA) que “O Advogado é obrigado a guardar segredo profissional no que respeita a todos os factos cujo conhecimento lhe advenha do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços”.
O n.º 1 desta norma legal contém aquilo que poderá caracterizar-se como a verdadeira regra geral do instituto jurídico-deontológico.
A enumeração das alíneas do n.º 1 é meramente exemplificativa como, de resto, decorre deste logo do elemento literal.
E, reportando-se o sigilo profissional a factos, estes poderão, desde logo, estar contidos em documentos.
Daí que o n.º 3 do artigo 87º do EOA preceitue que “O segredo profissional abrange ainda documentos ou outras coisas que se relacionem, directa ou indirectamente, com os factos sujeitos a sigilo”.
Mas que correspondência está abrangida pela esfera de protecção do sigilo profissional?
Desde logo e como já vimos, a correspondência que contiver factos sigilosos.
Mas a sujeição ao dever de sigilo pressupõe, cumulativamente, outro requisito.
Assim, é ainda pressuposto necessário da sujeição ao dever de sigilo que esteja em causa correspondência dirigida a Advogado e/ou subscrita por Advogado.
Não se pode, obviamente, interpretar literalmente o conteúdo dos n.ºs 1 e 3 do artigo 87º do EOA.
Tal interpretação maximalista e, digamos, desenquadrada do espírito do sistema, colocar-nos-ia perante soluções totalmente desprovidas de sentido.
Por exemplo, a seguir-se essa interpretação, qualquer documento público que chegasse ao conhecimento do Advogado estaria sempre abrangido pelo sigilo profissional, pelo simples facto de ter chegado ao seu conhecimento no exercício da profissão e por causa desse mesmo exercício.
Não é isso, obviamente, o que se pretende.
No caso concreto, e independentemente do momento processual em que a correspondência surgiu, verificamos que não está em causa correspondência trocada ou subscrita por Advogado.
O que está em causa é correspondência trocada entre as partes.
E a correspondência trocada entre as partes não está abrangida pela esfera de protecção do sigilo profissional.
Verificamos que existe, na situação que ora nos ocupa, uma pequena nuance.
Desde logo, a circunstância de A ter enviado para a representante legal da Ré, Dra. B, os emails sobre os quais é solicitada a nossa pronúncia com conhecimento da Senhora Advogada, Dra. C[1].
E esta circunstância é apta a alterar a conclusão a que anteriormente chegámos?
Entendemos que não.
De facto, a correspondência de fls. 1582 a 1597 dos autos contém as posições e os fundamentos da Autora quanto a aspectos controvertidos no processo judicial em curso.
Mas estas posições e estes fundamentos foram sendo comunicados, directa e exclusivamente, pela Autora, e não por intermédio do seu Advogado.
Para que a correspondência estivesse abrangida pela esfera de protecção do sigilo seria necessário que, pelo menos uma das partes estivesse, aquando da comunicação dessas posições e desses fundamentos, representada por Advogado.
Não sendo o caso, a mera circunstância dos emails terem seguido com conhecimento da Senhora Dra. C não altera o entendimento atrás explanado quanto à não sujeição a sigilo da correspondência de fls. 1582 a 1597 dos autos.
Assim sendo, a junção da mencionada correspondência aos autos não carece da autorização prévia prevista no n.º 4 do artigo 87º do EOA.
É este, s.m.o., o nosso entendimento quanto à questão que nos foi colocada.
Notifique-se.
Lisboa, 31 de Outubro de 2012.
A Assessora Jurídica do C.D.L.
Sandra Barroso
Concordo e homologo o parecer anterior, nos precisos termos e limites aí fundamentados,
Lisboa, 31 de Outubro de 2012.
O Presidente do Conselho Distrital de Lisboa
Vasco Marques Correia
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[1] Considerando os escassos elementos que nos foram fornecidos pelo Tribunal, apenas conseguimos concluir, após consulta à nossa Base de Dados, que a Senhora C é Advogada.
Contudo, mesmo que os emails tenham sido enviados com conhecimento de outros Advogados, tal circunstância em nada colide com o entendimento por nós perfilhado sobre a questão que nos foi colocada.
Sandra Barroso
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