Doutrina

João Calvão da Silva - Responsabilidade civil dos administradores não executivos, da Comissão de Auditoria e do Conselho Geral e de Supervisão
 

RESPONSABILIDADE CIVIL
DOS ADMINISTRADORES NÃO EXECUTIVOS,
DA COMISSÃO DE AUDITORIA
E DO CONSELHO GERAL E DE SUPERVISÃO

Pelo Prof. Doutor João Calvão da Silva

1. Modelos de “corporate governance” na reforma de 2006: o modelo tradicional, o modelo anglo-saxónico e o modelo dualista

I —
De acordo com o n.° 1 do art. 278.° do Código das Sociedades Comerciais, na redacção dada pelo art. 2.° do Decreto-lei n.° 76.°-A/2006, de 29 de Março(1),

“A administração e a fiscalização da sociedade podem ser estruturadas segundo uma de três modalidades:
a) Conselho de administração e conselho fiscal;
b) Conselho de administração, compreendendo uma comissão de auditoria, e revisor oficial de contas;
c) Conselho de administração executivo, conselho geral e de supervisão e revisor oficial de contas”.

Relativamente ao direito pregresso, a recentíssima reforma introduziu um novo modelo de corporate governance: o sistema monista anglo-saxónico (al. b))(2).

II — Assim, com este alargamento ou enriquecimento de modelos legais de organização de sociedades anónimas, empreendedores e agentes económicos em Portugal dispõem a partir de 30 de Junho de 2006, data da entrada em vigor do Decreto-lei n.° 76.°-A/2006 (art. 64.°), de uma maior e mais flexível pluralidade de escolha do modelo de governação para as suas empresas: a opção entre o sistema tradicional (al. a)), o sistema anglo-americano (al. b)) e o sistema dualista (al. c)).

Opção alternativa, sem possibilidade de cumulação, combinação ou mistura de elementos típicos dos distintos modelos (cherry-picking) nos órgãos obrigatórios, dada a continuação do princípio da tipicidade das sociedades comerciais (art. 1.°, n.os 2 e 3, do Código das Sociedades Comerciais) e inerente segurança jurídica proporcionada a sócios, credores, fornecedores, clientes e público em geral.

III — Deste modo, sobretudo pela consagração do modelo anglo-saxónico, procura o legislador português acompanhar os mais recentes desenvolvimentos verificados na teoria da corporate governance(3), em resposta às escandalosas fraudes da Enron, da Worldcom e de tantas outras sociedades (Adalphia, Tyco, Global Crossing, Parmalat, etc.).

A evolução da teoria do governo societário — a ideia de “corporate governance” assume grande relevo já nos anos 30 do século XX, nos Estados Unidos, com a separação entre (propriedade do) capital e management, e depois nos anos 70 com o financiamento ilegal da campanha presidencial de Nixon — verificada nos últimos anos parte de constatações:

A raridade de o conselho de administração ser capaz de gerir activamente uma grande sociedade e a correspondente delegação de responsabilidades em executivos profissionais, com tempo, disponibilidade e competência para a gestão diária dos negócios da empresa;

O papel passivo do conselho de administração (delegante) na monitorização e controlo dos executivos (executive officers e CEO) da sociedade, com frequente inversão de posições: o “domínio” do (processo decisório do) conselho de administração pela comissão executiva, em especial pela CEO, designadamente em sociedades com o capital disperso por muitos pequenos accionistas e sem incentivo para controlar activa e efectivamente a gestão — CEO que controla a informação e a agenda das (poucas) reuniões do conselho de administração a que muitas vezes preside, acumulando as funções de chairman, e assim previne a apreciação crítica do desempenho da gestão, que acaba por exercer os plenos poderes do conselho de administração, transformado em órgão passivo, composto por “yes men”, de “ratificação automática” de actos daquela.

Estes dados de facto e as fraudes verificadas em sociedades várias aumentaram a pressão para não continuar a contemporizar-se com uma gestão sem efectiva e eficaz supervisão, emergindo com força o paradigma do controlo da gestão por monitores activos e independentes. E é neste contexto que surge nos EUA a SOX–Sarbanes Oxley Act de 2002 (Public Company Accounting Reform and Investor Protection Act) e na sua esteira irrompe por toda a parte o ímpeto reformista do governo das sociedades(4), com vista a restaurar as abaladas credibilidade, fiabilidade e transparência do mercado através de revitalizado, qualificado e (pro)activo órgão de controlo e supervisão da gestão nos diferentes modelos (conselho fiscal, comissão de auditoria, conselho geral e de supervisão), com a imprescindível literacia financeira e expertise de contabilidade ou auditoria e a necessária independência para o mesmo se não deixar capturar pelos fiscalizados (gestão e auditores externos) e assim poder ter um efectivo e eficiente julgamento sério, isento e rigoroso da gestão, promovendo sobretudo a qualidade, a confiabilidade e a transparência do reporting financeiro e do disclosure (discutindo-o com os auditores externos independentes, revendo-o e discutindo-o com a gestão) pela sua axial importância para os mercados, investidores e performances das economias.

Todo este movimento de reforma (Alemanha, Itália, França, Inglaterra, etc.) tendente a um são e prudente governo societário,(5) impulsionado por desastres como Enron e Worldcom (em 2000 a Chief Executive magazine nomeava o board da Enron como um dos cinco melhores na América!), acompanha ou segue mesmo a reactiva SOX — et pour cause, já que esta é aplicável também às sociedades estrangeiras cotadas na New York Stock Exchange — que introduziu um “hard law” sobre aspectos múltiplos, tais como: a independência de auditores externos e a regra de estes ficarem proibidos de prestar outros serviços adicionais, principalmente de consultoria; auditorias de supervisão, aumentando o papel, a responsabilidade e reporting dos comités de auditoria; independência dos administradores; protecção dos whistleblowers, accionistas, colaboradores da sociedade ou outros que denunciem irregularidades; disclosure tempestiva e completa da informação ao público; sanções civis e criminais; relação entre conselho de administração, gestão, comissão de auditoria e auditor ou revisor oficial de contas; papel mais activo dos advogados como “gatekeepers”, etc..

Na certeza de que um bom governo é um processo orgânico de adequados e dinâmicos “checks and balances”, assente no factor humano, a exigir honestidade, competência, profissionalismo e cumprimento efectivo das responsabilidades de cada um na posição que ocupa, com a eficiência, a transparência e a accountability que o devem caracterizar a revelarem-se decisivas para a confiança dos investidores e para a performance das economias nacionais num mercado global mais exigente e mais concorrencial.

Sendo para isso decisivas a eficiência e competitividade das empresas na criação de riqueza e de emprego, a nortear os processos de reformas legislativas dos direitos nacionais num movimento de crescente confluência e convergência funcional dos três grandes modelos de estruturação da governação e fiscalização das sociedades comerciais, em especial das sociedades anónimas cotadas em mercado regulamentado(6).

2. Governação societária com administradores não executivos: A) O modelo tradicional

O sistema tradicional ou sistema clássico de estruturação do governo societário baseia-se na distinção entre um órgão de gestão (conselho de administração ou administrador único) e um órgão de controlo (conselho fiscal ou fiscal único).

2.1. Conselho de administração: funcionamento colegial

I —
O conselho de administração é composto pelo número de administradores fixado no contrato de sociedade (art. 390.°, n.° 1), designados no contrato de sociedade ou eleitos pela assembleia geral ou constitutiva (art. 391.°, n.° 1).

Note-se o desaparecimento da anterior imposição de número ímpar de membros e a correspondente atribuição de voto de qualidade ao presidente nas deliberações do conselho composto por um número par de administradores (art. 395.°, n.° 3, al. a)), sem prejuízo de o contrato de sociedade poder atribuir igualmente voto de qualidade ao presidente nas deliberações do conselho nos restantes casos (art. 395.°, n.° 3, al. b)).

O contrato de sociedade pode dispor que a sociedade tenha um só administrador, desde que o capital social não exceda €200.000 (arts.278.°, n.° 2, e art. 390.°, n.° 2). Os administradores, pessoas singulares com capacidade jurídica plena, podem não ser accionistas (art. 390.°, n.° 3); se uma pessoa colectiva for designada administrador, deve nomear uma pessoa singular para exercer o cargo em nome próprio, respondendo aquela solidariamente com esta e pelos actos desta (art. 390.°, n.° 4). O contrato de sociedade pode autorizar a eleição de administradores suplentes, até número igual a um terço do número de administradores efectivos (art. 390.°, n.° 5).

II — Consabidamente, são da competência do conselho de administração, não só a representação plena e exclusiva da sociedade (art. 405.°, n.° 2), mas também a gestão das actividades da sociedade (art. 405.°, n.° 1) compreendidas no objecto contratual e cujo exercício efectivo haja sido deliberado pelos sócios (art. 11.°, n.os 2 e 3), cabendo-lhe, por isso e para isso, deliberar sobre qualquer assunto de administração da sociedade, nomeadamente os elencados nas várias alíneas do art. 406.°. Sobre as matérias de gestão, vale dizer, o tráfico ou giro da sociedade, a exploração da empresa social, os accionistas só podem deliberar a pedido do órgão de administração (art. 373.°, n.° 3), norma imperativa que confere competência própria e exclusiva ao conselho de administração para gerir as actividades sociais, sob pena de nulidade de deliberação da assembleia geral sobre matéria de gestão: o conteúdo da deliberação não está, por natureza, sujeito a deliberação dos sócios (art. 56.°, n.° 1, al. c)) ou é ofensivo de preceitos legais inderrogáveis mesmo por vontade unânime dos sócios (art. 56.°, n.° 1, al. c))(7).

Consabidamente, ainda, para protecção de terceiros e da segurança do comércio jurídico em geral, os actos praticados pelos administradores, em nome da sociedade e dentro dos poderes substantivos (arts. 405.° e 406.°) e procedimentais (art. 408.°) que a lei lhes confere, vinculam-na para com terceiros—sendo irrelevantes as limitações (não legais) constantes dos estatutos ou resultantes de deliberações dos accionistas, mesmo que essas limitações estejam publicadas e sejam conhecidas dos terceiros (art. 409.°, n.° 1) — salvo se actos não incluídos no âmbito do objecto social, vale dizer, salvo se actos estranhos à actividade da sociedade (art. 11.°), conforme resulta do n.° 2 do art. 409.°:

“A sociedade pode, no entanto, opor a terceiros as limitações de poderes resultantes do seu objecto social”—e só do objecto social, porque as outras limitações são irrelevantes nos termos da segunda parte do n.° 1 do mesmo preceito(8)—, “se provar que o terceiro sabia ou não podia ignorar, tendo em conta as circunstâncias, que o acto praticado não respeitava essa cláusula e se, entretanto, a sociedade o não assumiu, por deliberação expressa ou tácita dos accionistas(9).

Consabidamente, por fim, é conhecida a imperatividade do funcionamento colegial do conselho de administração, quer do quorum constitutivo —“o conselho não pode deliberar sem que esteja presente ou representada a maioria dos seus membros” (art. 410.°, n.° 4) — quer do quorum deliberativo: “as deliberações são tomadas por maioria dos votos dos administradores presentes ou representados e dos que, caso o contrato de sociedade o permita, votem por correspondência” (art. 410.°, n.° 7)(10).

2.2. Conselho de administração: atribuição de encargo especial a algum ou alguns administradores (art. 407.°, n.os 1 e 2) e responsabilidade solidária de todos os administradores (art. 73.°)

I —
“A não ser que o contrato de sociedade o proíba, pode o conselho encarregar especialmente algum ou alguns administradores de se ocuparem de certas matérias de administração” (art. 407.°, n.° 1).

E continua o n.° 2 do mesmo art. 407.°:
“O encargo especial referido no número anterior não pode abranger as matérias previstas nas alíneas a) a m) do artigo 406.° e não exclui a competência normal dos outros administradores ou do conselho nem a responsabilidade daqueles, nos termos da lei”.

Trata-se de mera distribuição interna de tarefas, com o conselho a cometer encargo especial a algum ou alguns administradores, sem propriamente(11) repartir as competências do conselho de administração: este, autor do encargo, e os outros administradores (não encarregados especialmente de se ocuparem de certa matéria) mantêm, de iure, a competência para gerir as actividades da sociedade, com todos os poderes e deveres normais de administração ou gestão da empresa, tal como se não tivesse sido atribuído internamente, de facto, encargo especial a algum ou alguns administradores.

II — Por isso mesmo, e em plena e justificada coerência, também não é excluída a normal responsabilidade dos administradores não encarregados especialmente de certa matéria: permanecendo, de iure, não só o poder mas também e sobretudo o dever de gerir colegialmente (art. 410.°) a sociedade a cargo de todos e cada um dos administradores, encarregados ou não especialmente de se ocuparem, de facto, de certa matéria, nada mais natural do que a responsabilização de todos os administradores nos termos da lei: responsabilidade para com a sociedade (arts. 72.° a 77.°), responsabilidade para com os credores sociais (art. 78.°) e responsabilidade para com os sócios e terceiros (art. 79.°), não fazendo sentido a distinção entre administradores executivos e administradores não executivos.

Em qualquer destas hipóteses, verificados os respectivos pressupostos ou requisitos, a responsabilidade dos administradores (encarregados ou não especialmente de se ocuparem de certas matérias) perante os lesados será solidária, nos termos do art. 73.°, n.° 1, igualmente aplicável à responsabilidade para com os credores sociais e à responsabilidade para com os sócios e terceiros, ex vi do art. 78.°, n.° 5, e do art. 79.°, n.° 2, respectivamente. E só nas relações internas entre os administradores o direito de regresso existirá na medida das respectivas culpas e das consequências que delas advierem, presumindo-se iguais as culpas das pessoas responsáveis (art. 73.°, n.° 2; arts.497.°, n.° 2, e 516.° do Código Civil)(12).

Vale isto por dizer que, na hipótese do n.° 1 do art. 407.°, a divisão fáctica das tarefas no seio do conselho não desresponsabiliza nas relações externas os administradores não encarregados especialmente de certa matéria, mantendo-se o regime da responsabilidade solidária (art. 73.°, n.° 1), divisão de facto que relevará apenas nas relações entre os administradores, na acção de regresso (art. 73.°, n.° 2).

Sendo este o regime decorrente do n.° 2 do art. 407.°, protector dos interesses da sociedade, dos credores sociais, dos sócios e de terceiros através da responsabilidade solidária dos administradores (art. 73.°, n.° 1), percebem-se bem duas coisas:

— Que a divisão de facto de tarefas no interior do conselho de administração seja possível, se o contrato de sociedade a não proibir (1.ª parte do n.° 1 do art. 407.°);
— Que mesmo assim o encargo especial não possa abranger as matérias importantes, previstas nas als. a) a m) do art. 406.°, e fique circunscrito a outros assuntos (menores) de administração da sociedade, dada a (desnecessária) falta de autorização dos sócios e a atipicidade e impropriedade da atribuição do encargo especial, que não chega a ser uma verdadeira e própria delegação de poderes apesar da epígrafe do art. 407.° (“delegação de poderes de gestão”).

2.3. Conselho de administração: delegação de poderes de gestão num ou mais administradores ou numa comissão executiva e responsabilidade dos administradores não executivos apenas por culpa própria in vigilando ou falta de intervenção do conselho perante conhecidos actos ou omissões prejudiciais praticados ou o conhecido propósito de serem praticados por aqueles.

I —
Estatui como segue o art. 407.°, n.os 3, 4 e 8:

“3 — O contrato de sociedade pode autorizar o conselho de administração a delegar num ou mais administradores ou numa comissão executiva a gestão corrente da sociedade.

4 — A deliberação do conselho deve fixar os limites da delegação, na qual não podem ser incluídas as matérias previstas nas alíneas a) a d), f), l) e m) do artigo 406.° e, no caso de criar uma comissão, deve estabelecer a composição e o modo de funcionamento desta.

8 — A delegação prevista nos n.os 3 e 4 não exclui a competência do conselho para tomar resoluções sobre os mesmos assuntos; os outros administradores são responsáveis, nos termos da lei, pela vigilância geral da actuação do administrador ou administradores delegados ou da comissão executiva e, bem assim, pelos prejuízos causados por actos ou omissões destes, quando, tendo conhecimento de tais actos ou omissões ou do propósito de os praticar, não provoquem a intervenção do conselho para tomar as medidas adequadas”.

II — Segue-se daqui, em primeiro lugar, que o conselho de administração só pode delegar a gestão corrente da empresa num ou mais administradores ou numa comissão executiva se o contrato de sociedade o permitir ou autorizar (art. 407.°, n.° 3), devendo fixar na deliberação os limites da delegação de poderes em que não podem ser incluídas as matérias previstas nas alíneas a) a d), f), l) e m) do art. 406.° (art. 407.°, n.° 4) — atente-se na menor amplitude dos assuntos indelegáveis relativamente à sobrevista figura de encargos especiais.

Em segundo lugar, a delegação de poderes não exclui a competência do conselho para tomar resoluções sobre os mesmos assuntos (art. 407.°, n.° 8, 1.ª parte), chamando a si matérias objecto da delegação. Avocação de poderes essa que constitui um poder ou faculdade mas não um dever do conselho, salvo na situação prevista na parte final do mesmo n.° 8 do art. 407.° em apreço: tendo conhecimento de actos ou omissões prejudiciais ou do propósito de administrador delegado/comissão executiva os praticar, impõe-se a intervenção do conselho de administração para tomar as medidas adequadas, leia-se, para prevenir tais actos/omissões ou minorar os seus efeitos.

Fora desta hipótese do dever de provocar a intervenção do conselho, os administradores não executivos ficam obrigados tão-somente à vigilância geral (e não de todo e qualquer acto concreto) da actuação do administrador ou administradores delegados ou da comissão executiva (art. 407.°, n.° 8) — a vigilância (mais) específica e analítica permanece no conselho fiscal (arts. 420.° e segs.).

Por isso, porque, diferentemente da mera e sobreanalisada atribuição de encargo especial a algum ou alguns dos administradores (art. 407.°, n.os 1 e 2), a delegação de poderes libera os administradores não executivos (administradores delegantes) do dever de gestão corrente da sociedade e sobre eles impende apenas o dever de controlo, fiscalização ou vigilância geral da actuação dos administradores executivos (administradores delegados), compreende-se a exigência de autorização dos sócios através do contrato de sociedade nesta segunda figura — a figura da delegação de poderes, sensu proprio (art. 407.°, n.° 3) — e não já na primeira, na figura de atribuição de encargo especial a algum ou alguns administradores:

na delegação de poderes, diminuem os deveres e a responsabilidade dos administradores não executivos; na atribuição de encargo especial, diversamente, os deveres e a responsabilidade dos administradores não encarregados especialmente de se ocuparem de certas matérias mantêm-se inalterados.

III — Porque os administradores não executivos da gestão corrente da sociedade estão obrigados a acompanhar “o andamento geral da gestão”, na terminologia do art. 2381.°, n.° 3, do Código Civil italiano, em ordem a responsabilizá-los, nos termos da lei, pela vigilância geral da actuação dos administradores executivos, forçoso é reconhecer-se-lhes o poder-dever de se informarem e serem informados tempestiva e adequadamente sobre a actividade social, a fim de poderem cumprir nos termos devidos esse dever geral de vigilância que impende sobre todos e cada um deles.

Direito-dever de informação activa e passiva, portanto, em coerência com a obrigação de os administradores actuarem em termos devidamente informados, num processus decisionis razoável e segundo critérios de racionalidade empresarial (art. 72.°, n.° 2), a coenvolver poderes de inspecção, de consulta e de inquirição (veja-se o caso paralelo do conselho fiscal — art. 420.°, n.° 3, e art. 421.°, n.° 1).

Isto mesmo vem agora dito no art. 407.°, n.° 6, al. a):

“O presidente da comissão executiva deve assegurar que seja prestada toda a informação aos demais membros do conselho de administração relativamente à actividade e às deliberações da comissão executiva”.

Dever de reporting individual (a todos e cada um dos membros não executivos do conselho) a ser cumprido adequada e tempestivamente (ex post e/ou ex ante conforme as circunstâncias o ditarem ou recomendarem com vista ao escopo visado), a fim de o direito-dever de controlo e monitorização da actividade dos administradores delegados/comissão executiva pelos outros administradores (administradores não delegados ou administradores não executivos) poder ser exercido irrepreensivelmente, com cuidado e diligência profissional (art. 64.°, n.° 2).

Equivale isto a dizer, noutros termos, que a adequada informação relevante e tempestiva se apresenta instrumentalmente necessária e imprescindível ao exacto cumprimento do dever geral de vigilância — dever de vigilância que não passa de uma espécie do género “deveres de cuidado”—que impende sobre os administradores não executivos (art. 407.°, n.° 8), conforme estatui o art. 64.°, n.° 2:

“Os titulares de órgãos sociais com funções de fiscalização devem observar deveres de cuidado, empregando para o efeito elevados padrões de diligência profissional,(13) e deveres de lealdade, no interesse da sociedade”.

E no duplo perfil (de órgão de gestão e de órgão de controlo) que o conselho de administração com delegação de poderes acaba por assumir no sistema (dito monista) tradicional, o dever de vigilância do andamento geral da gestão social pelos outros administradores não delegados, referido no art. 407.°, n.° 8, integra inequivocamente o perfil das funções de fiscalização, a deverem ser cumpridas com profissionalismo e lealdade (art. 64.°, n.° 2) por administradores devidamente informados (art. 72.°, n.° 2), via de regra espontânea e atempadamente pelo administrador delegado ou pelo presidente da comissão executiva (art. 407.°, n.° 6, al. a)), mas também a seu pedido, designadamente em caso de falta ou insuficiência da informação ou em caso de dúvida sobre a (con)fiabilidade da informação recebida.

IV — Termos em que os administradores não executivos (só) serão responsáveis por incumprimento dos seus deveres (art. 407.°, n.° 8), nos termos aplicáveis dos arts.72.° a 77.°, do art. 78.° e do art. 79.°, por força do art. 81.° e não por aplicação directa do art. 73.°:

1) Quando incorrerem em culpa in vigilando da actuação do administrador ou administradores delegados ou da comissão executiva;
2) Quando, tendo conhecimento, em princípio através do cumprimento do dever de informação pelo administrador delegado ou pelo presidente da comissão executiva (art. 407.°, n.° 6), de actos ou omissões prejudiciais (para a sociedade, ou para os credores sociais, ou para os sócios e terceiros) ou do propósito da sua prática pelos administradores executivos, não provoquem a intervenção do conselho (art. 410.°) para tomar as medidas adequadas, incumprindo assim o dever de impedir a materialização de acções ou inacções prejudiciais chegadas ao seu conhecimento ou de eliminar/minorar os danos delas resultantes.

Nesta veste de administradores não executivos e só nas duas hipóteses de violação ilícita dos deveres de vigilância geral e de intervenção acabadas de referir é que os mesmos respondem solidariamente, por culpa própria (art. 73.°, n.° 1, ex vi do art. 81.°, n.° 1), aplicável também à responsabilidade para com os credores sociais e para com os sócios e terceiros, por remissão do art. 78.°, n.° 5, e do art. 79.°, n.° 2, respectivamente.

Afora as duas hipóteses referidas, os administradores não executivos não respondem pelos actos ou omissões ilícitos, culposos e causadores de danos à sociedade (art. 72.° a 77.°), aos credores sociais (art. 78.°) ou aos sócios e terceiros (art. 79.°), imputáveis aos administradores delegados ou administradores executivos. Estes — e só os que na deliberação colegial da comissão executiva(14) votaram a favor ou se abstiveram, não já os que votaram vencidos e lavraram o seu dissenso nem os ausentes (art. 72.°, n.os 3 e 4) — é que são solidários na responsabilidade perante os lesados (art. 73.°, n.° 1), sem prejuízo do direito de regresso na medida das respectivas culpas e das consequências delas resultantes, presumindo-se iguais as culpas dos responsáveis (art. 73.°, n.° 2).

É que os administradores devem cumprir os deveres que lhes são impostos pela lei e pelo contrato com o cuidado adequado às suas funções e a diligência de um gestor criterioso e ordenado (art. 64.°, n.° 1), no âmbito das suas específicas competências. E a competência para a gestão corrente da sociedade é apenas dos administradores delegados ou administradores executivos, sempre que o conselho não chame a si uma matéria objecto da delegação dos seus poderes — logo, não tendo participado nem tendo o dever de participar na deliberação colegial da comissão executiva, os administradores não executivos não são responsáveis (art. 72.°, n.° 3), com a delegação de poderes a excluí-los do âmbito de aplicação directa do art. 73.°.

Por isso, porque cada um responde pelos seus actos ou omissões, os administradores não executivos (sem culpa in vigilando do andamento geral da gestão, não devendo estender-se tão desmesuradamente o dever de vigilância que na prática se caia em responsabilidade objectiva ou como se o administrador não executivo devesse ser um administrador ideal e diligentíssimo a ter de responder por culpa levíssima) não têm de responder solidariamente (art. 73.°), nem pelos danos causados à sociedade por actos ou omissões de administradores delegados violadores de deveres legais ou contratuais (art. 72.°), nem pelos danos decorrentes para os credores sociais da inobservância culposa pelos administradores delegados de disposições legais ou contratuais destinadas à sua protecção (art. 78.°), nem pelos danos directamente causados a sócios e terceiros pelos administradores delegados no exercício e por causa das suas funções (art. 79.°).

Impõe-se, no fundo, o primado da substância (supervisão) sobre a forma (nomen de administradores), resultante da transformação do tradicional conselho de administração em órgão de supervisão da gestão, não tratando por igual o que não é igual: sendo substantivamente diversas as competências, os poderes, os deveres e as remunerações de executivos (que trabalham em tempo inteiro) e de não executivos (que trabalham apenas em tempo parcial), diferentes deverão ser as correspectivas responsabilidades.

Por fim, e em definitivo:
Os administradores não executivos só respondem solidariamente com os administradores executivos pelos actos ou omissões destes quando o dano se não teria produzido se houvessem cumprido as suas obrigações de vigilância geral e de intervenção previstas no art. 407.°, n.° 8, sendo, portanto, uma responsabilidade própria por culpa in vigilando e não uma responsabilidade objectiva por facto de outrem (art. 81.°, n.° 2);

Provado que o dano se teria igualmente produzido ainda que houvessem cumprido com lealdade e diligência profissional (art. 64.°, n.° 2) a obrigação de vigilância geral da actuação dos administradores executivos — pense-se numa fraude financeira, praticada com subtil e inovadora engenharia, que, mesmo com a diligência devida in vigilando, os membros delegantes não teriam detectado —, é excluída a responsabilidade dos administradores não executivos por omissão ou inadequação da vigilância geral devida, que assim não terá sido real concausa adequada do prejuízo resultante de actos ou omissões daqueles no desempenho dos respectivos cargos: os danos ter-se-iam produzido ainda que os administradores não executivos tivessem cumprido o seu dever de fiscalização, no que não vai contida a relevância negativa da causa virtual: não se trata, com efeito, de uma causa hipotética excluir a responsabilidade do autor da causa real do dano, já que este é a comissão executiva e a sua responsabilidade se mantém.

V — Naturalmente, nas matérias não delegadas — e são indelegáveis, inter alia (art. 407.°, n.° 4), relatórios e contas anuais, prestação de cauções e garantias pessoais ou reais pela sociedade, mudanças de sede e aumentos de capital, projectos de fusão, de cisão e de transformação da sociedade — o conselho de administração funciona colegialmente na sua plenitude, sem qualquer distinção no estatuto de administradores, com os respectivos poderes-deveres, também para efeitos de solidariedade na responsabilidade ilimitada ad extra, nas relações externas perante os lesados (art. 73.°).

Nesta hipótese, só nas relações internas entre eles, na acção de regresso, se atenderá às culpas de cada administrador e consequências delas resultantes (art. 73.°, n.° 2), olhando à disponibilidade, à competência técnico-profissional e ao conhecimento da actividade da sociedade adequados às suas funções (art. 64.°, n.° 1), às concretas incumbências atribuídas no seio do conselho e desempenhadas por cada administrador (parâmetro subjectivo) que nesse âmbito deve empregar a diligência de um leal (art. 64.°, n.° 1, al. b)) gestor consciencioso e ordenado (padrão objectivo) para actuar em termos informados, livre de qualquer interesse pessoal e segundo critérios de racionalidade empresarial (art. 72.°, n.° 2), no interesse da sociedade e dos sócios(15).

3. Governação societária com administradores não executivos: B) O modelo anglo-saxónico

3.1. Conselho de administração e comissão de auditoria

O sistema anglo-saxónico de governação societária prevê a existência de
“Conselho de administração, compreendendo uma comissão de auditoria, e revisor oficial de contas” (art. 278.°, n.° 1, al. b)).

E o art. 423.°-B esclarece o significado de “conselho de administração, compreendendo uma comissão de auditoria”, nos termos seguintes:

“A comissão de auditoria (…) é um órgão da sociedade composto por uma parte dos membros do conselho de administração (n.° 1), em número fixado nos estatutos mas no mínimo de três membros efectivos (n.° 2) — a exigir, portanto, que o conselho de administração seja constituído por mais de três elementos (cfr. art. 278.°, n.° 5).

Por sua vez, o art. 423.°-C estatui o seguinte:

“Os membros da comissão de auditoria são designados, nos termos gerais do art. 391.°, em conjunto com os demais administradores (n.° 1);
As listas propostas para o conselho de administração devem discriminar os membros que se destinam a integrar a comissão de auditoria (n.° 2);
Se a assembleia geral não o designar, a comissão de auditoria deve designar o seu presidente (n.° 3)”.

Ao presidente da comissão de auditoria é atribuído voto de qualidade nas deliberações da comissão quando esta seja composta por um número par de membros e, nos restantes casos, se o contrato de sociedade o estabelecer (art. 395.°, n.° 3, ex vi do art. 423.°-C, n.° 4), a mostrar o modo colegial do seu funcionamento, como o da comissão executiva no próprio modelo tradicional (art. 407.°, n.° 7, que, vimo-lo já, remete igualmente para o n.° 3 do art. 395.°).

3.2. Composição qualitativa da comissão de auditoria: honorabilidade, competência e independência dos membros

Aos membros da comissão de auditoria é vedado o exercício de funções executivas na sociedade (art. 423.°-B, n.° 3, 1.ª parte) — logo, os membros da comissão de auditoria são administradores não executivos, aos quais não podem ser cometidos encargos especiais de certas matérias de administração (art. 407.°, n.os 1 e 2) nem delegados poderes de gestão corrente da sociedade (art. 407.°, n.° 3); os mesmos não podem, pois, integrar a comissão executiva ou desempenhar de facto funções gestórias da empresa ou de sociedade que com ela se encontre em relação de domínio ou de grupo (art. 414.°-A, n.° 1, al. c), ex vi do art. 423.°--B, n.° 3, 2.ª parte).

Constituída no seio do próprio conselho de administração, a comissão de auditoria é formada por administradores que se pretendem pessoas sérias, honestas, competentes e independentes.

É o que se retira:

Da aplicação das incompatibilidades previstas para os membros do conselho fiscal no art. 414.°-A, com a óbvia excepção da al. b) do n.° 1, por reenvio do n.° 3 do art. 423.° -B;

Do n.° 4 do art. 423.°-B: “Nas sociedades emitentes de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado e nas sociedades que cumpram os critérios referidos na alínea a) do n.° 2 do artigo 413.°, a comissão de auditoria deve incluir pelo menos um membro que tenha curso superior adequado ao exercício das suas funções e conhecimentos em auditoria ou contabilidade e que, nos termos do n.° 5 do artigo 414.°, seja independente” — veja-se o paralelismo com o conselho fiscal (art. 414.°, n.° 4);

Do n.° 5 do mesmo art. 423.°-B: “Em sociedades emitentes de acções admitidas à negociação em mercado regulamentado, os membros da comissão de auditoria devem, na sua maioria, ser independentes” — veja-se o paralelismo com o conselho fiscal (art. 414.°, n.° 6);

Do n.° 3 do art. 414.°, aplicável ex vi do n.° 6 do art. 423.°-B: “Os restantes membros da comissão de auditoria podem ser sociedades de advogados, sociedades de revisores oficiais de contas ou accionistas, mas neste último caso devem ser pessoas singulares com capacidade jurídica plena e devem ter as qualificações e a experiência profissional adequadas ao exercício das suas funções” — de novo o paralelismo com o conselho fiscal (art. 414.°, n.° 3);

Do n.° 5 do art. 414.°, aplicável por força do n.° 4 do art. 423.°-B e a evidenciar de novo o paralelismo com o conselho fiscal: “Considera-se independente a pessoa que não esteja associada a qualquer grupo de interesses específicos na sociedade nem se encontre em alguma circunstância susceptível de afectar a sua isenção de análise ou de decisão, nomeadamente em virtude de:

a) Ser titular ou actuar em nome ou por conta de titulares de participação qualificada igual ou superior a 2% do capital social da sociedade” — A recomendação da Comissão Europeia n.° 2005/162/CE, de 15/02/05, fala de 50%(16) (anexo II, n.° 1, al. d), e o Regulamento da CMVM de 7/2001 fala de 10% (art. 1.°, n.° 2, al. b));
b) Ter sido reeleita por mais de dois mandatos, de forma contínua ou intercalada”.

Coerentemente, e afastando-se da regra de a remuneração poder ser certa ou consistir parcialmente numa percentagem dos lucros de exercício dentro do máximo destinado aos administradores autorizado por cláusula do contrato de sociedade (art. 399.°, n.os 2 e 3), a remuneração dos membros da comissão de auditoria, semelhantemente à do conselho fiscal (art. 422.°-A), deve consistir numa quantia fixa (art. 423.°-D) — a reflectir o tempo parcial que dedicam à sociedade e a traduzir a sua desejável não dependência económica dessa remuneração e de acções da sociedade (share options, stock options) — e a assembleia geral só os pode destituir por justa causa (art. 423.°-E, designadamente por violação grave dos deveres do administrador e por inaptidão para o exercício normal das respectivas funções, conforme o n.° 4 do art. 403.° ; veja-se, também, o art. 447.°, n.° 8), e não ad nutum como aos restantes administradores (art. 403.°), dadas as pretendidas independência e imparcialidade dos mesmos relativamente aos administradores executivos e aos accionistas e a necessidade de o seu desempenho não ser permeável a pressões(17).

3.3. Competência da comissão de auditoria: funções de controlo e vigilância análogas às do conselho fiscal no modelo tradicional

I —
Não é só na composição qualitativa, remuneração e destituição que a comissão de auditoria se assemelha ao conselho fiscal.

Também as competências de vigilância da comissão de auditoria são tão iguais às do conselho fiscal que bem podia o art. 423.°-F ter-se cingido a remeter para o art. 420.° (competência do fiscal único e do conselho fiscal).

Na verdade, compete à comissão de auditoria (art. 423.°-F):

“a) Fiscalizar a administração da sociedade” = igual à al. a) do n.° 1 do art. 420.°;

b) “Vigiar pela observância da lei e do contrato de sociedade” = igual à al. b) do n.° 1 do art. 420.°;

c) “Verificar a regularidade dos livros, registos contabilísticos e documentos que lhes servem de suporte” = igual à al. c) do n.° 1 do art. 420.°;

d) “Verificar, quando o julgue conveniente e pela forma que entenda adequada, a extensão da caixa e as existências de qualquer espécie dos bens ou valores pertencentes à sociedade ou por ela recebidos em garantia, depósito ou outro título” = igual à al. d) do n.° 1 do art. 420.°;

e) “Verificar a exactidão dos documentos de prestação de contas” = igual à al. e) do n.° 1 do art. 420.°;

f) “Verificar se as políticas contabilísticas e os critérios valorimétricos adoptados pela sociedade conduzem a uma correcta avaliação do património e dos resultados” = igual à al. f) do n.° 1 do art. 420.°;

g) “Elaborar anualmente relatório sobre a sua acção fiscalizadora e dar parecer sobre o relatório, contas e propostas apresentados pela administração” = igual à al. g) do n.° 1 do art. 420.°;

h) “Convocar a assembleia geral, quando o presidente da respectiva mesa o não faça, devendo fazê-lo” (cfr. art. 377.°, n.° 7, e art. 420.°-A, n.° 4) = igual à al. h) do n.° 1 do art. 420.°;

i) “Fiscalizar a eficácia do sistema de gestão de riscos, do sistema de controlo interno e do sistema de auditoria interna, se existentes” = igual à al. i) do n.° 1 do art. 420.°;

j) “Receber as comunicações de irregularidades apresentadas por accionistas, colaboradores da sociedade ou outros” = igual à al. j) do n.° 1 do art. 420.°;

l) “Fiscalizar o processo de preparação e de divulgação de informação financeira” = igual à al. a) do n.° 2 do art. 420.°;

m) “Propor à assembleia geral a nomeação do revisor oficial de contas” = igual à al. b) do n.° 2 do art. 420.°;

n) “Fiscalizar a revisão de contas aos documentos de prestação de contas da sociedade” = igual à al. c) do n.° 2 do art. 420.°;

o) “Fiscalizar a independência do revisor oficial de contas, designadamente no tocante à prestação de serviços adicionais” = igual à al. d) do n.° 2 do art. 420.°;

p) “Contratar a prestação de serviços de peritos que coadjuvem um ou vários dos seus membros no exercício das suas funções, devendo a contratação e a remuneração dos peritos ter em conta a importância dos assuntos a eles cometidos e a situação económica da sociedade” = igual à al. l) do n.° 1 do art. 420.°;

q) “Cumprir as demais atribuições constantes da lei ou do contrato de sociedade” = igual à al. m) do n.° 1 do art. 420.°.

Nas demais atribuições da comissão de auditoria constantes da lei, atente-se:

No poder de suspensão de administradores quando as suas condições de saúde os impossibilitem temporariamente de exercer funções ou outras circunstâncias pessoais obstem a que exerçam as suas funções por tempo presumivelmente superior a 60 dias e solicitem à comissão de auditoria a suspensão temporária ou esta entenda que o interesse da sociedade o exige (art. 400.°);

No dever de declarar o termo das funções de administrador caso ocorra, posteriormente à designação desse administrador, alguma incapacidade ou incompatibilidade que constituísse impedimento a essa designação e o administrador não deixe de exercer o cargo ou não remova a incompatibilidade superveniente no prazo de 30 dias (art. 401.°);

No dever de receber a renúncia do presidente do conselho de administração mediante carta a ela dirigida (art. 404.°), com produção de efeitos no final do mês seguinte àquele em que tiver sido comunicada, salvo se entretanto for designado ou eleito o substituto (art. 404.°).

II — A circunstância de os membros da comissão de auditoria serem membros do conselho de administração dispensou o legislador de uma óbvia enumeração de poderes análoga à do art. 421.° para o conselho fiscal, em que de resto os n.os 3 e 4 repetem o já vertido na al. l) do n.° 1 do art. 420.°.

No estatuto da comissão de auditoria salientam-se os deveres de (art. 423.°-G, n.° 1):

“a) Participar nas reuniões da comissão de auditoria, que devem ter, no mínimo, periodicidade bimestral”;

b) “Participar nas reuniões do conselho de administração e da assembleia geral”—naturaliter, porquanto os membros da comissão de auditoria são membros do conselho de administração (cfr. arts. 410.° e 379.°, n.° 4);

c) “Participar nas reuniões da comissão executiva onde se apreciem as contas do exercício”—norma de não fácil compreensão, na medida em que as contas anuais são indelegáveis (art. 407.°, n.os 2 e 4):

as contas do exercício são apreciadas, elaboradas e apresentadas pelo conselho de administração (arts. 65.° e 451.°), em que a comissão de auditoria participa (al. b)), cabendo-lhe dar o correspondente parecer (art. 423.°-F, al. g), e art. 452.°); as eventuais reuniões da comissão executiva em que se apreciem as contas do exercício não passarão, pois, de reuniões “informais”, não obrigatórias, juridicamente neutras;

d) “Guardar segredos dos factos e informações de que tiverem conhecimento em razão das suas funções, sem prejuízo do disposto no n.° 3 do presente artigo” — vale dizer, sem prejuízo do dever de o presidente da comissão de auditoria participar ao Ministério Público os factos delituosos de que tenha tomado conhecimento e que constituam crimes públicos, tal como acontece com o conselho fiscal e o revisor oficial de contas (art. 422.°, n.° 1, al. c), e n.° 3).

e) “Registar por escrito todas as verificações” (ou inspecções), “fiscalizações, denúncias recebidas e diligências que tenham sido efectuadas e o resultado das mesmas”, tal como sucede com o conselho fiscal (art. 422.°, n.° 1, al. f)).

Por outro lado, por reenvio do n.° 2 do art. 423.°-G para o art. 420.°-A, recai sobre o presidente da comissão de auditoria um dever de vigilância especial semelhante ao do revisor oficial de contas, competindo-lhe:

Comunicar, imediatamente, por carta registada ao presidente do conselho de administração os factos de que tenha conhecimento e que considere revelarem graves dificuldades na prossecução do objecto social, designadamente, reiteradas faltas de pagamento a fornecedores, protestos de títulos de crédito, emissão de cheques sem provisão, falta de pagamento de quotizações para a segurança social ou de impostos (art. 420.°-A, n.° 1);

Se o presidente do conselho de administração não responder nos 30 dias seguintes ou responder em termos julgados insatisfatórios pelo presidente da comissão de auditoria, este requererá àquele, nos 15 dias seguintes ao termo daquele prazo, que convoque o conselho de administração para reunir nos 15 dias seguintes com vista a apreciar os factos e a tomar as deliberações adequadas (art. 420.°-A, n.° 3);

Se a reunião do conselho não se realizar ou as medidas adoptadas não forem consideradas adequadas à salvaguarda dos interesses da sociedade, o presidente da comissão de auditoria, nos oito dias seguintes ao escoamento daquele prazo ou à data da reunião do conselho, requererá, por carta registada, que seja convocada a assembleia geral para apreciar e deliberar sobre os factos constantes das cartas troca-das e da acta da reunião do conselho de administração (art. 420.°-A, n.° 4);

Qualquer membro da comissão de auditoria que se aperceba dos factos reveladores de dificuldades na prossecução normal do objecto social deve comunicá-los imediatamente ao presidente (da comissão de auditoria), por carta registada (art. 420-A, n.° 7).

Tudo isto a evidenciar a comissão de auditoria como “primus inter pares”, composta por administradores qualificados e independentes com autoridade e recursos para proteger a sociedade e os accionistas através da monitorização cuidadosa do processo de reporting financeira, dos controlo internos e da gestão dos riscos, por forma a reduzir os riscos de fraudes financeiras e insolvências, cumprindo activamente os deveres de sentinela ou guarda avançada da legalidade e correcção da gestão, leia-se, de supervisor vigilante e eficiente(18), e não de supervisor sonolento e decorativo.

3.4. Responsabilidade dos membros da comissão de auditoria análoga à dos membros do conselho fiscal

I —
À análoga competência de vigilância sobre a gestão deve corresponder análoga responsabilidade civil — logo, os membros da comissão de auditoria, na veste de membros de órgão de fiscalização, respondem como os membros do conselho fiscal no sistema tradicional (art. 81.°).

Nada mais natural: aos membros da comissão de auditoria é vedado o exercício de funções executivas (art. 423.°-B, n.° 3) e confiada a função fiscalizadora da administração da sociedade (art. 423.°-F), na expectativa de que o autocontrolo — autocontrolo, por um lado, assente num melhor, mais transparente e mais tempestivo fluxo informativo entre administradores delegados ou comissão executiva e órgão de fiscalização gerados no interior do conselho de administração, e, por outro lado, exercido por administradores com (igual) legitimidade electiva directa e desejada independência (art. 423.°-B, n.os 4 e 5) — seja realizado de modo particularmente informado, consciencioso, isento e rigoroso, com virtualidades para pela sua localização interna ser mais eficaz na identificação de irregularidades do que a heterofiscalização tradicionalmente levada a cabo pelo conselho fiscal.

No fundo, vale aqui, mutatis mutandis, o já explanado para os administradores não executivos (supra n.° s2.2. e 2.3.), com uma pequena grande diferença: a amplitude da vigilância — vigilância especial, analítica, circunstanciada — da gestão pela comissão de auditoria (art. 423.°-F) é muito superior à da vigilância geral pelos administradores delegantes (art. 407.°, n.° 8).

II — Este papel acrescido de monitorização e controlo especial da gestão, em substituição do conselho fiscal, poderá em teoria traduzir-se em responsabilidade (art. 81.°, n.° 1) acrescida dos membros da comissão de auditoria, suposto activo cão de guarda da gestão e das auditorias (interna e externa), por incumprimento ou cumprimento imperfeito dos seus amplos e específicos deveres legais de vigilância (art. 423.°-F), nos termos aplicáveis dos arts. 72.° a 77.°, do art. 78.° e do art. 79.°.

Do mesmo passo,
Os membros da comissão de auditoria responderão solidariamente com os administradores delegados ou a comissão executiva por actos ou omissões destes no desempenho dos respectivos cargos quando o dano se não teria produzido se houvessem cumprido as suas obrigações específicas de fiscalização (art. 81.°, n.° 2), sendo, pois, uma responsabilidade por culpa própria in vigilando e não uma responsabilidade objectiva por facto alheio — aplicação da regra geral de que as omissões dão lugar à obrigação de indemnizar quando havia, por força da lei ou de negócio jurídico, o dever jurídico especial de praticar o acto omitido (art. 486.° do Código Civil) que muito provavelmente teria impedido a consumação do dano, sendo solidária a responsabilidade se forem várias as pessoas responsáveis também por omissões (art. 497.° do Código Civil), como poderá ser o caso dos auditores externos ou revisores oficiais de contas que tenham falhado culposamente na detecção da falsidade ou irregularidade das contas que certificaram.

Por isso mesmo, a prova de que o dano se teria igualmente produzido ainda que houvessem cumprido com lealdade e diligência profissional (art. 64.°, n.° 2) a obrigação de vigilância especial da actuação dos administradores executivos exclui a responsabilidade dos membros da comissão de auditoria por omissão ou inadequação da devida vigilância específica ou analítica, que assim não terá sido adequada concausa real do prejuízo resultante de actos ou omissões dos primeiros no desempenho e por causa das respectivas funções (cfr. supra, n.° 2.3., IV).

Naturalmente, se a mais dos membros da comissão de auditoria houver outros administradores não executivos (delegantes), a obrigação de vigilância que sobre estes impende é apenas a obrigação de vigilância geral (art. 407.°, n.° 8), inferior à daquele órgão de fiscalização.

Numa palavra, conquanto integrem o conselho de administração, a especificidade das funções exercidas pelos membros da comissão de auditoria justifica tratamento diferenciado dos (demais) administradores executivos em matérias várias, como a sua remuneração e destituição já analisadas, e também na da responsabilidade civil: não podendo exercer funções executivas na sociedade e não participando nas correspondentes deliberações colegiais de administradores delegados ou da comissão executiva, os administradores membros da comissão de auditoria não são responsáveis pelos danos resultantes dessas deliberações (art. 72.°, n.° 3), ficando de fora do perímetro de aplicação directa do art. 73.° e sujeitos ao regime da responsabilidade dos membros de órgãos de fiscalização (arts.81.° e 64.°, n.° 2): cada um (co)responde pelos danos resultantes da sua negligência, já não pelos danos exclusivamente causados por outrem (conselho de administração ou mesmo conselho de administração e revisor oficial de contas).

III — Por último, o presidente da comissão de auditoria que não comunique ao presidente do conselho de administração factos reveladores de graves dificuldades na prossecução do objecto da sociedade e de que haja tomado conhecimento (art. 420.°-A, n.os 1, 3 e 4) é solidariamente responsável com os membros do conselho de administração pelos prejuízos decorrentes para a sociedade (art. 420.°-A, n.° 5); o mesmo presidente da comissão de auditoria não incorrerá, todavia, em responsabilidade civil por esses mesmos factos se deles não tiver tomado conhecimento nem tivesse o dever de conhecer (art. 420.°-A, n.° 6, por remissão do art. 423.°-G, n.° 2).

Note-se ainda o dever de o presidente da comissão de auditoria participar ao Ministério Público os factos delituosos por si conhecidos e que constituam crimes públicos (art. 423.°-G, n.° 3), à semelhança do que incumbe ao fiscal único, ao revisor oficial de contas e aos membros do conselho fiscal (art. 422.°, n.° 3).

4. Governação societária sem administradores não executivos: o modelo dualista

No sistema dualista, de origem germânica, a estrutura da administração e fiscalização da sociedade assenta em “conselho de administração executivo”, “conselho geral e de supervisão” e “revisor oficial de contas” (art. 278.°, n.° 1, al. c)).

As expressões “conselho de administração executivo” e “conselho geral e de supervisão” consideram-se substitutas das anteriores expressões “direcção” e “conselho geral”, respectivamente (cfr. art. 40.° do Decreto-lei n.° 76.°-A/2006, de 29 Março).

4.1. Conselho de administração executivo: órgão de gestão (tendencialmente) exclusiva da sociedade, sem delegação de poderes

I —
O conselho de administração executivo é composto pelo número, par ou ímpar, de administradores fixado no contrato (art. 424.°, n.° 1), podendo a sociedade ter um único administrador quando o seu capital não exceda €200.000 (art. 424.°, n.° 1; art. 278.°, n.° 2).

Se não forem designados nos estatutos, os administradores são designados pelo conselho geral e de supervisão (art. 425.°, n.° 1, al. a)), ou pela assembleia geral se os estatutos o determinarem (art. 425.°, n.° 1, al. b)) — no que vem contida uma inovação, relativamente ao regime anterior, que permite reforçar os poderes dos sócios na eleição dos administradores: qualquer administrador pode a todo o tempo ser destituído com ou sem justa causa, no primeiro caso pelo conselho geral e de supervisão, no segundo caso pela assembleia geral mas com o conselho geral e de supervisão a poder propor a destituição e proceder à suspensão, até dois meses, de qualquer membro do conselho de administração executivo (art. 430.°, n.° 1, als. a) e b), e n.° 3); se a destituição for sem justa causa (cfr. art. 403.°, n.° 4), o administrador tem direito a indemnização pelos danos sofridos, pelo modo estipulado no contrato com ele celebrado ou nos termos gerais de direito, sem que a indemnização possa exceder o montante das remunerações que presumivelmente receberia até ao final do período para que foi eleito (art. 403.°, n.° 5, ex vi do art. 430.°, n.° 2).

Em caso de falta definitiva ou de impedimento temporário de administradores, compete ao conselho geral e de supervisão providenciar quanto à sua substituição, sem prejuízo da possibilidade de designação de administradores suplentes (art. 390.°, n.° 5) e da ratificação da decisão de substituição pela assembleia geral seguinte no caso de os administradores serem designados pela assembleia (art. 425.°, n.° 4).

Os administradores não têm que ser accionistas, mas não podem ser (art. 425.°, n.° 6): membros do conselho geral e de supervisão, salvo se este órgão nomear um dos seus membros para substituir, por período inferior a um ano, administrador temporariamente impedido, com suspensão de funções no órgão de controlo (al. a), e art. 437.°); membros dos órgãos de fiscalização de sociedades que estejam em relação de domínio ou de grupo com a sociedade considerada (al. b)); cônjuges, parentes e afins na linha recta e até ao 2.° grau, inclusive, na linha colateral, das pessoas referidas na alínea anterior (al. c)); pessoas que não sejam dotadas de capacidade jurídica plena (al. d)) — as designações feitas contra o disposto nas alíneas citadas são nulas e a superveniência de alguma das circunstâncias previstas nas als. b), c) e d) citadas determina a imediata cessação de funções (art. 425.°, n.° 7).

Se não for designado no acto de designação (pelo conselho geral e de supervisão ou pela assembleia geral — art. 425.°, n.° 1) dos membros do conselho de administração executivo, este conselho escolhe o seu presidente, podendo neste caso substituí-lo a todo o tempo (art. 427.°, n.° 1), em conformidade com o sistema tradicional (art. 395.°, n.° 2); presidente que tem voto de qualidade nas deliberações do conselho de administração executivo composto por um número par de administradores e, nos restantes casos, se o contrato de sociedade o estabelecer (art. 395.°, n.° 3, ex vi do art. 427.°, n.° 2).

A remuneração dos administradores será fixada pelo conselho geral e de supervisão ou sua comissão de remuneração (cfr. art. 444.°, n.° 1) ou, no caso em que o contrato de sociedade assim o determine, pela assembleia geral ou comissão por esta nomeada, tendo em conta as funções desempenhadas e a situação económica da sociedade (arts. 429.° e 399.°, n.° 1). A remuneração pode ser certa ou consistir parcialmente numa percentagem dos lucros de exercício, mas a percentagem máxima destinada aos administradores deve ser autorizada por cláusula do contrato de sociedade (art. 399.°, n.° 2, ex vi do art. 429.°) e não pode incidir sobre distribuições de reservas nem sobre qualquer parte do lucro do exercício indistribuível aos accionistas (art. 399.°, n.° 3, por remissão do art. 429.°).

II — Compete ao Conselho de Administração Executivo a gestão das actividades e a representação da sociedade perante terceiros.

Os poderes de gestão são “tendencialmente” exclusivos do conselho de administração executivo: “o conselho geral e de supervisão não tem poderes de gestão das actividades da sociedade” (art. 442.°, n.° 1, 1.ª parte).

“Mas a lei e o contrato de sociedade podem estabelecer que o conselho de administração executivo deve obter prévio consentimento do conselho geral e de supervisão para a prática de determinadas categorias de actos” (art. 442.°, n.° 1, 2.ª parte). É o que acontece, não raramente, com a aprovação do plano estratégico da sociedade e a realização de certas operações de valor económico ou estratégico significativo (verbi gratia, contratação de financiamento de valor significativo, aquisição/alienação de participações sociais significativas, pedido de admissão de valores mobiliários à negociação em mercado regulamentado, estabelecimento ou cessação de parcerias estratégicas, extensões ou reduções importantes da actividade social, projectos de cisão, fusão ou transformação, alterações ao contrato de sociedade da iniciativa do conselho de administração executivo, etc.).

Quando assim aconteça, a necessidade de parecer prévio favorável traduz uma corresponsabilidade activa e não despicienda do conselho geral e de supervisão no exercício e direcção estratégica da empresa, característica do sistema dualista, a impedir dizer-se o conselho de administração executivo investido da gestão “exclusiva” da sociedade. A tal ponto que, em caso de recusa do parecer favorável do conselho geral e de supervisão, se o conselho de administração executivo quiser superar o impasse e prosseguir com a operação terá de submeter a divergência verificada entre os dois órgãos à arbitragem da assembleia geral, a qual só poderá deliberar favoravelmente por maioria de dois terços dos votos emitidos, se o contrato de sociedade não exigir maioria mais elevada ou outros requisitos (art. 442.°, n.os 2 e 3).

Nos termos do art. 431.°, n.° 3, “aos poderes de gestão e de representação dos administradores é aplicável o disposto nos artigos 406.°, 408.° e 409.°, com as modificações determinadas pela competência atribuída na lei ao conselho geral e de supervisão”.

Significativamente, não se aplica o disposto no art. 407.°, razão por que não poderá o conselho de administração executivo delegar poderes de gestão corrente da sociedade num ou mais administradores ou numa comissão executiva.

No mais, ao conselho de administração executivo aplicam-se em geral as normas relativas ao conselho de administração do modelo tradicional (arts.410.° a 412.°), com as adaptações previstas no art. 433.°.

4.2. Conselho geral e de supervisão: órgão de fiscalização

I —
O conselho geral e de supervisão é composto pelo número, par ou ímpar, de membros fixado no contrato de sociedade, mas sempre superior ao número de administradores (art. 434.°, n.° 1); depois da revogação do n.° 2 do art. 434.° pelo art. 61.° do Decreto-lei n.° 76.°-A/2006, os membros do conselho geral e de supervisão não têm de ser accionistas.

Por outro lado, os membros do conselho geral e de supervisão são designados no contrato de sociedade ou eleitos pela assembleia geral ou constitutiva (art. 435.°, n.° 1), com aplicação do disposto no art. 391.°, n.os2 a 5, e no art. 392.°, por reenvio do art. 435.°, n.os2 e 3.

Na falta de autorização da assembleia geral, os membros do conselho geral e de supervisão não podem exercer por conta própria ou alheia actividade concorrente com a da sociedade nem exercer funções em sociedade concorrente ou ser designados por conta ou em representação desta (art. 434.°, n.° 5) — desta sorte, procura a lei concretizar o dever de lealdade (art. 64.°, n.° 2), prevenindo conflitos de interesses, especialmente no exercício do poder de nomear e destituir os administradores se tal competência não for atribuída nos estatutos à assembleia geral (art. 441.°, al. a)), e utilizações abusivas de informações sensíveis ou reservadas, com aplicação do disposto nos n.os 2, 5 e 6 do art. 254.° (cfr. art. 434.°, n.° 7).

A mais disto nota-se ainda, na composição do conselho geral e de supervisão, um grande paralelismo com a do conselho fiscal, no tocante à sua “profissionalização” e independência, quando o n.° 4 do art. 434.° manda aplicar os n.os 2, 4 a 6 do art. 414.° (pelo menos um membro independente com curso superior adequado ao exercício das suas funções e conhecimentos de auditoria ou contabilidade; maioria de membros independentes, se sociedade cotada em mercado regulamentado) e o art. 414.°-A (incompatibilidades).

Na falta definitiva de um membro do conselho geral e de supervisão, deve ser chamado um suplente; não havendo suplente, a substituição efectua-se por eleição da assembleia geral (art. 438.°).

O presidente do conselho geral e de supervisão pode ser eleito pelos seus pares ou pela assembleia geral (art. 395.°, ex vi do art. 436.°).

São remuneradas as funções de membro do conselho geral e de supervisão. Remuneração fixa, com proibição de stock options, favorecedora de isenção e imparcialidade, estabelecida pela assembleia geral ou por comissão nomeada por esta, tendo em conta as funções desempenhadas e a situação económica da sociedade (art. 440.°).

II — Nos termos do art. 441.°, compete ao conselho geral e de supervisão:

“a) Nomear e destituir os administradores, se tal competência não for atribuída nos estatutos à assembleia geral;

b) Designar o administrador que servirá de presidente do conselho de administração executivo e destituí-lo, se tal competência não for atribuída nos estatutos à assembleia geral, sem prejuízo do disposto no artigo 436.° (19);

c) Representar a sociedade nas relações com os administradores;

d) Fiscalizar as actividades do conselho de administração executivo;

e) Vigiar pela observância da lei e do contrato de sociedade;

f) Verificar, quando o julgue conveniente e pela forma que entenda adequada, a regularidade dos livros, registos contabilísticos e documentos que lhes servem de suporte, assim como a situação de quaisquer bens ou valores possuídos pela sociedade a qualquer título;

g) Verificar se as políticas contabilísticas e os critérios valorimétricos adoptados pela sociedade conduzem a uma correcta avaliação do património e dos resultados;

h) Dar parecer sobre o relatório de gestão e as contas do exercício;

i) Fiscalizar a eficácia do sistema de gestão de riscos, do sistema de controlo interno e do sistema de auditoria interna, se existentes;

j) Receber as comunicações de irregularidades apresentadas por accionistas, colaboradores da sociedade ou outros” — de modo que os “denunciadores” (whistleblowers) não tenham receio de represálias;

l) Fiscalizar o processo de preparação e de divulgação de informação financeira;

m) Propor à assembleia geral a nomeação do revisor oficial de contas;

n) Fiscalizar a revisão de contas aos documentos de prestação de contas da sociedade;

o) Fiscalizar a independência do revisor oficial de contas, designadamente no tocante à prestação de serviços adicionais;

p) Contratar a prestação de serviços de peritos que coadjuvem um ou vários dos seus membros no exercício das suas funções, devendo a contratação e a remuneração dos peritos ter em conta a importância dos assuntos a eles cometidos e a situação económica da sociedade;

q) Elaborar anualmente um relatório sobre a sua actividade e apresentá-lo à assembleia geral;

r) Conceder ou negar o consentimento à transmissão de acções, quando este for exigido pelo contrato;

s) Convocar a assembleia geral, quando entenda conveniente;

t) Exercer as demais funções que lhe sejam atribuídas por lei ou pelo contrato de sociedade”.

III — Quando convenientes para o exercício das suas competências, o conselho geral e de supervisão deve nomear, de entre os seus membros, uma ou mais comissões para o exercício de determinadas tarefas, designadamente para fiscalizar a actividade do conselho de administração executivo ou fixar a remuneração dos administradores (art. 444.°, n.° 1), podendo pensar-se noutras comissões especializadas ou de acompanhamento de certos negócios (art. 442.°, n.° 1) ou em matérias de governo societário e sustentabilidade. Este dever referido no art. 444.°, n.° 1, constitui no fundo um poder: poder que o conselho geral e de supervisão usará quando o entenda conveniente para efeitos de desempenho eficaz de alguma ou algumas das suas competências (poder-dever); poder que o conselho geral e de supervisão não utilizará quando entender não ser conveniente a criação de qualquer comissão, designadamente da comissão para fiscalização do conselho de administração executivo. Neste aspecto, portanto, alterou-se o regime legal anterior: no primeiro mês após a sua eleição, devia o conselho geral nomear uma comissão especialmente encarregada de exercer permanentemente as funções de fiscalização da direcção (ora conselho de administração executivo), conforme imposição do n.° 2 do art. 444.°, cujo n.° 1 reconhecia ao conselho geral o poder de nomear, de entre os seus membros, uma ou mais comissões para preparar as suas deliberações ou para fiscalizar a execução destas.

Porém, de acordo com o novo regime (art. 444.°, n.° 2; art. 278.°, n.° 4), nas sociedades emitentes de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado e nas sociedades que cumpram os critérios referidos na al. a) do art. 413.°, o conselho geral e de supervisão deve constituir uma comissão para as matérias financeiras, especificamente dedicada ao exercício das funções referidas nas als. f) a o) do art. 441.°, dada a vital importância da real situação e informação financeira das empresas para os accionistas, (outros) potenciais investidores e integridade dos mercados de capitais.

Por isso mesmo, para que possa ser efectiva e eficaz a monitorização da integridade da gestão e saúde financeiras da empresa, em simetria com os outros modelos de governação (art. 414.°, n.os 4 a 6; art. 423.°-B, n.os 4 e 5), deve a comissão financeira incluir pelo menos um membro com curso superior adequado ao exercício das suas funções e conhecimentos em auditoria ou contabilidade e que seja independente (art. 444.°, n.° 5); nas sociedades emitentes de acções admitidas à negociação em mercado regulamentado, os membros da comissão financeira devem ser na sua maioria independentes (art. 444.°, n.° 6). Com a literacia financeira de saber ler e entender as contas e com a independência exigidas aos seus membros procura a lei garantir a qualidade, a veracidade e a credibilidade do processo de reporte financeiro das empresas e reduzir os riscos de fraudes e insolvências.

IV — Tirando as primeiras três alíneas (als. a) a c) do art. 441.°), ressalta o paralelismo da competência do conselho geral e de supervisão com a competência da comissão de audi-toria (art. 423.°-F) no sistema anglo-saxónico (supra, n.° 3.3.) e com a competência do conselho fiscal no modelo tradicional (art. 420.°).

Nesta parte, portanto, o conselho geral e de supervisão revela o perfil de órgão de controlo da sociedade, nomeadamente fiscalizando: as actividades do conselho de administração executivo, a eficácia do sistema de gestão de riscos, do sistema de controlo interno e da auditoria interna, a preparação e divulgação da informação financeira, a revisão de contas, a independência do revisor oficial de contas nomeado pela assembleia geral sob sua proposta, a observância da lei e do contrato de sociedade.

Perfil de fiscalização que, todavia, não retrata de corpo inteiro o conselho geral e de supervisão.
Com efeito, a este órgão cabe ainda:

Nomear e destituir os administradores, se tal competência não for atribuída nos estatutos à assembleia geral (art. 425.°, n.° 1, als. a) e b));

Designar o administrador que servirá de presidente do conselho de administração executivo e destituí-lo, se tal competência não for atribuída nos estatutos à assembleia geral;

Representar a sociedade nas relações com os administradores.

Tudo isto a demonstrar um certo hibridismo do conselho geral e de supervisão, órgão predominantemente de fiscalização mas ainda órgão administrativo, com possível competência para nomear e destituir os administradores e dar o indispensável parecer prévio favorável para a prática de determinadas categorias de actos previstos no contrato (art. 442.°), designadamente e principalmente do plano estratégico da sociedade, poder marcante e revelador da índole bifronte deste órgão social.

Relativamente ao direito anterior, nota-se que a nomeação e destituição dos administradores deixaram de ser exclusivas do conselho geral e de supervisão, passando agora a poder ser da assembleia geral por determinação dos estatutos, numa concessão aos sócios-proprietários da empresa e investidores do capital de risco.

Nota-se ainda que o relatório de gestão e as contas do exercício deixaram de ser aprovadas pelo conselho geral e de supervisão, que doravante só dará parecer, regressando o poder de aprovação à assembleia geral (art. 376.°, n.° 1, al. a)).

4.3. Responsabilidade dos membros do conselho geral e de supervisão análoga à dos membros do conselho fiscal; a (in)influência das comissões

Se ao conselho geral e de supervisão são atribuídas funções de vigilância e controlo típicas da comissão de auditoria no modelo anglo-saxónico e do conselho fiscal no sistema tradicional, igual deve ser a responsabilidade dos seus membros.

Corresponde isto a dizer, em termos breves, que à responsabilidade dos membros do conselho geral e de supervisão se aplica o disposto no art. 81.°, valendo aqui, mutatis mutandis, o já desenvolvido a respeito da responsabilidade dos membros da comissão de auditoria (supra, n.° 3.4.).

Apenas uma pergunta a carecer de resposta: haverá interferência das comissões (art. 444.°) na responsabilidade dos membros do conselho geral e de supervisão?

Se se pudesse falar de delegação de poderes de fiscalização em sentido próprio, com a comissão criada a assumir a competência para deliberar sobre as matérias incluídas na delegação, a responsabilidade solidária (art. 73.°, n.° 1, ex vi do art. 81.°, n.° 1) seria dos membros da comissão nomeada, ficando os outros membros do conselho geral e de supervisão delegantes responsáveis apenas pela vigilância geral. Só que para esse efeito seria necessária a expressa previsão legal de delegação de poderes de vigilância, à semelhança do sucedido com a verdadeira delegação de poderes de gestão (art. 407.°, n.os 3 e 8).

Mas não constituindo a hipótese do art. 444.° uma verdadeira delegação legal de poderes de fiscalização, resta tratar a situação nele prevista nos mesmos termos dos n.os 1 e 2 do art. 407.° (supra, n.° 2.2.): o encargo especial da comissão criada não exclui a competência normal dos outros membros do conselho geral e de supervisão nem a responsabilidade dos mesmos, nos termos da lei.

Daí a importância do disposto no art. 432.°, relativo ao relacionamento do conselho de administração executivo com o conselho geral e de supervisão: além da fiscalização exercida pela comissão financeira (prevista no art. 444.°, n.° 2), que tem o direito de assistir às reuniões do conselho de administração executivo e o dever de assistir às reuniões em que sejam apreciadas as contas do exercício, o presidente do conselho geral e de supervisão tem o poder-dever de exigir daquele as informações convenientes ou solicitadas por outro membro do conselho a que preside e o direito de ele e um membro delegado designado por este órgão para o efeito assistirem às reuniões do conselho de administração executivo; dever de transmissão a todos os outros membros do conselho geral e de supervisão, em tempo útil, e o mais tardar na primeira reunião deste, de todas as informações recebidas do conselho de administração executivo, nos termos dos n.os 2 a 4 do art. 432.°, bem como de todas as informações obtidas em virtude da participação nas referidas reuniões previstas nos n.os 5 e 6 do mesmo art. 432.° (cfr. art. 432.°, n.° 7).

Por outro lado, relembre-se que o legislador não quis autorizar a delegação de poderes de gestão pelo conselho de administração executivo (art. 431.°, n.° 3, a contrario sensu). Logo, não podendo haver delegação de poderes de gestão com eficácia perante terceiros, se aquela ocorrer de facto poderá relevar apenas nas relações internas entre os administradores (art. 73.°, n.° 2). Pelo que, não tendo a lei querido, de modo tão claro, a delegação de poderes de gestão no modelo dualista — à semelhança do exemplo francês, e diferentemente do legislador italiano (art. 2409.° novies do Codice Civile) e do disposto na versão anterior do nosso art. 431.°, n.° 3 —, parece sistematicamente coerente interpretar no mesmo sentido o art. 444.° : o conselho geral e de supervisão tem o poder-dever de nomear uma ou mais comissões no seu seio para preparar ou acelerar as suas deliberações ou para fiscalizar a sua execução. Como resultado, nas relações externas (perante os lesados), assim como na comissão de auditoria (art. 423.°-B) e no conselho fiscal (art. 414.°) o membro com expertise financeira em auditoria ou contabilidade não exime esses órgãos da sua (deles, membros) responsabilidade, assim também no modelo dualista as comissões não exoneram das suas responsabilidades os outros membros do conselho geral e de supervisão pelos danos resultantes das suas deliberações.

Noutras palavras: nas relações externas, a designação de CFO ou CAO não impõe a este especialista obrigações e responsabilidade maiores do que as dos outros membros como garantes da qualidade e integridade do processo e reporte financeiro nem permite a estes escudarem-se na confiança por eles depositada na opinião avalizada daquele para não responderem solidariamente perante as vítimas (art. 73.°, n.° 1, ex vi do art. 81.°): em ordem à melhor tutela dos lesados (sociedade, accionistas ou credores), todos os fiscalizadores que tomaram deliberação lesiva têm os mesmos deveres e são igualmente responsáveis, restando-lhes a acção de regresso nas relações internas.

Desta sorte, em termos conclusivos, se nos estatutos se disser “o conselho geral e de supervisão delegará em comissão financeira, constituída pelo menos por três membros independentes com qualificação e experiência adequadas, as competências previstas na lei”, esse facto não constituirá delegação sensu proprio, com exoneração de responsabilidade dos restantes membros do conselho.

5. Deveres gerais de cuidado e de lealdade

Dispõe como segue o art. 64.°, n.° 2:
“Os titulares de órgãos sociais com funções de fiscalização devem observar deveres de cuidado, empregando para o efeito elevados padrões de diligência profissional e deveres de lealdade, no interesse da sociedade”.

Já antes seria assim, na ausência desta norma introduzida pelo Decreto-lei n.° 76-A/2006.
Na verdade, de acordo com o direito geral, cada um deve cumprir os seus deveres de boa fé (vide, por exemplo, art. 762.°, n.° 2, ou o art. 227.°, ambos do Código Civil), vale dizer, com a correcção, a honestidade, a lisura e a lealdade próprias de pessoas de bem, e com o cuidado ou a diligência do “bonus pater famílias” do sector, em face das circunstâncias de cada caso (art. 487.°, n.° 2, aplicável também à responsabilidade contratual ex vi do art. 799.°, n.° 2, ambos do Código Civil).

No fundo, a ideia corrente de que o que cada um deve fazer, deve ser bem feito, de modo sério, cuidado e leal, apanágio das pessoas de bem, de boa formação e de são procedimento. In casu, porque em causa órgãos sociais, esses padrões ético-deontológicos significam que os respectivos membros devem cumprir com cuidado e lealdade as funções que lhes estão confiadas, no interesse da sociedade, dos accionistas e de outros stakeholders. Deveres fiduciários, portanto, aqueles que incidem sobre os titulares de órgãos sociais, a cumprir de boa fé, de modo normal e são, com a diligência e a lealdade exigíveis de “um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso”, segundo o critério do profissional razoável (gestor, fiscal, médico, advogado, engenheiro, etc.) no condicionalismo do caso concreto.

É nesta envolvente, e como densificação da regra geral de que no cumprimento das obrigações inerentes ao exercício de uma actividade profissional o cuidado ou a diligência deve apreciar-se em relação à natureza da actividade exercida, que deve entender-se a bifurcação ou dicotomia (deveres de cuidado e deveres de lealdade) ora explicitada no art. 64.°, quer no n.° 1 para os administradores ou gerentes, quer no n.° 2 para os membros de órgãos de fiscalização: num como noutro dos casos, a aplicação da tese da culpa objectiva ou culpa em abstracto e da conduta deficiente e não deficiência da vontade(20). É este padrão objectivo, tipicizado, de gestor ou fiscal criterioso e ordenado que impede qualquer membro de órgãos sociais escudar-se na sua falta de qualificação e experiência pessoal para o desempenho das funções em que está investido, em ordem à protecção da legítima confiança da sociedade, dos accionistas e dos credores e à realização da justiça comutativa.

Padrão objectivo e abstracto este, o da determinação do cuidado, quer no tocante à diligência da vontade quer quanto aos conhecimentos e capacidade ou aptidão exigíveis de membros de órgãos de administração ou fiscalização, que a lei traduz de modo nada enxuto e lapidar, seja para os administradores:

— “deveres de cuidado, revelando a disponibilidade, a competência técnica e o conhecimento da actividade da sociedade adequados às suas funções e empregando nesse âmbito a diligência de um gestor criterioso e ordenado”. (art. 64.°, n.° 1, al. a));
— “deveres de lealdade, no interesse da sociedade, atendendo aos interesses de longo prazo dos sócios e ponderando os interesses dos outros sujeitos relevantes para a sustentabilidade da sociedade, tais como os seus trabalhadores, clientes e credores”. (art. 64.°, n.° 1, al. b)), seja para os titulares de órgãos sociais com funções de fiscalização:

“deveres de cuidado, empregando para o efeito elevados padrões de diligência profissional, e deveres de lealdade, no interesse da sociedade” (art. 64.°, n.° 2).

Independentemente do copioso verbalismo utilizado no n.° 1 e no n.° 2 do artigo transcrito, o verdadeiro e decisivo alcance interpretativo não pode deixar de ser substancialmente o mesmo nos dois tipos de profissionais em apreço:

Deveres fiduciários de cuidado e de lealdade próprios de gestor ou fiscal razoável posto nas mesmas funções e circunstâncias, tendo em conta os conhecimentos especiais e a competência técnica razoavelmente esperáveis de um profissional capaz, sensato, sagaz, avisado e zeloso em face do condicionalismo próprio do caso concreto; no fundo, o estalão objectivo e tipicizado do “bonus pater famílias” da profissão em apreço, com a diligência a dever apreciar-se em relação à natureza da actividade, traduzido pelo padrão, de origem teutónica, do gestor consciencioso ou criterioso e ordenado (§93, 1, da AkG; art. 64.°, n.° 1, al. a)) e pelos elevados padrões de diligência profissional exigíveis dos titulares de órgãos de fiscalização.

Descontada a diversidade linguística, num como noutro dos casos impõe a lei que o exercício dos poderes e o cumprimento dos deveres sejam feitos com o grau de cuidado ou diligência profissional próprio de uma pessoa razoável e prudente, na veste de administrador ou de supervisor: não se vê por que hão-de ter bitolas diferentes a “diligência de um gestor criterioso e ordenado” (art. 64.°, n.° 1, al. a)) e os “elevados padrões de diligência profissional” do titular de órgão social com funções de fiscalização (art. 64.°, n.° 2) para apurar se um e outro observaram os deveres de cuidado exigíveis no âmbito das respectivas competências e atribuições.

E quanto à lealdade devida, sabemos bem ser ela decorrente do princípio da boa fé e tutela da confiança: dever de nortear a gestão e a fiscalização pelo interesse da sociedade, servindo esta como fiduciário (Treühänder) e não servindo-se dela.

Deste modo, a consagração de “deveres de cuidado” e “deveres de lealdade” não é inovadora na substância da responsabilidade de administradores e membros de órgãos de fiscalização: traduz apenas a codificação ou “transplante legal”(21) de uma bifurcação de origem anglo-americana(22) já longínqua no campo dos deveres fiduciários e com sabor escolástico: se bem que os administradores não sejam mais vistos como trustee — este deve ser cuidadoso em preservar a trust property e evitar expô-la a riscos desnecessários, ao passo que os administradores têm de correr riscos e decidir se assumem um risco com vista a multiplicar o capital investido e de cuja gestão estão incumbidos —, certo é que ocupam uma posição fiduciária na sociedade a cujos órgãos pertencem e devem, como consequência, actuar de boa fé (com o cuidado e a lealdade devidos) no melhor interesse social e evitar colocar-se em situação de interesses pessoais conflituantes com os da sociedade (no-conflict rule) ou tirar benefícios injustificados (no-profit rule)(23).

6. Dever de cuidado e business judgment rule

I —
O dever de cuidado requer que administradores e supervisores cumpram as suas responsabilidades legais com a diligência profissional devida. Trata-se, pois, do “modo” como os membros da administração e da fiscalização devem desempenhar as suas funções por forma a ter-se por irreprovável ou incensurável a sua conduta nas circunstâncias concretas de cada caso. Em consequência o dever de cuidado só tem sentido como a “due diligence” no exercício de poderes e deveres legais, estatutários ou contratuais. Pelo que se os administradores ou supervisores (art. 81.°, n.° 1) violam disposições legais ou contratuais destinadas a proteger interesses da sociedade (art. 72.°, n.° 1), dos credores sociais (art. 78.°) ou dos sócios e terceiros (art. 79.°), teremos uma ilicitude: o comportamento, objectivamente visto no plano geral e abstracto da norma de protecção de interesses alheios (art. 483.°, n.° 1, do Código Civil), é antijurídico, denegador dos valores tutelados pelo Direito.

Mas essa conduta ilícita (violação ilegítima da norma de protecção) só será negligente, merecedora do juízo de censura e reprovação própria da culpa, se os seus autores (agentes ou omitentes) falharem na diligência profissional devida em face das concretas circunstâncias do caso, vale dizer, no cuidado exigível a administrador ou supervisor razoável e prudente. E assim a culpa ou negligência será a violação do dever de cuidado e diligência exigível, com diversas densificações possíveis (dolo, culpa grave ou culpa leve): a acção ou omissão ilícita (violadora de norma de protecção) foi intencional, com propósito contrário aos melhores interesses da sociedade? Ou foi descuidada, consciente ou inconscientemente, grosseira ou levemente, por inobservância das precauções que a elementar prudência aconselhava?

Vistas a ilicitude e a culpa como pressupostos autónomos e distintos da responsabilidade civil (art. 483.°, n.° 1, do Código Civil) e a violação do dever de cuidado exigível como elemento da culpa(24), porque a responsabilidade de membros da administração e de órgãos de fiscalização para com a sociedade reveste natureza contratual, percebe-se a presunção de culpa consagrada no art. 72.°, n.° 1, aplicável igualmente aos membros de órgãos de fiscalização (art. 81.°): é a regra de direito comum (art. 799.°, n.° 1, do Código Civil). Presunção de culpa inexistente, em conformidade com a regra geral da responsabilidade aquiliana (art. 487.°, n.° 1, do Código Civil), nas hipóteses de responsabilidade para com os credores sociais (art. 78.°) ou para com os sócios e terceiros (art. 79.°), igualmente aplicáveis à responsabilidade dos membros de órgãos de fiscalização (art. 81.°): nestas hipóteses de responsabilidade extracontratual(25), os lesados têm de alegar e provar a culpa de administradores e/ou supervisores (“inobservância culposa das disposições legais ou contratuais destinadas à protecção dos credores” — art. 78.°, n.° 1; respon-sabilidade, nos termos gerais, logo por culpa provada — art. 79.°, n.° 1)(26).

Na acção social de responsabilidade obrigacional proposta contra administradores e/ou supervisores, nos termos dos arts. 75.° e 76.° ou nos termos do art. 77.° (acção social uti singuli, intentada por um ou vários sócios como substitutos processuais), a sociedade (ou seu curador ad litem — art. 76.°) ou o substituto processual (art. 77.°) só tem de alegar e provar o incumprimento de dever legal ou contratual (preterição de deveres legais, estatutários ou contratuais destinados à protecção do interesse social, v.g. arts. 32.°-33.°-35.°, 65.° e segs., 259.°, 405.°), o dano no património social e o nexo de causalidade adequada entre aquele acto ilícito ou omissão ilícita e o dano sobrevindo.

Cabe aos administradores e/ou supervisores demandados ilidir a presunção legal da culpa (art. 72.°, n.° 1), mostrando que procederam com o cuidado e diligência devido: se provarem que não houve culpa da sua parte, visto o acto de gestão ter sido praticado com a diligência de um gestor criterioso e ordenado e a vigilância cumprida com a diligência profissional exigível (art. 64.°), a responsabilidade para com a sociedade não ocorrerá por falta de culpa, apesar da ilicitude cometida (preterição do dever legal ou contratual protector do interesse social).

II — Neste contexto de proporcionar um “porto seguro” a administradores — e a supervisores, ex vi do art. 81.° — foi introduzido pelo Decreto-lei n.° 76.°-A/2006 o actual n.° 2 do art. 72.°, que reza como segue:

“A responsabilidade é excluída se alguma das pessoas referidas no número anterior provar que actuou em termos informados, livre de qualquer interesse pessoal e segundo critérios de racionalidade empresarial”.

É a versão portuguesa da business judgment rule, iniciada há cerca de dois séculos pelos tribunais nos EUA e que continua viva e vigorosa como forma de administradores (“honestos”) gozarem do benefício de actuarem devidamente informados, de boa fé e não no seu interesse pessoal: ali vale mesmo, designadamente no Estado de Delaware tido como paradigmático na matéria, a presunção relativa de que uma decisão empresarial foi tomada em base informada, de boa fé e honestamente no melhor interesse da sociedade(27).

Diferentemente, o legislador português inverteu o “onus probandi”, fazendo recair sobre os gestores e supervisores a demonstração de que a decisão empresarial — decisão positiva (de facere) ou negativa (de non facere), mas sempre uma activa decisão empresarial, não se aplicando aos casos em que administrado-res/supervisores abdicam das suas funções nem a puras omissões ou inacções por esquecimento ou negligência — foi tomada:

— numa base adequadamente informada acerca do objecto, num eventual iter negociatório e no processo decisório razoável, fundamentado em estudos e pareceres, a evidenciar a importância da observação do cuidado exigível na leitura e ponderação de todo o material informativo relevante com vista a acto de gestão ou de fiscalização consciencioso e racional: a extensão da obrigação de estar razoavelmente informado e de exercer supervisão adequada depende naturalmente da natureza da decisão, seu objecto e complexidade;
— livre de qualquer interesse próprio, quer dizer, na ausência de conflito de interesses significativo, com gestores e supervisores pessoalmente desinteressados (independentes) no assunto da decisão;
— segundo critério de racionalidade empresarial: a decisão é racional, sensata, faz sentido, acreditando razoável e honestamente, de boa fé, ser no melhor interesse da sociedade.

Se um destes três requisitos não estiver preenchido, a business judgment rule não protegerá os administradores ou supervisores, sem que isso constitua prova automática da violação do dever de cuidado exigível e, por conseguinte, a não ilisão da presunção de culpa prevista no n.° 1 do mesmo art. 72.°.

Ao invés, se os três requisitos ficarem provados, a responsabilidade é excluída, sem mais: o tribunal não substitui o seu julgamento ou ponto de vista ao julgamento (decisão) de gestores ou supervisores, se cumpridos cumulativamente os três elementos referidos. Ou seja, o tribunal não escrutina ex post a oportunidade e o mérito de uma decisão empresarial racional (razoavelmente informada, tomada então na convicção séria, de boa fé, de ser no melhor interesse da sociedade), consciente de que não tem (mais e melhor) habilitações para esse juízo e de que mesmo as decisões empresariais honestas, informadas e racionais comportam riscos, podendo vir a revelar-se de efeitos negativos (error in judicando).

E assim, através do teste da business judgment rule, os tribunais respeitam decisões/deliberações empresariais tomadas com cuidado, de modo são e prudente — decisões não arbitrárias, não irracionais, portanto —, no exercício do poder discricionário que preside à administração das sociedades numa economia de mercado livre e competitivo. Com a vantagem de desta maneira, por um lado, atrair gestores conscientes de que o dever de cuidado a que se sujeitam não constitui um “absoluto”, absurdo por incumprível, porquanto não será mais elevado do que o esperável do típico administrador razoável, e, por outro lado, não corta as asas da criatividade e da liberdade de assunção responsável de riscos, indispensáveis ao progresso e à inovação no movimento acelerado da História, também da coeva globalização dos mercados extremamente competitivos.

O mesmo se diga, mutatis mutandis, para os membros de órgãos de fiscalização, na medida em que tomem decisões, por exemplo: seleccionar e propor à assembleia geral a nomeação do revisor oficial de contas; aprovar outros serviços adicionais (consultorias) a prestar pelo revisor oficial de contas; contratar a prestação de serviços de peritos; elaborar relatório sobre a sua própria acção fiscalizadora; fiscalizar o processo de preparação e divulgação da informação financeira ou a eficácia do sistema de gestão de riscos, do sistema de controlo interno e do sistema de auditoria interna, etc., e decidir como responder às deficiências encontradas. Logo, a business judgment rule só não se aplica nas áreas de responsabilidade dos órgãos de fiscalização em que os seus membros não exerçam “business judgment”, isto é, não actuem pela tomada de decisões, continuando, porém, o seu desempenho sujeito aos deveres fiduciários de cuidado e lealdade (art. 64.°, n.° 2), flexíveis, dinâmicos e evolutivos.

Tudo isto a desnudar que a “business judgment rule” tem o seu enfoque no processo decisório: o tribunal só cuida de apurar se a decisão questionada foi ao tempo uma decisão de boa fé, independente (desinteressada), informada, com racional propósito empresarial, na convicção séria e honesta de ser no melhor interesse da sociedade. Portanto, administradores e supervisores beneficiarão desta “business judgment rule” — standard de apreciação judicial das decisões empresariais postas em causa por violação do dever de cuidado e diligência exigível — se demonstrarem ter actuado com racionalidade empresarial, de modo informado, de boa fé e não no seu próprio interesse pessoal. Em resultado do que gestores e supervisores que tenham observado este “modus operandi” ou “modus deliberandi” (actuação independente ou desinteressada, apropriada informação no iter decisionis, de boa fé e na razoável convicção de ser no melhor interesse da sociedade) não responderão por violação do dever de cuidado, pois (como que) lhes é reconhecido o direito de errar na decisão em si mesma (‘error in iudicando’ honesto e meramente negligente — culpa leve).

A querer tudo isto significar, noutra formulação: mesmo que gestores ou supervisores não provem ter procedido sem culpa substantiva (art. 72.°, n.° 1), agindo com toda a diligência profissional exigível (art. 64.°), a sua responsabilidade é excluída se demonstrada a actuação informada, desinteressada e racional (reasonable decisionmaking process), mesmo que a decisão substantiva seja negligente.

Deste modo, a exclusão de responsabilidade está agora (pelo novo n.° 2 do art. 72.°) mais facilitada do que antes apenas pelo n.° 1 do mesmo preceito: no fundo, bem vistas as coisas, só haverá responsabilidade por decisões dificilmente explicáveis por fundamento diferente da má fé, decisões arbitrárias ou irracionais, portanto, normalmente tiradas em procedimento/processo doloso ou gravemente negligente. Por isso, impõe-se enfatizar aqui e agora, para esse efeito probatório, a importância de actas cuidadas, completas, minuciosas, que espelhem as presenças, os assuntos discutidos, aprovados e rejeitados, o tempo despendido nas reuniões para sopesar as vantagens e os inconvenientes dos temas tratados, bem como de informações e estudos produzidos por entidades conceituadas para suporte das decisões. No fundo, a exoneração de responsabilidade civil (por decisões empresariais racionais, honestas e informadas) assenta na presunção de que os seus autores não violam o exigível dever objectivo de cuidado e diligência profissional e reforça a auctoritas de decisões livres no exercício das suas funções e no cumprimento dos seus poderes e deveres, ao impedir que na valoração a posteriori de uma concreta decisão o juízo de oportunidade e mérito da administração ou fiscalização seja substituído por um juízo de oportunidade e mérito do tribunal.

Destarte, dever de cuidado e business judgment rule interrelacionam-se de modo tensional, complexo, intricado:

Se a business judgment rule não for de aplicar, por falta de um dos referidos requisitos do processo decisório, isso não equivalerá a culpa in re ipsa (leia-se, a automática violação do dever de cuidado), cabendo ao tribunal apurar se esta ocorreu ou não, se foi ou não tomada uma “reasonable decision” (art. 72.°, n.° 1) — pode escrever-se direito por linhas tortas, pode acertar-se na decisão por instinto, superior inteligência/competência ou sorte grande…;

Se a business judgment rule for de aplicar, por verificação cumulativa de todos os pré-requisitos que exige (art. 72.°, n.° 2), a lei exclui a responsabilidade (como que) presumindo a observância do exigível cuidado profissional (art. 64.°) no exercício do poder discricionário dos decisores (membros da administração ou da fiscalização), sem que o tribunal aprecie (ex post) a razoabilidade substantiva, leia-se, a oportunidade e o mérito da decisão em si mesma, (desde que) tomada de modo racional, informado, desinteressado, honesto.

Naturaliter, o tribunal já não pode coibir-se de apreciar a legalidade da decisão, seja a ilicitude ou antijuridicidade do acto praticado com preterição de dever legal, dever estatutário ou contratual específico (arts.72.°, 78.° e 79.°), seja a ilicitude na modalidade de abuso do poder discricionário de decidir (art. 334.° do Código Civil).

Parece assim, para concluir, que, não devendo aplicar-se na apreciação da antijuridicidade, a business judgment rule se relaciona em tensão com o dever de cuidado e diligência, e não com a ilicitude enquanto pressuposto da responsabilidade civil distinto e autónomo da culpa.

7. Dever de lealdade

Os deveres de lealdade devem ser observados pelos administradores no interesse da sociedade, atendendo aos interesses de longo prazo dos sócios e ponderando os interesses dos outros sujeitos relevantes para a sustentabilidade da sociedade, tais como os seus trabalhadores, clientes e credores (art. 64.°, n.° 1, al. b)). Com esta redacção, o legislador põe o acento tónico no interesse da sociedade — o interesse comum ou interesse colectivo dos sócios, na predominante concepção contratualista — mas não um acento exclusivo, porque e na medida em que manda também atender aos interesses individuais de longo prazo dos sócios e ainda ponderar os interesses dos demais stakeholders da sociedade, trabalhadores, clientes, credores e fornecedores.

No que vai contida uma hierarquização da importância descendente para o bom cumprimento dos deveres de lealdade pelos administradores: em primeiro lugar, como peso pesado e decisivo, o interesse social; em segundo lugar, os interesses individuais de longo prazo dos sócios também devem merecer “atenção”; por fim, e só por fim, os interesses dos demais stakeholders da empresa ainda devem ser “ponderados”(28).

Já nos termos do n.° 2 do mesmo art. 64.°, os titulares de órgãos sociais com funções de fiscalização devem observar deveres de lealdade, no interesse da sociedade. Não parece ser de sobrevalorizar a indicação apenas do interesse social e considerar totalmente irrelevantes os outros interesses, sob pena de possível incongruência sistémica: naturaliter, uma decisão da administração tida como leal, no juízo complexivo, global e englobante dos interesses vários referidos na al. b) do n.° 1 do art. 64.°, não poderá ser vista (valorada) como desleal pela fiscalização, porque e na medida em que atenda apenas e tão-só ao interesse da sociedade…

Consabidamente, do princípio da boa fé no cumprimento das obrigações e no exercício dos direitos correspondentes (cfr., verbi gratia, art. 762.°, n.° 2, do Código Civil) decorrem deveres de lealdade(29).

E a frequência destes nos contratos de sociedade para os membros dos órgãos sociais e para os sócios explica-se pela natureza fiduciária das relações estabelecidas, com a boa fé a jogar papel proeminente na análise dessa fiducia. Em razão do que, substancialmente, o dever de lealdade impõe que os titulares de órgãos sociais promovam e protejam o interesse da sociedade e se abstenham de condutas que lesem a sociedade. E porque por aqui passa muito a eticização ou moralização do direito societário, o dever de lealdade é de aplicação severa, rígida, não comprimível sequer pela aplicação da business judgment rule.

Assim, o dever de lealdade implica prevenção de conflitos de interesses, com os membros da administração e da fiscalização a não poderem: fazer negócios com a sociedade (art. 397.°, 423.°-H, 428.°, 445.°); exercer por conta própria ou alheia actividade concorrente com a da sociedade nem exercer funções em sociedade concorrente (art. 398.°, n.° 3; art. 434.°, n.° 5; art. 254.°); votar sobre assuntos em que tenham um interesse em conflito com o da sociedade (art. 410.°, n.° 6; art. 445.°, n.° 2); apropriar-se de oportunidades de negócio da sociedade; usar segredos de negócios, informações internas reservadas ou confidenciais e outros activos ou mesmo a posição societária para fins pessoais; fixar remunerações exorbitantes, etc.

Não olvidando que conflitos podem ocorrer entre interesses opostos ou paralelos de clientes colocados do mesmo lado ou em lados diferentes da transacção: ninguém pode servir (lealmente, leia-se) a dois senhores.

Naturalmente, ainda, haverá violação do dever de lealdade por parte de quem sabe que a sociedade tem sido defraudada e não denuncia esse facto(30).

8. Cláusulas de exclusão ou limitação de responsabilidade

Nos termos do art. 74.°, n.° 1, “é nula a cláusula, inserta ou não em contrato de sociedade, que exclua ou limite a responsabilidade de fundadores, gerentes ou administradores…”, aplicável também à responsabilidade dos membros de órgãos de fiscalização (art. 81.°, n.° 1).

Na sua letra, seriam nulas todas as cláusulas de exclusão ou limitação da responsabilidade, independente de dolo, culpa grave ou culpa leve.

Porém, a interpretação deste preceito não deve fugir à problemática interpretativa da norma de direito comum, o art. 809.° do Código Civil.

E, portanto, quem defenda a interpretação restritiva do art. 809.°, segundo a qual a proibição das cláusulas de irresponsabilidade não abrange a culpa leve(31), deve proceder do mesmo modo na interpretação do art. 74.°, n.° 1: é nula a cláusula de irresponsabilização por dolo ou culpa grave inserta no contrato social, no contrato de gestão ou no contrato de que resulte o crédito, tendo em conta a aplicação do preceito em análise na responsabilidade para com os credores sociais (art. 78.°, n.° 5) e na responsabilidade para com os sócios e terceiros (art. 79.°, n.° 2).

Em abono da validade de cláusula de exclusão ou limitação de responsabilidade por culpa leve depõe agora a business judgment rule (art. 72.°, n.° 2), com o alcance já analisado: reconhecimento do direito de decisores empresariais a erros “honestos”, (ainda que) cometidos por mera negligência ou culpa leve.

9. Caução (garantia) ou seguro de responsabilidade civil

Nos termos do art. 396.°, a responsabilidade de cada administrador deve ser caucionada por alguma das formas admitidas na lei, na importância fixada no contrato, não inferior a: 250.000 euros para as sociedades emitentes de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado nem para as sociedades que cumpram os critérios da al. a) do n.° 2 do art. 413.°; 50.000 euros para as restantes sociedades.

A caução de que aqui se fala é sinónima de garantia especial, em sintonia com o disposto no art. 623.°, n.° 1, do Código Civil: “Se alguém for obrigado ou autorizado por lei a prestar caução, sem se designar a espécie que ela deve revestir, pode a garantia ser prestada por meio de depósito de dinheiro, títulos de crédito, pedras ou metais preciosos, ou por penhor, hipoteca ou fiança bancária”.

A mesma sinonímia “caução = garantia” é utilizada no art. 624.°, n.° 1, do Código Civil: “Se alguém for obrigado ou autorizado por negócio jurídico a prestar caução, ou esta for imposta pelo tribunal, é permitido prestá-la por meio de qualquer garantia, real ou pessoal”.

Em coerência, é lícita a prestação de caução por outra espécie de fiança, desde que o fiador renuncie ao benefício da excussão (art. 623.°, n.° 2, do Código Civil): é o caso do seguro-caução ou seguro fideiussório, que estruturado embora na forma de seguro acaba por desempenhar a função de fiança.

Daí também o n.° 2 do art. 396.° : “a caução pode ser substituída por um contrato de seguro, a favor dos titulares de indemnização (leia-se, sociedade, credores, sócios e terceiros), cujos encargos (leia-se, prémios) não podem ser suportados pela sociedade, salvo na parte em que a indemnização exceda o mínimo fixado no número anterior.

Deste modo, o seguro de responsabilidade civil profissional de administradores — também dos administradores não executivos que integram a comissão de auditoria no modelo anglo-saxónico—, de membros do conselho fiscal (art. 418.°-A), de administradores que integrem o conselho de administração executivo (art. 433.°, n.° 2) e de membros do conselho geral e de supervisão (art. 445.°, n.° 3) no modelo dualista pode substituir a caução.

Noutros termos: a responsabilidade profissional de administradores ou membros de órgãos de fiscalização deve ser garantida (por meio de qualquer garantia, real ou pessoal) ou segurada. E a sociedade (só) pode pagar os encargos da garantia (comissões) ou do seguro de responsabilidade (prémios) na parte em que a indemnização exceda os 250.000 euros ou os 50.000 euros referidos no art. 396.°, conforme o caso: até estes valores os encargos são suportados pelo administrador ou supervisor.


Notas:

(1) Declaração de rectificação n.° 28-A/2006, de 26 de Maio. Os artigos referidos sem indicação são do Código das Sociedades Comerciais.

(2) Para uma análise do direito das sociedades à luz da nova reforma, vide ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Manual de direito das sociedades, II. Das sociedades em especial, Coimbra, 2006; PAULO OLAVO CUNHA, Direito das sociedades comerciais, Coimbra, 2006.

(3) Vide CMVM – Governo das Sociedades Anónimas: propostas de alteração ao Código das Sociedades Comerciais. Processo de consulta pública n.° 1/2006, §4 (ampliação dos modelos de governação opcionais) e n.° 8 (vantagens da permissão alternativa de um terceiro modelo).
Entre nós, sobre corporate governance em geral, vide Livro Branco sobre Corporate Governance em Portugal (Instituto Português de Corporate Governance, 2006); COUTINHO DE ABREU, Direito Comercial.
Governação das sociedades, Coimbra, 2005; PEDRO CAETANO NUNES, Corporate governance, 2006; JOÃO SOARES DA SILVA, Responsabilidade civil dos administradores de sociedades: os deveres gerais e os princípios da corporate governance, in “Revista da Ordem dos Advogados”, 1997, p. 605 e segs; Idem, O action plan da Comissão Europeia e o contexto da corporate governance no início do século XXI, in “Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários”, n.° 18 (2003), p. 72 e segs; PAULO CÂMARA, O governo das sociedades em Portugal: uma introdução, in “Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários”, n.° 12 (2001), p. 45 e segs; Idem, Códigos de governo das sociedades, in “Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários”, n.° 15 (2002), p. 67 e segs; MENEZES CORDEIRO, Manual de direito das sociedades, I. Das sociedades em geral, Coimbra, 2004, p. 691 e segs; amplius, cfr. KENNETH A. KIM/ JOHN R. NOFSINGER, Corporate governance, 2.ª ed., 2006; P. A. GOUREVITCH/ J. J. SHINN, Political power and corporate control. The new global politics of corporate governance, 2005; J. P. CHARKHAM/ H. PLOIX, Keeping better company corporate governance ten years ago, 2.ª ed., 2005; J. SOLOMON/A. SOLOMON, Corporate governance and accountability, 2004; EASTERBROOK/FISHEL, Economic structure of corporate law, 1991; PETER HOMMELHOFF/KRAUS P. HOPT/ALEX v. WEDER, Handbuch Corporate Governance, 2003. Por fim, tenham-se presentes “Os Princípios da OCDE sobre o Governo das Sociedades”, revistos em 2004; Principles of Corporate Governance, adoptados e promulgados pelo American Law Institute já em 1992; Deutsche Corporate Governance Kodex, 2003.

(4) Vejam-se: Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu “Modernizar o direito das sociedades e reforçar o governo das sociedades na União Europeia – uma estratégia para o futuro”, Com(2003)284 final, de 21/05/2003; Recomendação da Comissão, de 14 de Dezembro de 2004, relativa à instituição de um regime adequado de remuneração dos administradores de sociedades cotadas, in JOUE L385/55, de 29/12/2004; Recomendação da Comissão, de 15 de Fevereiro de 2005, relativa ao papel dos administradores não executivos ou membros do conselho de supervisão de sociedades cotadas e aos comités do conselho de administração ou de supervisão, in JOUE L52/51, de 25/02/2005; Regulamento da CMVM n.° 7/2001, alterado e republicado pelo Regulamento da CMVM n.° 11/2003, e posteriormente alterado pelos Regulamentos da CMVM n.os 10/2005 e 3/2006.

(5) Vide GUILHERMO GUERRA MARTIN, El gobierno de las sociedades cotizadas estadounidenses. Su influencia en el movimiento de reforma del derecho europeo, 2003.

(6) Cfr. PEDRO MAIA, Função e funcionamento do Conselho de Administração das sociedades anónimas, 2002, p. 253 e segs.; MELVIN EISENBERG, Perspectivas de convergência global dos sistemas de direcção e controlo das sociedades, in “Cadernos do Mercado dos Valores Mobiliários”, n.° 5 (1999), p. 108 e segs.; KLAUS J. HOPT, Gemeinsame Grundsätze der Corporate Governance in Europe?, in “Zeitschrift für Unternehmens – und Gesellschaftsrecht”, 2000, p. 779 e segs; ULRICH SEIBERT, Aktienrechtsreform im Permanent?, in “Die Akiengesellschaft” 2002, p. 417 e segs; R. L. GILSON, Globalizing corporate governance, convergence of form or function, in “American Journal of Comparative law”, vol. 49 (2001), p. 329 e segs; KRAMAN / DAVIES / HASSMANN / HERTIG / HOPT / /KANDA / ROCK, The anatomy of corporate law: a comparative and functional approach, 2004; FERRARINI / HOPT / WINTER / WYMEERSCH, Reforming company and takeover law in Europe, 2004.

(7) Sobre a repartição de poderes entre o conselho de administração e a assembleia geral e os actos de gestão como limites aos poderes desta, cfr. VASCO LOBO XAVIER, Anulação de deliberação social e deliberações conexas, Coimbra, 1976, p. 348 e segs., especialmente nota 101; JOÃO CALVÃO DA SILVA, Conflitos de interesses e abuso do direito nas sociedades, in “Estudos Jurídicos”, Coimbra, 2001, p. 107 e segs.; PEDRO MAIA, Função e funcionamento do Conselho de administração da sociedade anónima, Coimbra, 2002, p. 137 e segs.

(8) Cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3/5/1995, in BMJ n.° 447, p. 520.

(9) Vide JOÃO ESPÍRITO SANTO, Sociedades por quotas e anónimas, Vinculação: objecto social e representação plural, Coimbra, 2000, p. 421 e segs.; ALEXANDRE SOVERAL MARTINS, Capacidade e representação das sociedades comerciais, in “Problemas do Direito das Sociedades” (Instituto de Direito das Empresas e do Trabalho), Coimbra, 2002, p. 471 e segs., especialmente p. 486 e segs; AGOSTINHO CARDOSO GUEDES, A limitação dos poderes dos administradores das sociedades anónimas operada pelo objecto social no novo Código das Sociedades Comerciais.

(10) Cfr. PEDRO MAIA, Função e funcionamento do Conselho de administração, cit., p. 213 e segs.

(11) PEDRO MAIA fala de “delegação imprópria” de poderes (Função e funcionamento, cit., p. 248 a 250).

(12) Em geral, vide ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Da responsabilidade civil dos administradores das sociedades comerciais, Lisboa, 1996; RAÚL VENTURA e BRITO CORREIA, Responsabilidade civil dos administradores de sociedades anónimas e dos gerentes de sociedades por quotas, BMJ n.os 192, p. 5 e segs, 193, p. 5 e segs, e 194, p. 5 e segs; ELISABETE RAMOS, Responsabilidade civil dos administradores, Coimbra, 2002; CARNEIRO DA FRADA, Teoria da confiança e responsabilidade civil, Coimbra, 2004, p. 172 e segs. (nota 121), p. 255 (nota 231) e p. 278 e segs. (nota 260); COUTINHO DE ABREU e ELISABETE RAMOS, Responsabilidade civil de administradores e de sócios controladores, in IDET – Miscelâneas n.° 3, Coimbra, 2004, p. 11 e segs; RICARDO COSTA, Responsabilidade civil societária de administrador de facto, in “Temas Societários” – IDET, 2006, p. 27 e segs.
Para a responsabilidade do ROC, vide GABRIELA FIGUEIREDO DIAS, Controlo de contas e responsabilidade dos ROC, in “Temas societários” — IDET, 2006, p. 153 e segs; LUÍS MENEZES LEITÃO, A responsabilidade civil do auditor de uma sociedade cotada, in “Revista da Ordem dos Advogados”, Vol. III, Ano 65, 2005, p. 663 e segs; CARNEIRO DA FRADA, Responsabilidade civil da auditoria…; a Directiva 2006/43/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Maio de 2006, relativa à revisão legal das contas anuais e consolidadas, que altera as Directivas 78/660/CEE e 83/349/CEE do Conselho e revoga a Directiva 84/253/CEE do Conselho, in JOUE L157/87, de 9 de Junho de 2006.

(13) A vírgula não aparece no texto legal publicado no Diário da República nem na declaração de rectificação n.° 28-A/2006. Cremos, porém, justificar-se.

(14) O funcionamento da comissão executiva é colegial, com aplicação do n.° 3 do art. 395.°, ex vi do art. 407.°, n.° 7 (neste sentido, já antes, NOGUEIRA SERENS, Notas sobre a sociedade anónima, Separata da Revista de Direito e Economia, 1989, p. 66; LUÍS BRITO CORREIA, Os administradores de sociedades anónimas, Coimbra, 1993, p. 275; ILÍDIO DUARTE RODRIGUES, A administração das sociedades por quotas e anónimas, Lisboa, 1990, p. 90; PEDRO MAIA, Função e funcionamento, cit., nota 321). A deliberação do conselho que delega os seus poderes de gestão corrente da sociedade numa comissão executiva deve estabelecer a composição e o modo de funcionamento desta (art.407.°, n.° 4).

(15) Em geral, vide ALEXANDRE SOVERAL MARTINS, A responsabilidade dos membros do conselho de administração por actos ou omissões de administradores delegados ou dos membros da comissão executiva, in BFDUC, 2002 (LXXVIII), p. 365 e segs; E. GOMES RAMOS, Responsabilidade civil dos administradores, Coimbra, 2002, principalmente p. 114-115 e 254; CATARINA PIRES CORDEIRO, Algumas considerações críticas sobre a responsabilidade civil dos administradores perante os accionistas no ordenamento jurídico português, in “O Direito”, 137(2005), I, p. 81 e segs., especialmente o n.° 4.4 (págs. 122 e 123).

(16) JOUE L52/51, de 25/02/05.

(17) De novo aqui o paralelismo com o conselho fiscal (art. 419.°, n.° 1): o art. 423.°-E, n.° 2, manda aplicar à destituição (só) por justa causa dos membros da comissão de auditoria os n.os 2, 4 e 5 do art. 419.°, que trata da destituição dos membros do conselho fiscal.

(18) Vide SANDRA VERA-MUÑOZ, Corporate governance reforms: redefined expectations of audit committee responsabilities and effectiveness, in “Journal of Business Ethics” (2005), 62, p. 115-127; ADAM O. EMMERICH / GREGORY RACZ/JEFFREY UNGER, Audit committee membership: the interplay with general corporate law, in “International Journal of Disclosure and Governance” (2006), vol. 3, n.° 1, p. 16-26; B. BLACK / B. CHEFFINS/ / M. KLAUSNER, Liability risk for outside directors: a cross-border analysis, in “European Financial Management”, vol. 11, n.° 2 (2005), p. 153-171.

(19) Não entendemos a salvaguarda do disposto no art. 436.°, referente à designação do presidente do conselho geral e de supervisão. Será que onde se ressalva o disposto no art. 436.° se queria (quer) dizer o disposto no art. 427.°? Vejamos como harmonizar a al. b) do art.441.° com o disposto no art. 427.°: olhando ao art. 425.°, n.° 1, als. a) e b), os administradores são designados pelo conselho geral e de supervisão e só pela assembleia geral se os estatutos o determinarem, com o correspondente poder de destituição (art.430.°, n.° 1, als. a) e b)), pelo que aparece como prolongamento natural a competência do conselho geral e de supervisão também para a designação e destituição do presidente do conselho de administração executivo, se tal competência não for atribuída nos estatutos à assembleia geral (art. 441.°, al. b)) — logo, o presidente do conselho de administração executivo é escolhido por este órgão, entre os seus membros (art. 427.°, n.° 1), se o mesmo não tiver sido designado pela assembleia geral ou pelo conselho geral e de supervisão, conforme for o caso da respectiva competência.

(20) Cfr., por todos, ANTUNES VARELA, Das obrigações em geral, vol. I, 9.ª ed., 1996, p. 594 e segs.

(21) ALAN WATSON, Legal transplants. An aproach to comparative law, 2.ª ed., 1993.

(22) Sobre a americanização do direito, vide “Archives de Philosophie du Droit”, tome 45 (2001): L’américanisation du droit.

(23) R. MONKS e N. MINOW, Corporate governance, 2004, especialmente p. 200 e segs; JAMES COX e THOMAS HAZEN, On corporations, 2.ª ed., vol. I, 2003, cap. 10 (direc-tor’s and officer’s duties of care and loyalty), p. 476 e segs; GOWER e DAVIES Principles of modern company law, 7.ª ed., por Paul L. Davies, 2003, p. 370 e segs; ROBERT C. CLARK, Corporate law, 1986, p. 105 e segs; BS BUTCHER, Director’s duties: a new millennium, a new approach?, 2000; K. J. HOPT e H. WIEDEMAN (eds), Gro_kommentar Aktiengesetz, 4.ª ed., 1999, comentários ao §93, especialmente n.° 12, 72ss, 144ss segs.

(24) Neste sentido, ANTUNES VARELA, Das obrigações em geral, cit., p. 605 e segs.

(25) Cfr. ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Da responsabilidade civil dos administradores, cit., p. 496; RAÚL VENTURA / BRITO CORREIA, Responsabilidade civil dos administradores, in “BMJ” n.° 194, p. 86 e segs.

(26) Sobre a responsabilidade perante os sócios, vide PEDRO CAETANO NUNES, Responsabilidade civil dos administradores perante os accionistas, 2001; CATARINA PIRES CORDEIRO, Algumas considerações críticas sobre a responsabilidade civil dos administradores perante os accionistas no ordenamento jurídico português, in “O Direito” 137 (2005), p. 81 e segs.; E. GOMES RAMOS, A responsabilidade de membros da administração, in “Problemas do Direito das Sociedades – IDET”, 2002, p. 88; COUTINHO DE ABREU e ELISABETE GOMES RAMOS, ob. cit.

(27) Cfr. CLARK, Corporate law, cit., §3.4., p. 123 e segs, §3.5., p. 136 e segs; GOWER e DAVIES, “Principles of modern company law”, cit.; COX e HAZEN, On corporations, cit., §10.2., p. 482 e segs, §15.07, p. 924 e segs., §23.06, p. 1418 e segs.

(28) Vide ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Da responsabilidade civil dos administradores, cit., p. 498 e segs; COUTINHO DE ABREU, Curso de direito comercial, cit., p. 286 e segs.

(29) Cfr., por todos, MENEZES CORDEIRO, Da boa fé no direito civil, 1984, I, §23, p. 606 e segs.

(30) Cfr. KLAUS J. HOPT, Trusteeship and conflicts of interest in corporate, banking, and agency law: toward common legal principles for intermediaries in the modern service-oriented society, in “Reforming Company and Takeover law in Europe”, ed. por FERRARINI / HOPT/WINTER / WYMEERSCH, 2004, p. 51 e segs; WELLENHOFER-KLEIN, Treupflichten im Handels —, Gesellschafts — und Arbeitsrecht, in “RabelsZ”, 2000, p. 564; KLARK, Corporation law, cit., cap. 4, p. 141 e segs.; GOWER e DAVIES, Principles, cit., p. 391 e segs.

(31) Neste sentido, ANTÓNIO PINTO MONTEIRO, Cláusulas limitativas e de exclusão de responsabilidade civil, Coimbra, 1985, p. 159 e segs.; Idem, Cláusula penal e indemnização, Coimbra, 1990, p. 255 e segs.; JOÃO CALVÃO DA SILVA, Responsabilidade civil do produtor, Coimbra, 1990, p. 208, nota 3; Idem, Banca, Bolsa e Seguros. Direito Europeu e Português, Tomo I. Parte Geral, Coimbra, 2005, p. 162 e segs.


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