Parecer Nº 44/PP/2017-C
Processo de Parecer n.º 44/PP/2017-C
Constatou-se que, de acordo com informação constante do sítio na internet da Câmara Municipal de (...), a Sra. Dra. PR (...), advogada com cédula profissional nº (…), e escritório em (...) integra o Executivo Municipal 2017-2021, na qualidade de Vereadora em regime de permanência a meio termo, tendo sido eleita pelo Partido Socialista.
Notificada para se pronunciar por ofício expedido a 7 de Dezembro do pretérito ano de 2017, a Sra. Dra. PR (...) veio fazê-lo em requerimento entrado nos serviços administrativos deste órgão a 20 desse mesmo mês.
Aí refere ser advogada inscrita desde 1999 e ter escritório no dito município de (...); aduz, ainda, que foi eleita Vereadora em acto eleitoral ocorrido no ano civil de 2013 sendo que foi empossada em tais funções em Outubro de tal ano; tendo-se apresentado a novas eleições no ano civil de 2017 foi reeleita e, em outubro desse referido ano, tomou posse como Vereadora, confirmando que o faz a meio tempo, incumbindo-se de diversos Pelouros.
Sublinha, no entanto, que a redacção da al. a), do número 1 do artigo 82º do E.O.A foi introduzida pela Lei 145/2015 de 9 de Setembro, pelo que quando foi eleita a primeira vez – em 2013 – tal incompatibilidade pura e simplesmente não existia, dado que a norma decorrente da al. a) do n.º 1 do artigo 77º da Lei 15/2005 de 26 de Janeiro não abrangia tal cargo. Ou seja, aquando do acto em que foi eleita, tal incompatibilidade expressa entre o exercício da advocacia e a vereação não existia.
Ora, assim sendo, a confessada cumulação de exercícios que se verifica é legítima, atenta a disposição do artigo 86º do EOA vigente que esclarece que as incompatibilidades e impedimentos criados pela Lei 145/2015 não prejudicam os direitos legalmente adquiridos ao abrigo de legislação anterior.
Cumpre apreciar:
A questão aqui colocada foi examinada em parecer subscrito a 24 de Fevereiro de 2017.
Na altura, disse-se:
“(…) a visada Dra. PR (...) vem, a partir das eleições autárquicas de 2013, desempenhando o cargo de vereadora da Câmara Municipal de (...), a tempo parcial (circunstancialismo que é, também, expressamente admitido pela Sra. Advogada).
Em 2013, a norma constante da al. a), do n.º 1, do artigo 77º do EOA – sob a epígrafe “incompatibilidades” – estatuía:
1 - São, designadamente, incompatíveis com o exercício da advocacia os seguintes cargos, funções e actividades:
a) Titular ou membro de órgão de soberania, representantes da República para as Regiões Autónomas, membros do Governo Regional das Regiões Autónomas, presidentes de câmara municipal e, bem assim, respectivos adjuntos, assessores, secretários, funcionários, agentes ou outros contratados dos respectivos gabinetes ou serviços;
Ora, neste conspecto, é indubitável que, à data, o exercício da advocacia em concomitância com o desempenho do cargo de vereador não traduzia qualquer incompatibilidade (neste sentido militou o Ac. do Plenário do Conselho Superior da OA de 8/1/2008, tirado no proc. R 151/06, quando refere “A titularidade do cargo de vereador em regime de permanência, com pelouro mas sem competências delegadas, não é incompatível com o exercício da advocacia” citado em EOA Anotado, ANTÓNIO ARNAUT, Coimbra 2008, pág. 85.)
Distinto é, no entanto, o regime recortado pela Lei 145/2015 de 9 de Setembro.
Na verdade, o artigo que neste instrumento legal rege a matéria das incompatibilidades (82º) na respectiva al. a), do n.º 1, passou a mencionar:
1 - São, designadamente, incompatíveis com o exercício da advocacia os seguintes cargos, funções e atividades:
a) Titular ou membro de órgão de soberania, representantes da República para as regiões autónomas, membros do Governo Regional das regiões autónomas, presidentes, vice-presidentes ou substitutos legais dos presidentes e vereadores a tempo inteiro ou em regime de meio tempo das câmaras municipais e, bem assim, respetivos adjuntos, assessores, secretários, trabalhadores com vínculo de emprego público ou outros contratados dos respetivos gabinetes ou serviços, sem prejuízo do disposto na alínea a) do número seguinte;
Ou seja, assume meridiana clareza que, a partir do regime instituído pela Lei em exame a actividade de vereador em edilidade (a tempo inteiro ou meio tempo) é tida por incompatível com a função de advogado/a.
No entanto, como enfatiza a Senhora Advogada respondente, a Lei cria um mecanismo – temporário – de salvaguarda dos direitos adquiridos. Na verdade, o artigo 86º do EOA clarifica que “as incompatibilidades e impedimentos criados pelo presente Estatuto não prejudicam os direitos legalmente adquiridos ao abrigo de legislação anterior”.
Assim, é patente que o exercício da advocacia da Senhora Dra. PR (...), em simultâneo com a vereação da Câmara Municipal de (...), apesar de colidir com o disposto no artigo 82,1, al. a), do EOA vigente é perfeitamente lícito, dado que legitimado pelo artigo 86º do mesmo diploma.
No entanto, o sobredito texto debate-se com questão radicalmente distinta daquela agora examinada.
Na verdade, como a Exma. Sra. Dra. PR (...) refere na pronúncia que efectua o mandato para que foi eleita em 2013 extinguiu-se em 2017; na verdade, a Lei Orgânica 1/2001, de 14 de Agosto, no n.º 1 do seu artigo 220º, estatui que a duração dos mandatos é de 4 anos, pelo que em Outubro de 2017 ocorreu novo acto eleitoral. Como vem referido a Sra. Dra. PR (...) recandidatou-se e viu a respectiva legitimidade democrática refrescada, dado que mereceu a confiança da assembleia eleitoral.
Todavia, há que dizê-lo inexiste continuidade entre o mandato desempenhado entre 2013/2017 e este vigente atinente a 2017/2021; na verdade, apesar do cargo merecer a mesma designação as funções são rigorosamente novas de um ponto de vista eleitoral e democrático.
Ora, como escreveu a Exma. Sra. Dra. Maria Ana Alves Henriques, Vogal deste Conselho, em parecer subscrito a 25 de Maio de 2017, “considerando o disposto no art. 86º do EOA 2015 que regula a aplicação destas normas no tempo parece-nos claro que a avaliação de eventual incompatibilidade de um vereador (hoje expressamente prevista na referida alínea a) do nº 1 do art. 82º) só pode ser apreciada à luz da nova norma quando a tomada de posse para esse cargo seja posterior à sua entrada em vigor.” – destaque a negrito ausente do original, logo da responsabilidade do signatário.
Ou seja, para dizer de forma propositadamente enxuta:
A excepção contida no artigo 86º do EOA é aplicável sempre que a colisão com a normatividade expressa no artigo 82º do mesmo estatuto advenha de função exercida anteriormente à entrada em vigor dessa redacção; assim é apodíctico que funções assumidas após tal Lei vigorar não estão abrangidas pela protecção de direitos adquiridos.
Operando a transposição da hermenêutica proposta para o caso concreto, diremos, em síntese:
- Como consta do parecer de 24 de Fev. de 2017 o artigo 86º permitiu à Sra. Dra. PR (...) exercer concomitantes funções de advogada e vereadora, não obstante a al. a) do artigo 82º do EOA aprovado pela Lei 145/2015 de 15 de Setembro porque havia sido eleita em momento anterior a tal Lei.
No entanto, como se afigura de cristalina evidência, ocorrido que foi novo acto eleitoral culminado com a recondução no cargo da Exma. Sra. Dra. em virtude de um novo acto eleitoral deixou de ser aplicável o salvífico normativo exactamente porque deixou de “existir o direito adquirido ao abrigo de lei anterior”.
Nesta confluência, propugnando pela existência de incompatibilidade, propõe-se a respectiva notificação, nos termos do artigo 47º do Regulamento n.º 913-C/2015 de 23 de Dezembro, DR II Série, n.º 252, 1º Suplemento de 28/12/2015, para que, em dez dias, se pronuncie quanto à eventual suspensão da sua inscrição.
À sessão.
Coimbra, 24 de Janeiro de 2018
Jacob Simões
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