Pareceres do CRCoimbra

Parecer Nº 42/PP/2017-C

Processo de Parecer n.º 42/PP/2017-C

 

Mediante carta dirigida ao Senhor Presidente do Conselho Regional de Coimbra da Ordem dos Advogados veio o Exmº Sr. Dr. LD (...), advogado com escritório em (…), pedir a emissão de parecer sobre seis questões que formula, designadamente:

I.              Se são licitas as considerações tecidas por um outro Colega que actualmente patrocina o anterior constituinte do Sr. Advogado requerente, sobre o serviço por este prestado;

II.            Se é licito o pedido formulado pelo Colega que assumiu o mandato do anterior constituinte do Sr. Advogado requerente, de devolução, no todo ou em parte, das quantias por este recebidas a título de provisão;

III.           Se são licitas as considerações tecidas pelo Colega que assumiu o mandato do anterior constituinte sobre a “Nota de Despesas e Honorários” apresentada pelo Sr. Advogado requerente, pronunciando-se sobre o valor da mesma e sobre o mérito do serviço prestado;

IV.          Se são licitas as considerações efectuadas pelo Colega que assumiu o mandato do anterior constituinte do Sr. Advogado requerente relativas à legitimidade estatutária e à capacidade profissional do Sr Advogado estagiário do ora requerente;

V.           Se são licitas as considerações efectuadas pelo Colega que assumiu o mandato do anterior constituinte do Sr. Advogado requerente quanto a divisão de honorários entre este e o Sr. Advogado que com ele realizava o estágio de advocacia;

VI.          Se existe legitimidade para o Sr. Advogado requerente exigir ao Colega que assumiu o mandato do seu anterior constituinte, responsabilidade sobre o pagamento dos honorários devidos “por este ter aceite o patrocínio sem antes diligenciar no sentido de nos ser pago o valor devido, tendo ainda agido obstaculizando o pagamento do valor em débito da Nota de Despesas e Honorários apresentada ao Constituinte”;

 

A alínea f) do nº 1 do artº 55º do Estatuto da Ordem dos Advogados aprovado pela Lei 145/2015 de 9 de Setembro (doravante EOA) estabelece que compete ao Conselho Regional, no âmbito da sua competência territorial, pronunciar-se sobre as questões de carácter profissional.

Aquela disposição já constava, com idêntica redacção, da alínea f) do art. 50º do anterior Estatuto da Ordem dos Advogados pacificamente se vem entendendo que tais “questões de carácter profissional” são as intrinsecamente estatutárias, ou seja, são as que decorrem dos princípios, regras e praxes que comandam e orientam o exercício da Advocacia, nomeadamente as que relevam das normas do Estatuto da Ordem dos Advogados e do universo de normas emergentes do poder regulamentar próprio reconhecido por lei e pelos órgãos da Ordem dos Advogados e que a competência ali atribuída aos Conselhos Regionais não prejudica a competência especifica atribuída a outros órgãos da Ordem dos Advogados em determinadas matérias, com seja em matéria de laudos, formação e acção disciplinar.   

Assim, do elenco de questões suscitadas pelo Exmº Srª Advogado requerente a esmagadora maioria exorbitam claramente a competência deste Conselho Regional, porquanto, a apreciação e ou averiguação da licitude do comportamento e das considerações efectuadas pelo Sr. Advogado que veio a aceitar o mandato do anterior constituinte do Sr. Advogado requerente e que estão supra sintetizadas nos pontos I a V é, face ao artigo 58º do EOA, da competência exclusiva do Conselho de Deontologia.

Do ponto II acima sintetizado parece resultar que o Sr. Advogado requerente pretenderia que este Conselho Regional se pronunciasse sobre o valor dos honorários fixados. Se era essa a intenção do Sr. Advogado requerente, porém, também quanto a essa matéria este Conselho Regional não se pode pronunciar porquanto a competência para dar laudo sobre honorários é exclusiva das secções do Conselho Superior, nos termos da alínea e) do nº 3 do art. 44º do EOA.     

Relativamente à questão colocada e acima sintetizada no ponto VI, referente à eventual responsabilidade do Sr. Advogado que passou a assumir o mandato em substituição do Sr. Advogado requerente pelo pagamento da quantia em divida pelo constituinte, a mesma enquadra-se na aludida alínea f) do nº 1 do art. 54º do EOA pelo que, sobre àquela, se emitirá o solicitado parecer.

 

A apreciação daquela concreta questão é efectuada à luz do nº 2 do artigo 112º do EOA o qual impõe que “O advogado a quem se pretende cometer assunto anteriormente confiado a outro advogado não deve iniciar a sua atuação sem antes diligenciar no sentido de a este serem pagos os honorários e demais quantias que a este sejam devidas”, devendo ainda, dar “conta dos esforços que tenha desenvolvido para aquele efeito”.

Aquele nº 2 traduz um dever de cooperação alicerçado no princípio da solidariedade constante do art. 111º do EOA, porém, como dever de diligência que é não torna o novo advogado pessoalmente responsável pelas despesas e honorários do anterior advogado e não pode ainda, o novo advogado, ficar inibido de aceitar o mandato pelo facto de o constituinte se recusar a liquidar ao anterior advogado os honorários por ele apresentados se, por exemplo, não concorda com os mesmos por os achar excessivos.

Ora, esse é o caso em análise e, obviamente sem que este Conselho Regional efectue qualquer pronúncia sobre a justeza da nota de despesas e honorários, resulta da exposição dos factos elaborada pelo Sr. Advogado requerente e dos documentos com que instruiu a mesma que o seu anterior constituinte não a aceitou, por entender excessivos os honorários apresentados, pelo que não poderia o Sr. Advogado substituto diligenciar pelo pagamento daqueles honorários, sem prejuízo de, no âmbito do referido dever de solidariedade, procurar um conciliação entre o seu constituinte e o Sr. Advogado substituído.     

Refira-se ainda que no que tange ao caso em análise, independentemente da não-aceitação pelo constituinte dos honorários apresentados pelo Sr. Advogado requerente, aquele dever de diligência constante do nº 2 do citado art. 112º do EOA não se poderia aplicar, porquanto os poderes que haviam sido conferidos ao Sr. Advogado requerente são substabelecidos, sem reservas, no Sr. Advogado substituto em 16 de Agosto de 2017 e a Nota de Despesas e Honorários é enviada ao constituinte apenas em 26 de Setembro de 2017, ou seja, mais de um mês depois de terem sido substabelecidos aqueles poderes e consequentemente ter sido aceite o mandato, donde não pode deixar de se concluir que o Sr. Advogado requerente dispensou o Sr. Advogado substituo daquele dever de diligencia constante do nº 2 do citado art. 112º do EOA, porquanto o mesmo é, como decorre do texto daquele preceito, prévio à aceitação do mandato.

           

Conclusão:

 

I - O Advogado a quem foi cometido assunto anteriormente confiado a outro Advogado não é pessoalmente responsável pelas despesas e honorários que foram apresentados pelo primeiro ao constituinte e que este não pagou.

II – O dever de diligência prevista no nº 2 do art. 112º do EOA, designadamente de providenciar no sentido de que o constituinte proceda ao pagamento dos honorários e despesas do Advogado a quem está confiado o assunto que o novo Advogado pretende passar a assumir, é prévio à aceitação do mandato.   

 

É este, salvo melhor opinião, o meu parecer.

 

À sessão do Conselho Regional de Coimbra.

 

            Aveiro, 8 de Fevereiro de 2018

 

Manuel Leite da Silva

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