Parecer Nº 33/PP/2018-C
Processo de Parecer n.º 33/PP/2018-C
Por comunicação por correio electrónico enviada para o Conselho Regional de Coimbra da Ordem dos Advogados o Exmº Sr. Dr. GM..., advogado, com escritório em C…, veio requerer que este se pronuncie sobre questão que ali coloca, sobre eventual existência de impedimento para depor como testemunha, depreende-se que por decorrência de eventual risco de violação do sigilo profissional, onde expôs que o Sr. Advogado requerente tendo-se deslocado, no exercício da sua profissão, para vistoriar um muro numa tentativa de composição entre as partes, assistiu a injurias proferidas pela outra parte contra o seu cliente, na via publica, para além de “poses indicativas de que o iria agredir” e que estando a decorrer inquérito crime decorrente desses alegados factos – no qual não é mandatário como esclarece – questiona se pode validamente ali prestar o seu depoimento.
Atento o disposto na alínea f) do nº 1 do artº 54º do Estatuto da Ordem dos Advogados (doravante EOA) e competindo ao Conselho Regional, no âmbito da sua competência territorial, pronunciar-se sobre questões de carácter profissional cumpre emitir o solicitado parecer respondendo à questão colocada.
Analisando o pedido de parecer e a exposição do Exmº Sr. Advogado requerente desde já se afirma que não existe nenhuma situação de sigilo profissional que impeça o Sr. Advogado de prestar depoimento sobre a concreta factualidade das injúrias proferidas pela parte contrária contra o seu cliente e/ou sobre a eventual tentativa de agressão ou outros factos, de índole criminal, praticados naqueles circunstâncias de tempo e lugar.
O dever de sigilo ou de segredo profissional plasmado no artigo 92º do EOA impede o Advogado de relatar ou dar conhecimento, por qualquer forma, de todos os factos cujo conhecimento lhe advenha do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços (“o advogado é obrigado a guardar segredo profissional no que respeita a todos os factos cujo conhecimento lhe advenha das suas funções ou da prestação dos seus serviços” – nº 1 do art. 92 do EOA).
Um dos deveres do Advogado para com o cliente é o de guardar segredo profissional, que é também um dever reciproco entre Advogados quanto a factos de que a parte contrária ao cliente ou os seus representantes lhe tenham dado conhecimento durante negociações para acordo ou no âmbito de negociações malogradas.
O segredo profissional foi sempre considerado honra e “timbre da advocacia, condição sine qua non da sua dignidade“ (Parecer do Conselho Geral da OA de 24.01.1981, in ROA nº 41 pág 900), o qual visa proteger a confiança daquele que depositou no Advogado o segredo de determinado facto e que legitimamente espera que se mantenha sigiloso. Daqui resulta que aquela obrigação apenas existe quanto a factos que assim possam ser enquadrados, isto é, a factos sigilosos, pelo que tal dever não se verifica relativamente a todos os restantes factos que chegaram ao conhecimento do Advogado, ainda que no exercício ou pelo exercício das suas funções mas que não decorrem da referida relação de confiança entre o cliente e o advogado ou que não têm caracter sigiloso.
Os factos relatados pela Sr. Advogado requerente não advieram ao seu conhecimento ou não os presenciou por força do exercício das suas funções e ou pela prestação dos seus serviços e muito menos decorrem da aludida relação de confiança com o seu cliente, apenas tendo como ponto de contacto -- mas insusceptível de poderem configurar factos sujeitos a sigilo profissional – que a pretensa vítima é cliente do Sr. Advogado requerente e o autor do ilícito é a parte contrária e que os ilícitos foram praticados quando, na via pública, procuravam uma composição entre as partes, pelo que não são factos que possam estar sujeitos a sigilo.
Pese embora ser colateral à questão concreta colocada, deve referir-se que que haverá incompatibilidade entre a prestação de depoimento (enquanto testemunha) do Sr. Advogado requerente e o exercício posterior do mandato forense naqueles mesmos autos.
É este, salvo melhor opinião, o meu parecer.
Coimbra, 07 de Dezembro de 2018
Manuel Leite da Silva
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