Parecer nº 22/PP/2018-C e nº 25/PP/2018-C
Parecer nº 22/PP/2018-C e nº 25/PP/2018-C
Requerente: SM...
Objecto: Advogada Formadora
I -
Por e-mail que dirigiu ao Conselho Regional de Coimbra da Ordem dos Advogados, datado de 30 de Maio de 2018, a Exmª Srª Drª SM..., Advogada veio solicitou a emissão de parecer, sobre as seguintes questões:
1 - Sobre a viabilidade de uma Advogada ministrar curso presencial/online sobre os aspetos práticos da profissão como Advogada, nomeadamente sobre as seguintes matérias:
a) Inscrição na Ordem dos Advogados (diferentes meios de inscrição e regularizações no território português)
b) Estatuto da Ordem dos Advogados e demais Regulamentos (foco nas obrigações estatutárias e principalmente nas questões deontológicas, com ênfase nos pareceres da OA)
c) Inscrição no Sistema de Acesso ao Direito e aos Tribunais (legislação do AJ e questões práticas sobre a plataforma)
d) Questões de Fiscalidade (como trabalhador subordinado, trabalhador independente, como sócio de sociedade)
e) Organização do Sistema Judiciário Português (direito comparado)
f) Questões de dia a dia (sistemas informáticos, sites de pesquisa);
Mais refere que o referido curso não tem caracter profissionalizante, nem visa conceder qualquer qualificação aos formandos, mas apenas possibilitar que novos advogados inscritos na Ordem dos Advogados, ou advogados de outras nacionalidades, possam conhecer os aspetos principais relativos ao exercício profissional no território português.
2 – Sobre a forma de publicitação do mencionado curso, nomeadamente se a mesma pode ser efectuada através de redes sociais (com links patrocinados no Facebook) e através do convite para participar de uma aula com esclarecimentos sobre o curso, nos termos do artigo 94.º, n.º3 als f) e g) do Estatuto da Ordem dos Advogados.
Em 12 de Junho de 2018, por novo e-mail dirigido a este Conselho, veio a Requerente solicitar, também, novo pedido de parecer, desta feita sobre a viabilidade da Advogada ministrar curso presencial/online sobre os aspetos relativos ao direito do imigrante em Portugal, designadamente:
- Esclarecimentos sobre a Legislação de Entrada, Permanência, Saída e Afastamento de Estrangeiros do Território Nacional (Lei 23/2007)
- Questões relativas a regularizações em Portugal (arrendar, comprar casa, veículo, inscrição nas Finanças, Segurança, Social…)
- Direitos do imigrante (relativos a saúde, ensino, acesso à justiça, questões fiscais, etc.)
- Questões Relativas ao ensino em Portugal (procedimentos para inscrição, equivalência, reconhecimento de grau)
- Esclarecimentos sobre a Lei de Nacionalidade (Lei 37/81)
Mais refere que os cursos em causa são pagos e publicitados pelas redes socias (com links patrocinados no Facebook), ou através de convites para participar em sessão de esclarecimentos sobre o curso ( “ nos termos do artigo 94.º, n.º “f” e “g” do Estatuto da Ordem dos Advogados”).
Considerando que se encontram reunidos todos os pressupostos para emissão deste Parecer, e que as questões são, territorial e hierarquicamente, assuntos sobre os quais este Conselho Regional se deve pronunciar (art.º. 54º, nº1 al f) do Estatuto da Ordem dos Advogados), foi este processo entregue à aqui Relatora.
Posto isto e apreciando,
II –
A Requerente Exmª Srª Drª SM..., veio a solicitar a este Conselho Regional a emissão de dois pareceres, sobre a temática da possibilidade de esta ministrar formação sobre diversas matérias, tendo o primeiro desses pedidos originado o Processo nº 22/PP/2018-C e o segundo o Processo 25/PP/2018-C.
Os referidos processos destinam-se a ser apreciados por este Conselho Regional, sendo a Requerente a mesma e visam avaliar questões e temáticas de idêntica natureza, relacionadas com a possibilidade de a Ilustre Requerente ministrar cursos de formação em áreas de direito, nos termos que acima melhor se deixaram descritos.
Ora, face ao supra referido, afigura-se como relevante a apensação dos referidos processos, de forma a se proceder à emissão de Parecer in totum et un acto, assim se evitando a multiplicação de pareceres sobre a matéria em apreciação, avaliando-se todas os pedidos formulados de forma unitária.
Considerando o exposto, e atendendo que ambos os Pedidos em causa foram entregues à aqui Relatora, devem os mesmos serem apensados, pronunciando-se este Conselho sobre as matérias colocadas à apreciação no presente Parecer.
Posto isto e apreciando,
III –
Analisado o teor dos pedidos de parecer efectuados pela Exmª Srª Advogada, e considerando que a temática em causa poderá invadir matérias distintas sobre as quais importa reflectir para concluirmos pela possibilidade (ou impossibilidade) desta, como manifesta ser sua pretensão, ministrar e promover cursos de formação em diversas áreas, com destinatários distintos, adiantamos que iremos apreciar os pedidos efectuados, à luz dos seguintes temas:
a) Actos próprios de advogado;
b) Regime da Publicidade dos Advogados;
3.1. Actos próprios dos Advogados
Em ambos os pedidos de parecer solicitados, a Requerente pretende saber da “viabilidade da Advogada ministrar curso presencial / online…”, razão pela qual, e para que dúvidas se não coloquem, haverá que, em primeiro lugar verificar se cabe nos actos próprios dos advogados actos de formação.
Importará, por isso esclarecer, que se entende que a Requerente com o(s) seu(s) pedido(s) pretende ir além de uma mera participação ou promoção de conferência/ colóquio na área de direito, actividade essa que , por tratar de “matérias relacionadas com o Direito” nos parecem ser admissíveis . Em boa verdade, a Srª Advogada Requerente pretende exercer a actividade de Formadora (ou Professora), organizando também esses cursos e promovendo-os utilizando os seus conhecimentos técnicos e a sua qualidade de advogada.
Afigura-se, por isso, relevante, para análise da questão suscitada pela Requerente, analisar, em primeira linha, se constitui um acto próprio de advogado, formar, realizar acções de formação/informação, cursos, aulas relacionadas com as temáticas do direito e/ou da advocacia.
Ensina-nos Fernando Sousa Magalhães que “são actos próprios de profissão de advogado, de acordo com os artigos 67º e 68º do EOA e ainda por definição contida na Lei 49/2004 de 2 de Agosto, o mandato forense, a consulta jurídica, a elaboração de contratos e a prática dos actos preparatórios tendentes à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, a negociação tendente à cobrança de créditos e o exercício do mandato no âmbito da reclamação ou impugnação de actos administrativos ou tributários, desde que sejam exercidos no interesse de terceiros e no âmbito de actividade profissional, mas sem prejuízo das competências próprias atribuídas às demais profissões ou actividades cujo acesso ou exercício é regulado por lei.”[1]
As “funções” dos advogados encontram-se, pois, plasmadas, nomeadamente, na Constituição, no Estatuto e nos regulamentos da Ordem, e bem assim na lei dos actos próprios dos advogados.
A Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto, define, no seu artigo 1.º, sob a epígrafe “Actos próprios dos advogados e dos solicitadores”, que:
“ 1. Apenas os licenciados em Direito com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados e os solicitadores inscritos na Câmara dos Solicitadores podem praticar os actos próprios dos advogados e dos solicitadores.
2 - Podem ainda exercer consulta jurídica juristas de reconhecido mérito e os mestres e doutores em Direito cujo grau seja reconhecido em Portugal, inscritos para o efeito na Ordem dos Advogados nos termos de um processo especial a definir no Estatuto da Ordem dos Advogados.
3 - Exceptua-se do disposto no n.º 1 a elaboração de pareceres escritos por docentes das faculdades de Direito.
4 - No âmbito da competência que resulta do artigo 173.º-C do Estatuto da Ordem dos Advogados e do artigo 77.º do Estatuto da Câmara dos Solicitadores, podem ser praticados actos próprios dos advogados e dos solicitadores por quem não seja licenciado em Direito.
5 - Sem prejuízo do disposto nas leis de processo, são actos próprios dos advogados e dos solicitadores:
a) O exercício do mandato forense;
b) A consulta jurídica.
6 - São ainda actos próprios dos advogados e dos solicitadores os seguintes:
a) A elaboração de contratos e a prática dos actos preparatórios tendentes à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, designadamente os praticados junto de conservatórias e cartórios notariais;
b) A negociação tendente à cobrança de créditos;
c) O exercício do mandato no âmbito de reclamação ou impugnação de actos administrativos ou tributários.
7 - Consideram-se actos próprios dos advogados e dos solicitadores os actos que, nos termos dos números anteriores, forem exercidos no interesse de terceiros e no âmbito de actividade profissional, sem prejuízo das competências próprias atribuídas às demais profissões ou actividades cujo acesso ou exercício é regulado por lei.”
O Supremo Tribunal de Justiça, ensina-nos também que “ São actos próprios dos advogados todos aqueles que, exercidos no interesse de terceiros, são integradores da sua actividade profissional e que constituem o núcleo exclusivo dessa profissão, como sejam, por ex., a consulta jurídica, exercício do mandato forense e a elaboração de contratos e que, por isso, só eles podem praticar.”[2]
É também claro, e resulta do EOA, no seu art. 90º, que “O advogado está obrigado (…) a pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e instituições jurídicas.”, não nos parecendo, contudo, que daí se possa retirar a conclusão que foi pretensão do legislador incluir, nos deveres do advogado, a realização de acções de formação, muito menos as que têm escopo lucrativo, como no caso em apreço.
Perante o exposto, ainda que sucintamente, temos por certo que não integra o núcleo dos actos de advogado, a realização de acções de formação, ou outras com o intuito de ensinar, formar ou transmitir conhecimentos, não podendo, por isso, a profissão de advogado integrar actos da actividade de formador.
Em consequência, a Requerente não pode (querer) incluir na sua actividade de advogada a prática de actos típicos formação a terceiros (licenciados ou não em direito), pois que estes não constituem actos próprios de advogado.
Mas será que existe algum impedimento a que a Srª Requerente, enquanto Advogada, seja também Formadora, ou melhor, cumule a actividade de Advogada com a de Formadora?
Diremos sumariamente, ainda que sob reserva (pois que podem existir elementos que não possuímos que permitem concluir de forma diferente) , que da análise dos artigos que estabelecem o regime das incompatibilidades e impedimentos dos Advogados (art.º. 81º[3] , 82º[4] e 83º do Estatuto da Ordem dos Advogados, conjugado com as regras gerais de deontologia profissional elencadas nos art.º. 88º e 89º do EOA) , parece-nos que não existe norma que limite que a Srª Requerente cumule o exercício das duas actividades[5].
É importante referir que é comum que o Advogado, enquanto técnico do direito, esteja presente em acções de formação, em colóquios e conferências sob temas jurídicos, transmitindo conhecimentos, nomeadamente nas áreas de direito, não ficando prejudicada a sua isenção, independência ou dignidade. De igual forma, um Advogado, que cumula as suas funções com as de Formador não terá, em princípio, qualquer impedimento.
A própria Ordem dos Advogados, pode recrutar, nos termos do Regulamento de recrutamento, seleção e contratação de Formadores (Regulamento n.º 192/2018, publicado no Diário da República, 2.ª série, N.º 61, de 27 de março de 2018), Advogados para o exercício dessa actividade de formação, pois, nos termos do art. 3º “Os candidatos a Formadores deverão possuir reconhecido mérito profissional ou académico e experiência na área de formação a que se candidatam, bem como aptidão pedagógica e, sendo Advogados, deverão ter, também, pelo menos dez anos de inscrição na Ordem dos Advogados e não poderão ter sido punidos com sanção disciplinar superior a multa”.
Aqui chegados, e sem mais delongas, parece-nos resultar inequívoco que não constitui acto próprio de advogado nomeadamente nos termos do art. 1º da Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto, organizar/ ministrar quaisquer cursos de formação, sendo que não existe, e em princípio, incompatibilidade/impedimento em que a Requerente cumule o exercício da advocacia com a de formadora.
3.2. Da Publicidade
Resta-nos, por isso, apreciar se as iniciativas da Requerente, tem implicações no que respeita à publicidade dos Advogados ou, ainda, na violação de outros deveres estatutários.
O Código da Publicidade define a publicidade, no seu art. 2º, nº1 e 2, como “qualquer forma de comunicação feita por entidades de natureza pública ou privada, no âmbito de uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, com o objectivo directo ou indirecto de: a) Promover, com vista à sua comercialização ou alienação, quaisquer bens ou serviços; b) Promover ideias, princípios, iniciativas ou instituições.
2 - Considera-se, também, publicidade qualquer forma de comunicação da Administração Pública, não prevista no número anterior, que tenha por objectivo, directo ou indirecto, promover o fornecimento de bens ou serviços.” ([6]).
De notar que, no âmbito do referido Código, e considerando os princípios que regem a publicidade (previstos no art. 6º[7]) é proibida toda aquela que, por qualquer forma, não seja verdadeira, e que induza ou seja suscetível de induzir em erro os seus destinatários, independentemente de lhes causar qualquer prejuízo económico.
Por outro lado, e sobre a matéria, o Estatuto da Ordem dos Advogados, apresenta uma norma especifica, no seu art. 94º, que aqui parcialmente se transcreve:
1 - Os advogados e as sociedades de advogados podem divulgar a sua atividade profissional de forma objetiva, verdadeira e digna, no rigoroso respeito dos deveres deontológicos, do segredo profissional e das normas legais sobre publicidade e concorrência.
2 - Entende-se, nomeadamente, por informação objetiva:
a) A identificação pessoal, académica e curricular do advogado ou da sociedade de advogados;
b) O número de cédula profissional ou do registo da sociedade de advogados;
c) A morada do escritório principal e as moradas de escritórios noutras localidades;
d) A denominação, o logótipo ou outro sinal distintivo do escritório;
e) A indicação das áreas ou matérias jurídicas de exercício preferencial;
f) A referência à especialização, nos termos admitidos no n.º 3 do artigo 70.º;
g) Os cargos exercidos na Ordem dos Advogados;
h) Os colaboradores profissionais integrados efetivamente no escritório do advogado;
i) O telefone, o fax, o correio eletrónico e outros elementos de comunicações de que disponha;
j) O horário de atendimento ao público;
k) As línguas ou idiomas, falados ou escritos;
l) A indicação do respetivo sítio na Internet;
m) A colocação, no exterior do escritório, de uma placa ou tabuleta identificativa da sua existência.
3 - São, nomeadamente, atos lícitos de publicidade:
a) A menção à área preferencial de atividade;
b) A utilização de cartões onde se possa colocar informação objetiva;
c) A colocação em listas telefónicas, de fax ou análogas da condição de advogado;
d) A publicação de informações sobre alterações de morada, de telefone, de fax e de outros dados relativos ao escritório;
e) A menção da condição de advogado, acompanhada de breve nota curricular, em anuários profissionais, nacionais ou estrangeiros;
f) A promoção ou a intervenção em conferências ou colóquios;
g) A publicação de brochuras ou de escritos, circulares e artigos periódicos sobre temas jurídicos em imprensa especializada ou não, podendo assinar com a indicação da sua condição de advogado e da organização profissional que integre;
h) A menção a assuntos profissionais que integrem o currículo profissional do advogado e em que este tenha intervindo, não podendo ser feita referência ao nome do cliente, salvo, excecionalmente, quando autorizado por este, se tal divulgação for considerada essencial para o exercício da profissão em determinada situação, mediante prévia deliberação do conselho geral;
i) A referência, direta ou indireta, a qualquer cargo público ou privado ou relação de emprego que tenha exercido;
j) A menção à composição e estrutura do escritório;
k) A inclusão de fotografia, ilustrações e logótipos adotados.
Diga-se ainda que a norma em causa é o resultado de uma profunda alteração e evolução da temática da publicidade ao longo dos anos, com a adaptação da lei às diversas formas de exercício da advocacia, conjugada com as novas tecnologias e formas de comunicação. Através da Lei 15/2005 de 26 de Janeiro assistiu-se já à alteração do principio que até então vigorava de proibição de publicidade, passando a ser possível a divulgação de informação objectiva, nomeadamente a identificada no nº2 do então art. 89º do EOA (actual art. 94º nº2), sendo que “constituíram passos importantes desta evolução, determinantes do actual regime inserido no art. 94º o debate e as conclusões finais aprovadas sobre o ema no V Congresso da Ordem dos Advogados, a alteração ao C.D.A.E. na sua versão aprovada em 6/12/2002 e o parecer interpretativo, de pendor actualista, aprovado no Conselho Geral em 17 de Janeiro de 2003 – Parecer E 41-02 publicado no Boletim da Ordem dos Advogados nº24/25 de 2003, pág. 76.”[8]
Retomando pois à actual redacção do EOA, temos que, de acordo com o disposto no citado art. 94º do EOA, é claro que os advogados podem publicitar o exercício da sua actividade, com respeito, nomeadamente, dos deveres deontológicos e do segredo profissional e as normas legais sobre publicidade e concorrência.
Assim, e na análise do caso concreto, resulta do disposto no art. 94º nº3 al. f) do EOA que é acto lícito de publicidade “a promoção ou a intervenção em conferências ou colóquios”, pelo que, genericamente, o advogado pode participar na elaboração de programas e cronogramas em conferências sobre temas “jurídicos” para que tenha sido convidado. Ainda, nos termos da al. g), ao advogado é permitir “ A publicação de brochuras ou de escritos, circulares e artigos periódicos sobre temas jurídicos em imprensa especializada ou não, podendo assinar com a indicação da sua condição de advogado e da organização profissional que integre;”
Aqui chegados, e considerando que dúvidas não restam que a Requerente, como advogada, pode ainda exercer a actividade de formadora importa, por último, avaliar se esta, considerando a informação disponibilizada em ambos os pedidos, estará a promover, com os cursos em causa e de forma (i)lícita, a sua actividade como advogada!
Em primeiro lugar, parece-nos que a divulgação das acções de formação e bem assim as aulas de apresentação destas, efectuadas por via do facebook e com links patrocinados, não visa, em primeiro lugar a divulgação da profissão de advogada, mas sim do curso em causa. O facto de estar indicado que quem ministra o curso, aquando da sua divulgação, não colide, por si só, com a norma da al. f) do nº3 do art. 94º do EOA, pelo que não constitui, por regra, acto ilícito de publicidade.
Por outro lado, a realização de vídeos sobre temas (genéricos) de direito, colhe licitude na al. g) do nº3 do art. 94º do EOA, por defendemos que um advogado não está impedido de fazer uma abordagem de diversos problemas jurídicos, de caracter geral, analisando e /ou transmitindo informações sobre os diversos institutos jurídicos em causa. Logo, fazê-lo em sede de sala de formação ou em vídeo acessível aos formandos não nos parece de repudiar.
Apresentamos, contudo, algumas reservas quanto a esta questão, pois e em boa verdade, desconhecemos que tipo de plataforma se trata, quais as menções ai constantes e qual o conteúdo dos vídeos em causa, e que informação em concreto pode constar dessa plataforma, pelo que a Requerente, nessa matéria deve ter especial cuidado no que respeita ao seu conteúdo promocional.
Somos, por isso, de entender que, face às informações fornecidas pela Requerente dos pareceres, que não parece existir, genericamente, impedimento a que esta, ministre as formações em causa, nos termos e com os limites previstos nos Estatutos, sendo que, quanto à sua publicidade, a Requerente deve ter, obviamente, cautelas para que não se possa concluir que a divulgação daqueles tem um cunho propagandístico, com um destaque para a sua actividade profissional e não do curso.
Isto porque apesar de se defender que a divulgação, informação e publicidade da advocacia deve estar adequada às novas tecnologias, temos por certo que as (novas) formas de publicidade não podem colocar em crise nobreza e dignidade da essencialidade da função de advogado, nem permitir a violação de deveres estatutários, como seja a angariação ilícita de clientela.
IV-
Concluindo,
- Não constitui acto próprio de advogado nomeadamente nos termos do art. 1º da Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto, ministrar cursos de formação;
- Da análise dos artigos que estabelecem o regime das incompatibilidades e impedimentos dos Advogados (art.º. 81º, 82º e 83º e art.º. 88º e 89º do EOA), não existe norma que limite que a Srª Requerente cumule, nas condições por aquela enunciadas, o exercício da actividade de advogada com a actividade de formadora;
- Os projectos formativos descritos genericamente pela Requerente e analisados ao abrigo do art. 93º do EOA, nomeadamente do nº4, al. f) e g), não permitem concluir, por si só, que deles resulte promoção, de forma ilícita, da actividade como advogada. Importa salvaguardar que a forma, o conteúdo concreto da divulgação dos cursos em causa (que se desconhecem) e a promoção dos mesmos devem ser efectuados com cautela, pois não podem ser entendidos como instrumento, directo ou indirecto, de promoção publicitária profissional do Advogado nem como meio de angariação ilícita de clientela, uma vez que, em tais situações o advogado incorre em infração disciplinar.
É este o nosso parecer
Leiria, 25 de Janeiro de 2019
À sessão do Conselho Regional de Coimbra
[1] In Estatuto da Ordem dos Advogados – Anotado e comentado,2015 – 10ª Edição, comentário ao art. 66º do EOA
[2] In Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 19.04.2007, disponível em www.dgsi.pt
[3] O art.º. 81º do EOA, refere no seu nº1 e 2, que: 1 - O advogado exercita a defesa dos direitos e interesses que lhe sejam confiados sempre com plena autonomia técnica e de forma isenta, independente e responsável. 2 - O exercício da advocacia é inconciliável com qualquer cargo, função ou atividade que possa afetar a isenção, a independência e a dignidade da profissão.
[4] O art.º. 82º EOA efectua a indicação, meramente exemplificativa, de cargos, funções e actividades consideradas incompatíveis com o exercício da advocacia, indicando-nos o nº1 que, são “incompatíveis com o exercício da advocacia os seguintes cargos, funções e atividades:
a) Titular ou membro de órgão de soberania, representantes da República para as regiões autónomas, membros do Governo Regional das regiões autónomas, presidentes, vice-presidentes ou substitutos legais dos presidentes e vereadores a tempo inteiro ou em regime de meio tempo das câmaras municipais e, bem assim, respetivos adjuntos, assessores, secretários, trabalhadores com vínculo de emprego público ou outros contratados dos respetivos gabinetes ou serviços, sem prejuízo do disposto na alínea a) do número seguinte;
b) Membro do Tribunal Constitucional e respetivos trabalhadores com vínculo de emprego público ou contratados;
c) Membro do Tribunal de Contas e respetivos trabalhadores com vínculo de emprego público ou contratados;
d) Provedor de Justiça e trabalhadores com vínculo de emprego público ou contratados do respetivo serviço;
e) Magistrado, ainda que não integrado em órgão ou função jurisdicional;
f) Assessor, administrador, trabalhador com vínculo de emprego público ou contratado de qualquer tribunal;
g) Notário ou conservador de registos e trabalhadores com vínculo de emprego público ou contratados do respetivo serviço;
h) Gestor público;
i) Trabalhador com vínculo de emprego público ou contratado de quaisquer serviços ou entidades que possuam natureza pública ou prossigam finalidades de interesse público, de natureza central, regional ou local;
j) Membro de órgão de administração, executivo ou diretor com poderes de representação orgânica das entidades indicadas na alínea anterior;
k) Membro das Forças Armadas ou militarizadas;
l) Revisor oficial de contas ou técnico oficial de contas e trabalhadores com vínculo de emprego público ou contratados do respetivo serviço;
m) Administrador judicial ou liquidatário judicial ou pessoa que exerça idênticas funções;
n) Mediador mobiliário ou imobiliário, leiloeiro e trabalhadores com vínculo de emprego público ou contratados do respetivo serviço.
[5] Sem prejuízo das situações em que possa nascer vínculo de emprego público ou a quaisquer serviços ou entidades que possuam natureza pública ou prossigam finalidades de interesse público
([6]) Aprovado pelo Decreto-Lei nº 330/90, de 23 de Outubro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 74/93, de 10 de Março, pelo Decreto-Lei nº 6/95, de 17 de Janeiro, pela Lei nº 31-A/98, de 14 de Julho, pelo Decreto-Lei nº 275/98, de 9 de Setembro, pelo Decreto-Lei nº 51/2001, de 15 de Fevereiro, pelo Decreto-Lei nº 332/2001,de 24 de Dezembro, DL n.º 66/2015, de 29/04, Lei n.º 8/2011, de 11/04, DL n.º 57/2008, de 26/03 e Lei n.º 37/2007, de 14/08, DL n.º 224/2004, de 04/12, e pela Lei n.º 32/2003, de 22/08.
[7] Refere o artigo em causa que “A publicidade rege-se pelos princípios da licitude, identificabilidade, veracidade e respeito pelos direitos do consumidor.”
[8] Fernando Sousa Magalhães, Estatuto da Ordem dos Advogados Anotado e Comentado , 10ª Edição, 2015, pg 147
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