Parecer Nº 10/PP/2019-C
Processo de Parecer n.º 10/PP/2019-C
Requerente – Dra. FA...
Objecto: Possibilidade arrolar colega em acção enquanto testemunha e dispensa da obrigação de manter segredo
Por requerimento entrado neste Conselho, veio a requerente, Dra. FA... questionar o seguinte: tendo um negócio sido “mediado e auxiliado por um colega […] se arrolar o Colega (após falar com ele) como testemunha, estarei a violar alguma regra deontológica? E posso ser eu, com cópia do articulado e provas existentes, pedir o levantamento do seu sigilo profissional? ”
Considerando que se encontram reunidos todos os pressupostos para emissão deste Parecer, e que esta questão é, territorial e hierarquicamente, assunto sobre o qual este Conselho Regional se deve pronunciar, foi este processo entregue à aqui Relatora.
O Conselho Regional de Coimbra tem competência para a emissão do presente parecer, não apenas porque se trata de situação que ocorre em localidade pertencente à sua área de competência territorial, cfr. o art. 54º, nº1 do Estatuto da Ordem dos Advogados (doravante designado por EOA), mas ainda porque configura questão de carácter profissional submetida à sua apreciação, relativamente à qual, nos termos do disposto na al. f) desse normativo, tem competência para se pronunciar.
No que toca à primeira questão, sem mais considerandos é óbvio que pode arrolar o colega na qualidade de testemunha.
Já no que toca à segunda questão pretende a requerente saber se poderá a Sra. Advogada requerer a dispensa de sigilo de um outro colega.
Dispõe o artigo 92.º do EOA:
Segredo profissional
“1 — O advogado é obrigado a guardar segredo profissional no que respeita a todos os factos cujo conhecimento lhe advenha do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços, designadamente:
a) A factos referentes a assuntos profissionais conhecidos, exclusivamente, por revelação do cliente ou revelados por ordem deste;
b) A factos de que tenha tido conhecimento em virtude de cargo desempenhado na Ordem dos Advogados;
c) A factos referentes a assuntos profissionais comunicados por colega com o qual esteja associado ou ao qual preste colaboração;
d) A factos comunicados por coautor, corréu ou cointeressado do seu constituinte ou pelo respectivo representante;
e) A factos de que a parte contrária do cliente ou respectivos representantes lhe tenham dado conhecimento durante negociações para acordo que vise pôr termo ao diferendo ou litígio;
f) A factos de que tenha tido conhecimento no âmbito de quaisquer negociações malogradas, orais ou escritas, em que tenha intervindo.
2 — A obrigação do segredo profissional existe quer o serviço solicitado ou cometido ao advogado envolva ou não representação judicial ou extrajudicial, quer deva ou não ser remunerado, quer o advogado haja ou não chegado a aceitar e a desempenhar a representação ou serviço, o mesmo acontecendo para todos os advogados que, directa ou indirectamente, tenham qualquer intervenção no serviço.
3 — O segredo profissional abrange ainda documentos ou outras coisas que se relacionem, directa ou indirectamente, com os factos sujeitos a sigilo.
4 — O advogado pode revelar factos abrangidos pelo segredo profissional, desde que tal seja absolutamente necessário para a defesa da dignidade, direitos e interesses legítimos do próprio advogado ou do cliente ou seus representantes, mediante prévia autorização do presidente do conselho regional respectivo, com recurso para o bastonário, nos termos previstos no respectivo regulamento.
5 — Os actos praticados pelo advogado com violação de segredo profissional não podem fazer prova em juízo.
6 — Ainda que dispensado nos termos do disposto no n.º 4, o advogado pode manter o segredo profissional.
7 — O dever de guardar sigilo quanto aos factos descritos no n.º 1 é extensivo a todas as pessoas que colaborem com o advogado no exercício da sua actividade profissional, com a cominação prevista no n.º 5.
8 — O advogado deve exigir das pessoas referidas no número anterior, nos termos de declaração escrita lavrada para o efeito, o cumprimento do dever aí previsto em momento anterior ao início da colaboração, consistindo infracção disciplinar a violação daquele dever.”
Perante situações de sigilo profissional, o legislador, excepcionalmente, deixou a porta aberta à possibilidade de desvinculação,. 92º nº4 do EOA.
Quanto à legitimidade para deduzir tal pedido…
O Regulamento de Dispensa de Sigilo determina, art.2º n.º 1:
Do pedido de autorização
“1 - O pedido de autorização para a revelação de factos que o advogado tenha tido conhecimento e sujeitos a segredo profissional, nos termos do disposto nos n.ºs 1, 2, 3 e 7, do artigo 87.º do EOA, será efectuado mediante requerimento dirigido ao presidente do conselho distrital a cuja área geográfica pertença o domicílio profissional do advogado que pretenda a desvinculação e subscrito por este.”
De forma clara se conclui, bastando para tanto ler, que a Sra. Advogada requerente não pode requerer em nome de outro colega a dispensa de sigilo por parte daquele.
III - Conclusão:
1.- A Sra. Advogada requerente pode arrolar um colega como testemunha em acção futuramente a propor.
2.- Não pode a Sra. Advogada, aqui requerente, pedir dispensa da obrigação de manter segredo de um outro colega, uma vez que é parte ilegítima para o fazer – artigo 2º n.º 1 do Regulamento de Dispensa de Sigilo.
Este é o nosso Parecer.
Maria de Fátima Duro
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