Advogado informado vale por dois

Advogado Informado Vale por Dois (20-11-2020)
 

 

Decreto n.º 8/2020 - Diário da República n.º 217-A/2020, Série I de 2020-11-08

Regulamenta a aplicação do estado de emergência decretado pelo Presidente da República

 

Lei Orgânica n.º 2/2020 - Diário da República n.º 219/2020, Série I de 2020-11-10

Nona alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, que aprova a Lei da Nacionalidade

 

Resolução do Conselho de Ministros n.º 96-B/2020 - Diário da República n.º 221/2020, 2º Suplemento, Série I de 2020-11-12

Prorroga a declaração da situação de calamidade, no âmbito da pandemia da doença COVID-19


 

 

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 11-11-2020

I – O crime de pornografia de menores é um crime de perigo abstracto e de mera actividade.

II – O bem jurídico protegido pelo tipo de crime do artigo 176.º do CP é a liberdade, ao nível da sexualidade, de pessoas que, situadas abaixo de determinado patamar etário, ainda não são suficientemente maduras para se autodeterminarem ao referido nível, ou, por outras palavras, procura aquela norma acautelar a autodeterminação sexual, face a condutas de natureza sexual que, em consideração da pouca idade da vítima, podem, mesmo sem coacção, prejudicar gravemente o livre desenvolvimento da sua personalidade.

III – O crime de utilização de menor em fotografia, filme ou gravação [al. b) do n.º 1 do art. 176.º do CP] consuma-se com a feitura ou o início da elaboração do material.

IV – Quanto à previsão da al. c) do n.º 1 do art. 176.º do CP], a expressão “por qualquer meio” pretende obstar à divulgação dos materiais por quaisquer meios de comunicação, sejam publicações escritos, meios audiovisuais ou, pela internet, telemóvel ou outro aparelho electrónico disponível para visionar imagens ou o registo sonoro.

V – Vista a definição contida no n.º 8 do artigo 176.º do CP, relativamente a menores, o cariz pornográfico tem a ver com qualquer material que, com fins sexuais, descreva as crianças ou as represente visualmente envolvidas em comportamentos sexualmente explícitos, reais ou simulados, ou contenha qualquer representação dos seus órgãos sexuais ou de outra parte do corpo.

VI – Perante tal definição, a obtenção, pelo arguido, de uma fotografia revelando os seios de uma menor, que esta, via internet, lhe enviou, e a posterior partilha, pelo mesmo, com uma amiga da menor, desse registo de imagem, não consubstanciam o tipo objectivo de crime previsto no artigo 176.º, n.º 1, als. b) e c), do CP., porque as situações descritas traduzem apenas uma mera exposição corporal, de cariz não pornográfica.

 

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 11-11-2020

I – A natureza tendencialmente mais simplificada e menos formal do procedimento contraordenacional não pode constituir justificação para a não descrição de modo compreensível do elemento subjectivo da concreta contraordenação em causa, nomeadamente em termos de saber se estamos perante uma imputação a título de dolo ou, diversamente, a título de negligência.

II – Tal omissão, constituindo violação do disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 58.º do RGCOC, determina, por aplicação da al. a) do n.º 1 do art. 379.º do CPP, ex vi do art. 41.º do primeiro dos referidos diplomas, a nulidade da decisão administrativa.

III – Não estando descrito na decisão administrativa o elemento subjectivo, impõe-se, por falta de tipicidade, a absolvição do arguido.

 

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11-11-2020

I. A ARS não pode recorrer de uma decisão que ordenou a libertação imediata de quatro pessoas, por detenção ilegal, no âmbito de um processo de habeas corpus (artº 220 als. c) e d) do C.P.Penal), pedindo que seja validado o confinamento obrigatório dos requerentes, por serem portadores do vírus SARS-CoV-2 (A….) e por estarem em vigilância activa, por exposição de alto risco, decretada pelas autoridades de saúde (B…, C…. e D…..) por não ter legitimidade, nem interesse em agir.

II. O pedido formulado seria, igualmente, manifestamente improcedente porque:

A. A prescrição e o diagnóstico são actos médicos, da exclusiva responsabilidade de um médico, inscrito na Ordem dos Médicos (Regulamento n.º 698/2019, de 5.9).

Assim, a prescrição de métodos auxiliares de diagnóstico (como é o caso dos testes de detecção de infecção viral), bem como o diagnóstico quanto à existência de uma doença, relativamente a toda e qualquer pessoa, é matéria que não pode ser realizada por Lei, Resolução, Decreto, Regulamento ou qualquer outra via normativa, por se tratarem de actos que o nosso ordenamento jurídico reserva à competência exclusiva de um médico, sendo certo que este, no aconselhamento do seu doente, deverá sempre tentar obter o seu consentimento esclarecido (nº1 do artº 6º da Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos).

B. No caso que ora nos ocupa, não há qualquer indicação nem prova, de tal diagnóstico ter sido efectivamente realizado por profissional habilitado nos termos da Lei e que tivesse actuado de acordo com as boas práticas médicas. Efectivamente, o que decorre dos factos dados como assentes, é que nenhum dos requerentes foi sequer visto por um médico, o que se mostra francamente inexplicável, face à invocada gravidade da infecção.

C. O único elemento que consta nos factos provados, a este respeito, é a realização de testes RT-PCR, sendo que um deles apresentou um resultado positivo em relação a uma das requerentes.

D. Face à actual evidência científica, esse teste mostra-se, só por si, incapaz de determinar, sem margem de dúvida razoável, que tal positividade corresponde, de facto, à infecção de uma pessoa pelo vírus SARS-CoV-2, por várias razões, das quais destacamos duas (a que acresce a questão do gold standard que, pela sua especificidade, nem sequer abordaremos):

Por essa fiabilidade depender do número de ciclos que compõem o teste;

Por essa fiabilidade depender da quantidade de carga viral presente.

III. Qualquer diagnóstico ou qualquer acto de vigilância sanitária (como é o caso da determinação de existência de infecção viral e de alto risco de exposição, que se mostram abrangidas nestes conceitos) feitos sem observação médica prévia aos pacientes e sem intervenção de médico inscrito na OM (que procedesse à avaliação dos seus sinais e sintomas, bem como dos exames que entendesse adequados à sua condição), viola o Regulamento n.º 698/2019, de 5.9, assim como o disposto no artº 97 do Estatuto da Ordem dos Médicos, sendo passível de configurar o crime de usurpação de funções, p. e p. pelo artº 358 al.b), do C.Penal.

IV. Qualquer pessoa ou entidade que profira uma ordem, cujo conteúdo se reconduza à privação da liberdade física, ambulatória, de outrem (qualquer que seja a nomenclatura que esta ordem assuma: confinamento, isolamento, quarentena, resguardo profiláctico, vigilância sanitária etc), que se não enquadre nas previsões legais, designadamente no disposto no artº 27 da CRP, estará a proceder a uma detenção ilegal, porque ordenada por entidade incompetente e porque motivada por facto pelo qual a lei a não permite.

(Sumário elaborado pela relatora)



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