Notícias de imprensa

01-04-2006
Investigação de crimes económicos depende de celeridade no tratamento
 

Mouraz Lopes garante que colaboração de advogados não significa quebra de sigilo

 

Advogados não estão muito interessados em quebrar sigilo profissional para ajudar na investigação de crimes de branqueamento de capitais


 

 

Mouraz Lopes defende participação dos advogados na denúncia de crimes de branqueamento de capitais

 

O advogado deve ou não comunicar à entidade competente sempre que desconfie que um determinado negócio tem como objectivo o branqueamento de capitais ilícitos? Poderá quebrar o sigilo profissional se denunciar? Será acusado de cúmplice ou co-autor se não o fizer? Mouraz Lopes esteve quinta-feira à noite em Coimbra para falar a advogados sobre "Branqueamento de Capitais -Terceira Directiva" e, apesar de todos os argumentos, não conseguiu convencê-los que ajudar as autoridades policiais não é o mesmo que quebrar o segredo a que estão obrigados.

«Quando os negócios não são transparentes, os advogados têm a obrigação, o dever, de não pactuar com isso, e isso não pode ser comparado com a questão do sigilo profissional», afirmou o responsável máximo da Direcção Central de Investigação da Criminalidade Económica e Financeira da Polícia Judiciária (PJ) falando no auditório do Conselho Distrital de Coimbra da Ordem dos Advogados. E que, de acordo com a directiva europeia de Outubro de 2005 sobre a matéria, estes profissionais «ou informam as entidades competentes ou, se forem investigados, terão de ser acusados de cumplicidade ou co-autoria».

«Quando um banco não comunica é violentamente coimado, o mesmo acontece com os casinos ou as companhias de seguros. O que é que acontece quando um advogado não comunica? Nada», continuou Mouraz Lopes, explicando que «ninguém, com esta obrigatoriedade, quer atacar a questão jurídica dos advogados» e admitindo que a ligação destes profissionais a possíveis negócios de branqueamento de capitais «é muito residual, mas existe e nós não podemos fechar os olhos, nem fingir que não é uma realidade».

Aliás, o responsável pela investigação nesta área garante que os crimes económico-fmanceiros resultaram, só em 2004, em mais de 800 milhões de euros de prejuízos para o Estado português.

«Não podemos deixar sair pela janela uma quantia tão avultada de dinheiro», afirmou Mouraz Lopes, esclarecendo que, em Portugal, estes milhões «vão para os bolsos de duas ou três pessoas» que «alguns consideram uns "chicos espertos"» ou «até querem ser como eles» mas que «fazem com que o nosso país deixe de ter melhores condições. Sim, porque estes milhões deixam de ser investidos pelo Estado», lembrou.

O dirigente da PJ considera, por isso, que se anda «a discutir dogmaticamente» este crime no nosso país, defendendo a necessidade de «dotar de melhores tecnologias os meios e as entidades que fazem o tratamento da informação financeira e os que fazem a sua investigação».

«O tratamento da informação tem de ser em tempo real, porque se não isto será sempre um "faz de conta"», continuou, denunciando que «hoje há negócios efectuados em Portugal para cidades estrangeiras sem qualquer tipo de controlo», precisamente porque «só passados dois ou três dias da denúncia é que se trata a informação financeira» da entidade ou pessoa a investigar.

«Quer queiramos, quer não, o mundo é plano», adiantou o especialista, deixando no ar a ideia de que, se o nosso país não melhorar a sua capacidade de investigar este tipo de crimes pode «tornar-se numa ilha». «Não nos podemos esquecer que hoje já há países conotados negativamente por essa razão», advertiu, recordando que, hoje em dia, «é possível, através da Internet, fazer uma transferência bancária às dez da noite de um banco estrangeiro para um português sem ninguém dar conta de que se faz um crime» e que, portanto, «tem de passar a haver imediatamente capacidade de verificar isso».

Acérrimo defensor do sigilo profissional dos advogados, que considera «inalienável», Daniel Andrade, presidente do Conselho Distrito de Coimbra da Ordem dos Advogados, considera que «existem outras formas de resolver o problema do branqueamento de capitais». «Ele tem a vantagem de deixar rastos. Quem comete este crime é para adquirir património e esse é visível», recordou o advogado, não vendo, por isso, «necessidade de ser o levantamento do sigilo profissional a resolver os crimes de branqueamento de capitais».

«Quando alguém recorre a um advogado é na convicção de que ele é um túmulo», afiançou o dirigente, concordando que é «uma coisa completamente diferente» um advogado participar numa actividade criminal como o branqueamento de capitais. «Aí é um cidadão como os outros», admitiu.

 

Ana Margalho

Notícia publicada no dia 01/04/2006 no jornal "Diário de Coimbra"



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