Pareceres Conselho Regional de Faro

Parecer N.º 1/P/2006 (Conselho Distrital de Faro)

I

 

O Exmo. Sr. Dr. ..., Ilustre Advogado com domicílio profissional em ..., solicitou ao Conselho Distrital de Faro a prestação de esclarecimentos, através de parecer, sobre a sua substituição, efectuada pelo Ministério Público no decurso de um processo, como defensor oficioso nomeado a um arguido.

Informa aquele Distinto Causídico que havia sido nomeado, em ... de ... de 2004, defensor oficioso no Proc. nº ... do ... Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de ... (processo sumário), dado que nessa data se encontrava de escala naquele Tribunal; que, nesse processo, foi adiada a audiência de julgamento para o dia ... de ... de 2004, por não ter sido possível obter o certificado de registo criminal do arguido; que em ... de ... de 2004, estando presente aquele Ilustre Advogado mas faltando o Ministério Público, o processo sumário foi reenviado para a forma comum, nos termos do art. 390º do Código de Processo Penal.

Ainda segundo o Sr. Dr. ..., nunca mais veio a ser notificado de qualquer despacho proferido naquele processo, tendo vindo a saber pelo arguido, em ... de ... de 2005, que a audiência de julgamento havia sido aprazada para o dia ... desse mesmo mês; que verificou então que o Exmo. Sr. Procurador-Adjunto que havia estado presente na primeira diligência judicial solicitara ao Conselho Distrital de Faro da Ordem dos Advogados, em ... de ... de 2004, a indicação de um defensor oficioso ao arguido a fim de intervir naquele referido processo.

Acrescenta o Sr. Dr. ... não ter pedido escusa nem substituição naquele patrocínio, nem ter o arguido constituído mandatário ou requerido a substituição do defensor oficioso no processo em referência.

 

 

 

II

 

A situação descrita ocorreu na vigência do anterior regime de acesso ao Direito e aos Tribunais, então regulado pela Lei nº 30-E/2000 de 20 de Dezembro.

De acordo com o nº 1 do art. 42º dessa Lei, a nomeação e substituição do defensor oficioso do arguido eram feitas nos termos do Código do Processo Penal e em conformidade com os arts. 42º a 47º daquela mesma Lei.

Devendo o arguido ser assistido por defensor e não o tendo constituído, competia ao juiz nomear-lhe advogado ou advogado estagiário, que cessariam funções logo que o arguido constituísse advogado (art. 62º, nº 2 do C.P.P.), podendo a nomeação de defensor ser também efectuada, em determinadas situações, pelo Ministério Público e pela autoridade de polícia criminal (nº 3 do mesmo preceito).

Ainda à luz do C.P.P., o defensor nomeado podia pedir dispensa do patrocínio alegando justa causa, a apreciar pelo tribunal, podendo também o tribunal substituir o defensor oficioso, a requerimento do arguido, igualmente com invocação de justa causa. Porém, se não ocorressem dispensa nem substituição do defensor nomeado, este mantinha-se nessas funções para todos os actos do processo – art. 66º do C.P.P.

Por fim, o nº 3 do art. 64º do C.P.P. estabelece que se o arguido não tiver advogado constituído nem defensor nomeado, “...é obrigatória a nomeação de defensor no despacho de encerramento do inquérito, quando contra ele for deduzida acusação.”.

 

 

 

III

 

Por sua vez, a Lei nº 30-E/2000 de 20 de Dezembro estipulava que a autoridade judiciária a quem competia a nomeação de defensor oficioso solicitava ao Conselho Distrital da Ordem dos Advogados territorialmente competente a indicação de advogado ou advogado estagiário para tal nomeação (art. 43º, nº 1, da mencionada Lei) e cometia à Ordem dos Advogados a competência para organizar escalas de presenças de advogados e advogados estagiários nos tribunais, para efeitos de nomeação de defensor no primeiro interrogatório de arguido detido, para audiência em processo sumário ou para outras diligências urgentes (art. 44º da citada Lei).

De forma expressa, e quanto às nomeações para esses actos urgentes, dispunha o nº 4 do art. 44º do diploma legal em referência que “o defensor nomeado para um acto mantém-se para os actos subsequentes do processo, salvo se este prosseguir em comarca diversa, caso em que o defensor nomeado pode requerer a sua substituição, nos termos do art. 36º.” (com sublinhado e grifado nossos).

De igual modo o novo regime de acesso ao Direito e aos Tribunais, em vigor desde 1 de Setembro de 2004 (Lei nº 34/2004 de 29 de Julho), manteve tal disposição – cf. art. 41º.

 

 

 

IV

 

No caso que nos ocupa, o Sr. Dr. ..., em situação de escala de presença no Tribunal Judicial de ..., foi nomeado defensor a arguido para audiência em processo sumário; adiada essa diligência, aquele Ilustre Advogado compareceu, como lhe competia, na posterior data designada para o efeito; reenviado o processo para a forma comum – e não tendo o referido Causídico solicitado a dispensa de patrocínio nem o arguido solicitado a substituição do defensor ou constituído advogado –, não existe qualquer dúvida que, nos termos do Código de Processo Penal e da Lei nº 30-E/2000 de 20 de Dezembro, a nomeação do Sr. Dr. ... deveria manter-se para todos os subsequentes actos do processo.

É crível que, quiçá por lapso, o Digno Magistrado do Ministério Público, ao pretender encerrar o inquérito e deduzir a acusação contra o arguido, não se tenha apercebido da existência de defensor já nomeado. E, daí, a solicitação feita ao Conselho Distrital de Faro da Ordem dos Advogados para a indicação de defensor, nos termos e para os efeitos do disposto no nº 3 do art. 64º do C.P.P.. Indicação que este órgão da Ordem dos Advogados efectuou por lhe falecer o conhecimento da anterior nomeação do Sr. Dr. ....

 

 

 

V

 

Pede o Sr. Dr. ... que o Conselho Distrital de Faro da Ordem dos Advogados esclareça os digníssimos Magistrados do Ministério Público da Comarca de ... sobre os procedimentos a adoptar quanto à matéria em apreço neste parecer.

Entendemos não o dever fazer, por uma questão de respeito e de cortesia. Respeito por quem tem também o dever de conhecer (e conhece, seguramente) a lei; cortesia, porquanto não se poderá generalizar o que queremos acreditar tenha sido um lapso pontual de um Digno Procurador-Adjunto.

Todavia, sendo este Parecer remetido ao Sr. Dr. ..., poderá este Ilustre Advogado utilizá-lo como entender (sempre com o respeito e observância das regras deontológicas), designadamente dando-o a conhecer aos Senhores Magistrados do Ministério Público da Comarca de ... ou ao seu directo superior hierárquico.

 

 

Este é, s.m.o., o nosso entendimento.

 

 

Faro, 2 de Janeiro de 2006

António Cabrita

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