Pareceres do CRFaro

Parecer N.º 10/P/2006 (Conselho Distrital de Faro)

1.- A Exma. Sra. Dra. …, com domicílio profissional em … refere ter-lhe sido solicitado, no decurso de uma inspecção tributária à actividade, a identificação de determinado cliente, do número de processo judicial e respectivo tribunal e a descrição dos serviços prestados. Por posterior contacto telefónico esclareceu ter-lhe sido solicitado, pelos autores daquela inspecção tributária, o acesso ao dossier daquele Cliente ou fotocópias do mesmo.

Pretende aquela Ilustre Advogada saber se deverá responder a tais solicitações porquanto teme, se o fizer, poder estar a violar o sigilo profissional a que está obrigada.

 

 

2.- Desde logo, e no que concerne ao dossier do Cliente que a Sra. Dra. … possui no seu escritório, o mesmo está, indubitavelmente, abrangido pelo segredo profissional. Nesse dossier poderão estar memorandos de consultas, registos de informações orais prestadas pelo cliente, documentos referentes a troca de correspondência confidencial ou respeitantes a negociações malogradas, apontamentos de estratégias de defesa, etc., manifestamente acobertados por segredo profissional e, por tal, de acesso absolutamente reservado e com proibição de revelação, a não ser que esta seja autorizada ou ordenada, nos termos do disposto no art. 87º do Estatuto da Ordem dos Advogados (aprovado pela Lei nº 15/2005 de 26 de Janeiro) ou no art. 135º do Código de Processo Penal.

 

 

3.- No que tange aos outros elementos referidos (identificação de determinado cliente; número de processo judicial e identificação do tribunal; e descrição dos serviços prestados) há o entendimento de que os mesmos se encontram também abrangidos pelo sigilo profissional do advogado.

De facto, extrai-se do art. 89º, nº 3, do Estatuto da Ordem dos Advogados, que a identificação dos clientes não pode ser divulgada, desde logo sem o prévio assentimento deste. Por outro lado, a descrição concreta dos serviços prestados mantém-se na esfera da confidencialidade que pauta a relação advogado/cliente (basta pensar apenas na proibição de revelar as tarefas realizadas pelo advogado no âmbito de estratégia definida para a defesa, por exemplo, de cidadão acusado de homicídio e para aferição e comprovação dos factos que o cliente revelou).

Ora, o pedido de identificação do Cliente (queremos supor que será apenas o seu nome e já não outros elementos, como, p. ex., o seu actual paradeiro, porventura apenas do conhecimento do advogado) e do número do processo e do Tribunal afigura-se-nos despropositado, dado ser sabido dispor a inspecção tributária de meios que lhe propiciam tal conhecimento, sem ser por revelação do advogado. Com efeito, cremos que pode a administração tributária ter acesso, pelos registos dos Tribunais, ao nome do cidadão e ao número do processo judicial pretendido, aí verificando o serviço judicial que a advogado realizou.

 

 

4.- Porém, flui do pedido da Sra. Dra. … ser ela o contribuinte sujeito à inspecção tributária referida. É, pois, admissível, que a revelação daqueles elementos sirva para a administração tributária aferir a veracidade das declarações de impostos apresentadas e/ou fixar outros valores tributáveis. Neste conspecto, por estar em causa a defesa de um direito e interesse legítimo da própria advogada, poderá sempre esta pedir, nos termos do nº 4 do art. 87º do Estatuto da Ordem dos Advogados, a autorização para a revelação daqueles elementos desde que absolutamente necessários para a defesa daqueles seus direito e interesse.

Contudo, por não ter sido esse o objecto do pedido formulado crê-se que o que a questão essencial suscitada é o poder da inspecção tributária de impor ao advogado a revelação daqueles solicitados elementos. Tal como a Ilustre Advogada diz ter sido efectuado, não tem a inspecção tributária poderes para ordenar, sem mais, o levantamento do sigilo profissional do advogado. Poderá fazê-lo através do procedimento consagrado no art. 135º do Código de Processo Penal, por uma das duas vias aí contempladas: ou considerando ilegítima a recusa de revelação e provocando o respectivo incidente; ou, considerando legítima essa recusa, suscitar a prevalência de um outro interesse preponderante.

 

 

Este é, s.m.o., o nosso parecer.

 

 

Faro, 18 de Novembro de 2006

António Cabrita

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