Pareceres do CRLisboa

Consulta 35/2010

 

Consulta n.º 35/2010

Requerente: Dra. A

 

Questão

 

A Senhora Advogada, Dra. A, veio solicitar (cf. entrada com o número de registo .. de 02.07.2010), que o Conselho Distrital de Lisboa emita parecer sobre uma questão em matéria de sigilo profissional.

 

O enquadramento factual, tal como exposto pela Dra. A é, em síntese, o seguinte:

 

a)      Encontra-se a correr termos, na Comarca da Grande Lisboa-Noroeste, um processo cível, em que o mandatário do Autor, indicou como testemunha uma Colega.

b)      A Colega, quando chamada a depor, indicou ao Tribunal que não havia requerido, junto do Conselho Distrital de Lisboa, o levantamento do sigilo profissional, pelo que não deveria depor, por estarem em causa factos de que tomou conhecimento em virtude de, à data dos factos, partilhar o escritório com outra Colega, essa sim mandatária dos Réus.

c)      Perante a tomada de posição da Colega, o Tribunal adiou a audiência de julgamento, até ser emitido parecer da Ordem dos Advogados, quanto ao levantamento ou não do sigilo profissional.

d)      O pedido da Colega indicada como testemunha veio a ser indeferido, tendo tal decisão sido comunicada aos autos.

 

 

 

e)      Sucede, porém, que não obstante o referido indeferimento, o Tribunal veio a convocar a Colega a depor na próxima audiência de julgamento.

 

Considerando a factualidade exposta, vem a Senhora Advogada Consulente solicitar que o Conselho Distrital de Lisboa se pronuncie:

        i.            Quanto à matéria em causa, nomeadamente, por estar em causa uma eventual imposição, de um Juiz, na violação de um dever profissional e deontológico por parte de um Advogado, que certamente irá depor, pois não se recusou a depor, apenas solicitou que se aguardasse o parecer da Ordem dos Advogados.

      ii.            Quanto à questão de saber se, perante a decisão da Ordem dos Advogados, no caso, deste Conselho, em não proceder ao levantamento do sigilo profissional, poderá a mesma ser ignorada por um Juiz, sem que um Tribunal superior se pronuncie.

 

 

Entendimento do Conselho Distrital de Lisboa

 

O Advogado está obrigado a guardar sigilo profissional quanto aos factos cujo conhecimento lhe advenha do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços.

A existência da obrigação de segredo profissional impede o Advogado de revelar os factos e/ou os documentos nos quais esses factos possam estar contidos.

Contudo, tal não significa que o dever de guardar sigilo seja absoluto.

Bem assim, existem casos em que o levantamento da obrigação de guardar sigilo profissional se poderá justificar.

 

Se tal não acontecesse, em situações obviamente excepcionais, elementares princípios de justiça correriam o risco de serem fortemente atingidos.

 

Para o efeito, estabelece a lei dois mecanismos que se diferenciam desde logo a propósito do sujeito que tem legitimidade para impulsionar o levantamento do segredo profissional:

- A dispensa de sigilo profissional, a qual é solicitada pelo Advogado detentor dessa obrigação ao Presidente do Conselho Distrital competente, sendo concedida, caso se verifiquem preenchidos os requisitos exigidos pelo n.º 4 do artigo 87º do Estatuto da Ordem dos Advogados.

- O incidente processual de quebra de sigilo profissional, mecanismo previsto no artigo 135º do Código de Processo Penal e também aplicável ao processo civil, por remissão do artigo 519º do Código de Processo Civil.

E o incidente processual da quebra do sigilo profissional é suscitado junto do tribunal superior àquele onde o incidente se tiver suscitado, sempre pelo juiz do processo, oficiosamente ou ainda que a requerimento de qualquer das partes.

 

Tendo havido um despacho do Presidente do Conselho Distrital (ou do Vogal com competência delegada na matéria) de indeferimento do pedido de levantamento do sigilo profissional, requerido pelo Advogado detentor do sigilo, fica o Advogado requerente impedido de  revelar os factos sigilosos, ainda que contidos em documentos, sob pena de, inclusive, poder incorrer em responsabilidade disciplinar.

 

 

 

A decisão proferida em 1ª instância pelo Presidente do Conselho Distrital (mas também a decisão proferida pelo Senhor Bastonário da Ordem dos Advogados em sede de recurso) envolve discricionaridade técnica, insindicável pelos Tribunais.

 

O Tribunal, ao tomar conhecimento dum despacho de indeferimento de dispensa do sigilo, não pode, sem mais, “obrigar” o Advogado a depor, sob pena de, na prática, acabar por estar a sindicar a decisão proferida pelo órgão a quem a lei atribui competência (exclusiva) nessa matéria.

E, na situação que ora nos é dada a conhecer, pode até colocar-se a questão (já mais de índole processual) de saber se o Tribunal (oficiosamente ou não) pode agora lançar mão do incidente de quebra de sigilo profissional, já que este tem como pressuposto a recusa expressa do Advogado em depor.

 

Face à questão colocada é o que cumpre, por ora, esclarecer, mantendo-nos, contudo, ao dispor para a prestação de qualquer esclarecimento adicional tido por conveniente.

 

Considerando a importância de que a matéria em causa se reveste para o exercício da nossa profissão, solicita-se à Senhora Advogada Consulente que, oportunamente, dê nota a este Conselho do desenvolvimento desta questão.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 5 de Julho de 2010.

 

 

 

A Assessora Jurídica do C.D.L.

 

 

Sandra Barroso

 

 

Concordo e homologo o despacho anterior, nos precisos termos e limites aí fundamentados,

 

 

Lisboa, 5 de Julho de 2010.  

 

O Vice-Presidente do C.D.L.

(por delegação de poderes de 4 de Fevereiro de 2008)

 

 

Jaime Medeiros

 

 

 

 

Sandra Barroso

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