Consulta nº 30/2013
Consulta n.º 30/2013
Requerente: […………………………..]
Assuntos:
Consulta
Por Ofício que deu entrada no Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados no passado dia 25 de Setembro de 2013 com o nº 31661, veio o Consulente solicitar a emissão de Parecer sobre a seguinte questão:
a) Estando em processo de divórcio, a mulher do Consulente ter-lhe-á comunicado que seria representada neste processo pelo Sr. Dr. [……………], Advogado com escritório em Lisboa;
b) Sucede que, segundo refere o Consulente, este Advogado também já terá sido seu mandatário, situação que gera constrangimento uma vez que terá sido quem liderou o processo de constituição de uma sociedade que ambos detêm na quase totalidade, a qual será o ponto de maior discórdia no processo;
c) Nestes termos, pretende o Consulente saber se poderá recusar-se a tratar do seu divórcio com o Dr. [……………….], ou outro Advogado da mesma sociedade
INFORMAÇÃO SINTÉTICA
É sabido que a matéria do conflito de interesses, regida estatutariamente pelo art. 94º do Estatuto da Ordem dos Advogados em vigor (doravante EOA), constitui um corolário do princípio da independência, da confiança e da dignidade da profissão[1]. Nesta medida, a referida norma cumpre uma tripla função:
a) Defender a comunidade em geral, e os clientes de um qualquer outro Advogado em particular, das actuações menos lícitas e/ou danosas por parte de um Colega, conluiando ou não com algum ou alguns dos seus clientes; e/ou
b) Defender o Advogado da possibilidade de sobre ele recair a suspeita de actuar, no exercício da sua profissão, visando qualquer outro interesses que não seja a defesa intransigente dos interesses e direitos dos seus clientes;
c) Defender a própria profissão do anátema que sobre ela recairia na eventualidade de se generalizarem o género de situações descritas nos dois anteriores parágrafos. [2]
Acresce que o Estatuto da Ordem dos Advogados, em matéria de conflito de interesses, não contém uma proibição geral de patrocínio contra quem foi anteriormente seu cliente, mas apenas uma proibição de patrocínio:
a) Contra quem seja por si patrocinado noutra causa pendente.
b) Em causas em que já tenha intervindo ou que sejam conexas com outras em que tenha representado a parte contrária.
c) Em causas que possam colocar em crise o sigilo profissional relativamente aos assuntos de um anterior cliente, ou se do conhecimento destes assuntos resultarem vantagens ilegítimas ou injustificadas para o novo cliente.
No que à presente questão diz respeito, tendo em conta o que é referido pelo requerente, a “chave” para a questão parece-nos estar na interpretação do disposto na 2ª parte do n.º 1 do artigo 94º do EOA, que passamos a transcrever:
“ 1. O Advogado deve recusar o patrocínio de uma questão (...) conexa com outra em que represente, ou tenha representado, a parte (agora) contrária.”
De acordo com aquilo que tem sido jurisprudência da Ordem dos Advogados, por conexão deverá entende-se uma relação evidente entre várias questões[3]. Assim sendo, para que pudéssemos concluir pela existência de um conflito de interesses, teria de ser demonstrado que existe uma relação evidente, ao nível de causa-efeito, entre:
a) o que foi o processo de constituição da sociedade e aquilo que será objecto de negociação de partilhas de um eventual divórcio, e não o mero facto do Advogado ter assistido à constituição da sociedade; ou
b) entre os serviços anteriormente prestados e o que se discutirá entre as Partes.
E tal conclusão claramente não decorre da análise dos elementos que nos foram transmitidos no requerimento apresentado pelo Consulente.
NESTES TERMOS:
E (i) em face dos factos transmitidos pelo consulente no requerimento por si apresentado e tendo estes como limite, bem como (ii) das regras previstas no Estatuto da Ordem dos Advogados, não nos é possível concluir pela existência de qualquer relação de conexão (ou conflito de interesses) entre o que foram os serviços prestados pelo Advogado mencionado no passado ao Consulente e o que agora se discutirá no processo de divórcio que impeçam o Dr. [……………………………..] de assumir o mandato da esposa do Consulente.
Lisboa, 18 de Dezembro de 2013
(O Assessor Jurídico do CDL)
Rui Souto
Concordo e homologo o parecer anterior, nos preciso termos e limites aí fundamentados,
Lisboa, 18 de Dezembro de 2013.
(O Vogal do CDL)
Por delegação de poderes de 29 de Janeiro de 2011
Paulo de Sá e Cunha
.
[1] Cfr Consulta nº 12/08 do Conselho Distrital de Lisboa, na qual foi relator o Dr Jaime Medeiros.
[2] Cfr Consulta nº 6/02, na qual foi relator o Dr João Espanha.
[3] Ver, neste sentido, o Parecer emitido pelo Conselho Geral da Ordem dos Advogados no âmbito do Proc. 11/PP/2010-G
Rui Souto
Topo