Pareceres do CRLisboa

Consulta nº 27/2014

CONSULTA N.º 27/2014

DESPACHO

Através de comunicação recepcionada nos Serviços do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados no dia 23 de Junho do corrente (entrada com o número de registo - ), o Exmo. Senhor Juiz do - Juízo do Tribunal Judicial de - veio solicitar a pronúncia do Conselho Distrital de Lisboa quanto à (i) legitimidade da escusa para depor apresentada pelo Senhor Advogado Dr. A, no âmbito do processo de inquérito n.º - , nos termos e para os efeitos do disposto nos números 1, 2 e 4 do artigo 135º do Código de Processo Penal (doravante CPP).

Em resumo, pode sintetizar-se a questão em análise da seguinte forma:

a) O Senhor Dr. A é Advogado e Agente de Execução.
b) Na qualidade de Agente de Execução, o Senhor Dr. A participou e esteve presente em acto processual de notificação judicial avulsa.
c) No acto processual em causa, a notificanda, denunciada no processo de inquérito, terá proferido palavras ofensivas da honra e consideração da notificante, a ora queixosa.
d) Chamado a depor sobre os factos que presenciou, o Senhor Dr. A escusou-se a depor invocando o segredo profissional a que está vinculado por força dos Estatutos da Ordem dos Advogados e da Câmara dos Solicitadores.

Vejamos então.

Estipula o n.º 1 do artigo 87º do Estatuto da Ordem dos Advogados (aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro) que o Advogado é obrigado a guardar segredo profissional no que respeita a todos os factos cujo conhecimento lhe advenha do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços.

Ou seja, a obrigação de guardar sigilo profissional recai apenas sobre os factos que sejam praticados ou de que o Advogado tome conhecimento quando está a exercer a sua profissão, quando pratica um qualquer acto próprio da profissão.

Fora deste contexto, não existe sigilo profissional a proteger.

O Advogado tem uma dignidade e um estatuo próprios, nem lhe sendo lícito depor livremente sobre factos abrangidos pela esfera de protecção do sigilo profissional.

A obrigação de sigilo profissional deve ser mantida enquanto, pelos meios legalmente previstos, não cessar.

E um desses mecanismos é o incidente processual de quebra de sigilo profissional, previsto no artigo 135º do CPP.

Nos termos da mencionada norma legal, deduzida a escusa perante o Juiz ou perante a autoridade judiciária que presidir ao acto, poderão suscitar-se dúvidas, que deverão ser fundadas, acerca da legitimidade da invocação do sigilo profissional e da escusa em depor que o mesmo fundamenta – cfr. n.º 2 do artigo 135º do CPP.

Quando tal acontecer, como caso presente, o Juiz decide sobre a legitimidade da escusa depois de ouvida a Ordem dos Advogados – cfr. n.º 4 do artigo 135º do CPP.

Nesta sede, o que terá de se aferir é se o Advogado está, ou não, a invocar criteriosa e correctamente que aquilo sobre que se pretende o seu depoimento é matéria sigilosa que lhe imponha o dever de silêncio. Se assim não for, a escusa para depor será necessariamente ilegítima.

No caso vertente, o depoimento a prestar incidirá unicamente sobre factos que o Senhor Dr. A presenciou na qualidade de Agente de Execução, no âmbito de uma notificação judicial avulsa à qual presidiu.

Assim sendo, forçoso é concluir que não estão em causa factos conhecidos no exercício da Advocacia, não sendo, portanto, legítima a escusa apresentada ao abrigo do Estatuto da Ordem dos Advogados.

Considerando a factualidade que nos foi dada a conhecer, é evidente que, no caso sub judice, a entidade competente para apreciar e decidir da (i) legitimidade da escusa apresentada pelo Senhor Dr. A é a Câmara dos Solicitadores.

Notifique-se.

Lisboa, 9 de Outubro de 2014.

O Presidente do Conselho Distrital de Lisboa
António Jaime Martins

A Jaime Martins

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