Pareceres do CRLisboa

Consulta 46/2019

Questão

 

Mediante requerimento rececionado nos Serviços do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados em 9 de outubro de 2019 (entrada com o número de registo), a Exma. Senhora Dra., Ilustre Advogada, veio solicitar a emissão de parecer, nos termos e com o enquadramento factual que passamos a circunstanciar. 

 

A Senhora Advogada Consulente é mandatária de em dois processos judiciais, a saber: o processo n.º, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Central Cível de - Juiz, em que é Autora a sociedade comercial com a firma, e é Réu; e o processo de inventário n.º, que corre termos no Cartório Notarial da Licenciada Dra., em, para partilha dos bens que integram a herança indivisa por morte de.

 

A sociedade, está representada pelo Ilustre Advogado, Exmo. Senhor Dr..

 

No processo de inventário, o Senhor Dr. representa o herdeiro de, , que também é o único gerente da sociedade, e detém individualmente, nesta sociedade, duas quotas, uma no valor nominal de € 100,00 (cem euros), e outra, no valor nominal de € 66.200,08 (sessenta e seis mil e duzentos euros e oito cêntimos). Indiretamente, detém três participações sociais através da sociedade anónima, da qual é administrador único e acionista maioritário, segundo declarações da Senhora Advogada Consulente, uma vez que relativamente a esta sociedade não foi junta certidão comercial.

 

No âmbito do processo n.º, e após a morte do Réu, , o Senhor Advogado Dr., em representação da sua cliente, deduziu incidente de habilitação de herdeiros, o que fez, também, contra o herdeiro seu cliente no processo de inventário, .

 

O herdeiro não apresentou contestação ao incidente de habilitação de herdeiros deduzido.

 

Entretanto, e no âmbito do processo de inventário, o mesmo Ilustre Advogado, agora em representação da pessoa singular, apresentou reclamação à relação de bens apresentada pelo cabeça-de-casal, sendo que sob a alínea IV) a reclamação apresentada tem o seguinte título: “DO CRÉDITO SOBRE A SOCIEDADE, A TÍTULO DE SUPRIMENTO – VERBA Nº 6”.

 

O objeto do parecer solicitado, tal qual se encontra recortado pela Senhora Advogada Consulente,  reconduz-se, pois, a saber se o Senhor Advogado Dr. pode exercer o mandato, por um lado, no âmbito do processo n.º, no qual, após a procedência da habilitação de herdeiros irá estar a patrocinar, simultaneamente, a Autora e o Réu e, por outro, se no âmbito do processo de inventário pode patrocinar um dos interessados e, em seu nome pessoal, apresentar reclamação de bens, através da qual invoca a inexistência de um crédito sobre a herança, o qual corresponde a um alegado débito de uma sociedade da qual ele – – é simultaneamente gerente e sócio maioritário.

 

Despacho

 

Nos termos do disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 54.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado em anexo à Lei n.º 145/2015, de 9 de setembro, compete ao Conselho Regional de Lisboa pronunciar-se sobre as “questões de carácter profissional”.

 

Tem-se entendido que as “questões de carácter profissional” são as inerentemente estatuárias, isto é, as que relevam dos princípios, regras, usos e praxes que comandam ou orientam o exercício da advocacia, maxime as que decorrem das normas do Estatuto e do universo de normas emergentes do poder regulamentar próprio reconhecido por lei aos órgãos da Ordem dos Advogados.

 

Contudo, a pronúncia do Conselho Regional de Lisboa sobre as questões de ética ou deontologia profissional cinge-se, estritamente, às questões colocadas em abstrato e que não envolvam qualquer juízo valorativo sobre situações concretas.

 

Não compete, assim, ao Conselho Regional de Lisboa apreciar quaisquer concretas condutas dos Senhores Advogados depois de as mesmas terem tido lugar.

 

Em suma:

 

O princípio da legalidade a que o Conselho Regional está vinculado na sua atuação impede “a emissão de parecer sobre a eventual existência de conflito de interesses ou outros factos de relevância deontológica, (…), do M.I. Colega Sr. Dr., considerando os patrocínios por este assumidos e supra descritos (…)”, sob pena de, se tal se fizesse, se estar a exorbitar o âmbito daquela que é a competência material deste Conselho.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 16 de abril de 2020.

 

O Presidente do Conselho Regional de Lisboa

João Massano

João Massano

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