Pareceres do CRCoimbra

Parecer Nº 12/PP/2021-C

Parecer n.º 12/PP/2021-C

Assunto: Participação em lista partidária candidata a órgão executivo autárquico.

 

Através de email dirigido ao Conselho Regional de Coimbra, datado de 12 do corrente mês de Julho, veio a Sra. Advogada Dra. ALC..., titular da cédula profissional n.º …C, solicitar parecer quanto à possibilidade de participar como membro de uma lista partidária.

 

Solicitou-se à Sra. Advogada requerente esclarecimento sobre se a lista que pretende integrar é candidata a algum órgão autárquico e, em caso afirmativo, qual é o órgão e qual o cargo que pode estar em causa.

 

Em resposta ao pedido de esclarecimento, veio a Sra. Advogada requerente informar que a lista partidária que pretende integrar é candidata à Câmara Municipal de … e que, neste momento, o cargo que poderá ocupar ainda não está definido, havendo, contudo, a possibilidade de vir a ocupar o cargo de vereadora.

 

Atento o disposto na alínea f) do nº 1 do artº 54º do Estatuto da Ordem dos Advogados (doravante EOA) e competindo ao Conselho Regional, no âmbito da sua competência territorial, pronunciar-se sobre questões de carácter profissional – que são as intrinsecamente estatutárias, ou seja, as que decorrem dos princípios, regras e praxes que comandam e orientam o exercício da Advocacia, nomeadamente as que relevam das normas do Estatuto da Ordem dos Advogados e do universo de normas emergentes do poder regulamentar próprio reconhecido por lei e pelos órgãos da Ordem – cumpre emitir o solicitado parecer respondendo à questão colocada.

 

O nosso parecer é balizado pela questão concreta que nos é colocada – saber se um advogado pode integrar uma lista candidata às eleições autárquicas, a uma Câmara Municipal, podendo no limite ser eleito vereador.

 

A questão colocada pela Sra. Advogada comporta, para além da concretamente enunciada pela Requerente, uma segunda que, sucessivamente, pode vir a ser suscitada, importando, assim: i) saber se o advogado pode integrar uma lista partidária candidata às eleições autárquicas; ii) saber se o exercício do cargo de vereador é compatível com o exercício da advocacia.

 

No que respeita a incompatibilidades, o Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA) estabelece no artigo 81º, nº2, o princípio geral de que o exercício da advocacia é inconciliável com qualquer cargo, função ou atividade que possa afetar a isenção, a independência e a dignidade da profissão.

 

Como refere Carlos Mateus, “As incompatibilidade e impedimentos, estão em estreita conexão com os princípios da integridade (artº 88 do EOA) e da Independência (artº 89º do EOA) e visam evitar situações que possam traduzir-se em falta de independência do Advogado; perda de dignidade e de isenção no exercício da profissão; a promiscuidade do Advogado; a vantagem de um advogado relativamente aos demais Colegas; e angariação ilícita de clientela por causa de outro cargo, função ou atividade que o Advogado venha a exercer.“

 

O artigo 82º do EOA enuncia, em abstrato e de forma exemplificativa, uma série de impedimentos absolutos, ligados ao exercício de cargos, funções, atividades e profissões. Enquanto estes durarem, o exercício da advocacia é incompatível para todas as pessoas em relação às quais se verifique a situação, por se entender que podem afetar a isenção, a independência e a dignidade da profissão.

 

As incompatibilidades ou impedimentos absolutos proíbem o Advogado de exercer a profissão e determinam a impossibilidade originária ou superveniente da inscrição – art. 188º, nº 1, al. d e nº 4, art. 91º, al. d) do EOA.

 

Os impedimentos diminuem amplitude do exercício da advocacia e constituem incompatibilidades relativas do mandato forense e da consulta jurídica – art. 83º, nº 1 do EOA.

Se a incompatibilidade ou impedimento absoluto preexistir à data da inscrição, esta deve ser recusada – artº 188º, nº 1, al. d) do EOA.

 

Se a incompatibilidade for superveniente, cabe ao Advogado e Advogado Estagiário suspender imediatamente o exercício da profissão e requerer, no prazo máximo de 30 dias, a suspensão da inscrição na Ordem dos Advogados. 

 

Ora, do elenco das incompatibilidades descritas no artigo 82º do EOA não se vislumbra qualquer indomabilidade entre o exercício da advocacia e o facto de o advogado integrar uma lista candidata às eleições autárquicas. Aliás, nem se vislumbra como tal seria possível face ao disposto nos artigos 48º e ss. da Constituição da República que estabelecem os direitos, liberdades e garantias de participação politica.

 

Por isso, a resposta a esta primeira questão concreta é fácil e óbvia: a Sra. Advogada requerente pode integrar a lista candidata às eleições daquele órgão autárquico executivo.

 

No entanto, e porque, não obstante o pedido de parecer não a inclua, uma segunda questão subsequente à precedentemente tratada e com ela conexa, pode vir a colocar-se em momento posterior, não podemos deixar de, ao abrigo do princípio da economia de processual, ir um pouco mais além e sublinhar a imperiosa necessidade de reflexão que se impõe ao advogado, em momento prévio à decisão de integrar uma lista partidária para uma candidatura às eleições autárquicas, desta feita quer sobre as consequências da eleição, quer sobre as que podem advir do exercício de funções públicas para que venha a ser eleito.

  

E se é certo que à dilucidação de tal questão, facilmente se chegará analisando e estudando os citados artigos 81º, 82º e 83º do EOA, não será despiciendo - até porque quod abundat non nocet -  lançar mão dos diversos pareceres da Ordem dos Advogados publicados no sítio da internet www.oa.pt, dos quais se mencionam, a título de mero exemplo o Parecer nº 41/PP/2017-P, do Conselho Regional do Porto e o parecer nº 33/PP/2017-C, do Conselho Regional de Coimbra.

 

Em conclusão:

  1. O advogado não está impedido de integrar uma lista partidária às eleições autárquicas.
  2. O exercício do cargo de vereador a tempo inteiro ou em regime de meio tempo das câmaras municipais é incompatível com o exercício da advocacia.
  3. O exercício do cargo de vereador sem tempo atribuído constitui impedimento do exercício da advocacia, em qualquer foro, de patrocínio direto ou por intermédio de sociedade de que o advogado seja sócio, em ações contra a respetiva autarquia, bem como de intervir em qualquer atividade do executivo a que pertença e que seja relativa a assuntos em que tenha interesse profissional, diretamente ou por intermédio de sociedade de advogados a que pertença.

 

É este, salvo melhor opinião, o meu parecer.

 

António Sá Gonçalves

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